Trump teve aulas para ir à Ásia, mas será que aprendeu alguma coisa?

Quando são mal executadas, as viagens dos Presidentes ao estrangeiro podem ser fiascos irreparáveis na segurança nacional, disse um analista.

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Manifestação contra a visita de Trump junto à embaixada de americana em Tóquio Toru Hanai/REUTERS

É o Presidente que diz que vai lançar “fogo e fúria como o mundo nunca viu” contra a Coreia do Norte, que chama “rocket man” a Kim Jong-un, que está convencido que a ideia do aquecimento global é uma conspiração da China. Começa este domingo uma visita a cinco países da Ásia (Japão, Coreia do Sul, China, Vietname e Filipinas) e os assessores, os conselheiros e toda a West Wing está em pânico — a viagem é longa, a um dos mais complexos lugares do planeta, e o potencial para Donald Trump quebrar o protocolo e embaraçar a América, cometer uma gaffe que irrite um aliado ou dizer uma frase que abra uma crise grave são enormes.

Nos últimos dias, a imprensa americana deu conta de uma Casa Branca muito nervosa. “Equipa de Trump com medo que Presidente diga alguma coisa estúpida e cause uma crise na visita à Ásia” (Newsweek), “Conselheiros de Trump tentam que Presidente se concentre na visita à Ásia” (Politico), “A visita de Trump à Ásia pode ser um desastre” (Esquire).

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— Newsweek (@Newsweek) November 4, 2017

"> Trump’s Team is terrified the president will say something dumb and cause a crisis on Asia trip

A Ásia que Trump visita é, hoje, a mais dinâmica e vibrante região do mundo, mas em simultâneo é a mais perigosa. Trump leva todos os temas na bagagem, o comércio mundial, a segurança nacional, a crise provocada pelo programa de mísseis e nuclear de Pyongyang. Os analistas gostavam que estes 12 dias na Ásia clarificassem a estratégia da Administração Trump para a região. Como quer Trump relacionar-se com a China de Xi Jinping? Vai ser o Presidente duro que fez acusações e escolheu a China como inimigo da América antes de ser eleito, ou vai aproveitar a passagem do primeiro aniversário da sua eleição em Pequim para elogiar o Presidente chinês e voltar a dar os parabéns a Xi pela recente “reeleição”? 

A estratégia para a China não está clara, na Casa Branca há pensamentos distintos sobre o caminho a seguir. “É o meu maior pesadelo, se ele felicita Xi pela reeleição”, disse Derek Scissors, especialista em China do American Enterprise Institute. Outros desejam apenas que Trump esteja à altura.

“As viagens presidenciais podem ser fortes instrumentos políticos quando são feitas correctamente. Mas quando são mal executadas, viagens ao estrangeiro podem ser fiascos irreparáveis na segurança nacional”, disse uma analista da CNN, concluindo que Trump tem nesta longa viagem a grande oportunidade de se “tornar um líder”.

A aposta é muito alta. Por isso, a equipa da Casa Branca traçou um plano de estudos para Donald Trump. O Presidente teve aulas com o conselheiro de segurança H.R. McMasters, o secretário de Estado Rex Tillerson, o secretário da Defesa James Mattis, especialistas em comércio... Soube o Politico que a equipa da Casa Branca que traçou o plano fez questão de dividir as matérias em muitos pequenos briefings, em vez de poucos e longos, para não cansar Trump nem alienar a sua atenção.

O Presidente teve aulas de conteúdo e de forma — ensinaram-lhe o que dizer em cada sítio e em cada ocasião: o que dizer na Coreia do Sul, o país que sofrerá se acontecer uma guerra peninsular; o que não dizer no Japão, se lhe perguntarem alguma coisa sobre as mulheres de conforto, um tema de conflito entre Tóquio e Seul; o que dizer nas Filipinas para manter a aliança estratégica entre Manila e Washington, mas sem se associar a um Presidente tão polémico nos seus métodos como Rodrigo Duterte; o que dizer sobre comércio e sobre o compromisso dos EUA para com a segurança dos aliados regionais.

“Tentámos fazer isto em bocadinhos para ser mais fácil para ele”, disse uma fonte da Casa Branca ao Politico.

Se aprendeu? Tem 12 dias para mostrar se vai apaziguar ou perturbar a região — para clarificar o que quer ou para continuar a dar pistas erráticas, para mostrar que sabe lidar com crises ou responder intempestivamente a elas; os analistas não põem de lado a possibilidade de Kim aproveitar a visita para provocar e há tantas semanas que não faz um ensaio...

O problema, disse outra fonte, é que por mais preparação que exista “nunca se sabe o que ele vai dizer”, disse outra fonte, que aos medos todos acrescentou o receio pelo efeito que o jet-lag pode ter no estado de espírito de Donald Trump.

Ainda não tinha sequer partido e já Trump criava uma crise de nervos na comitiva. Numa entrevista de última hora à Fox News antes de partir, e questionado sobre se o Japão devia estar preocupado com a Coreia do Norte, o Presidente dos EUA disse: “Claro que devem estar preocupados. Eles estão mesmo perto da Coreia do Norte”. A declaração provocou mal-estar no Japão (que sentiu mais uma vez o aliado a abandoná-lo à sua sorte) e frustração na Coreia do Sul, que sentiu que Trump nem se lembra dela.

Outra citação sobre esta viagem, do analista político americano Charles Pierce: “Que Deus nos ajude”.

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