EasyJet ameaça abandonar linha da Madeira

Companhia low-cost diz que cabe ao Estado, e não aos grupos de aviação, esbater os efeitos da insularidade. Em causa está revisão do Subsídio Social de Mobilidade (SSM) que vigora desde 2015

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Renato Cruz Santos

A easyJet ameaça abandonar as linhas Funchal-Lisboa e Funchal-Porto caso a revisão do Subsídio Social de Mobilidade (SSM) permita que os passageiros com residência na Madeira paguem apenas a tarifa de residente (86 euros) ou de estudante (65), ficando o remanescente a ser depois pago pelo Estado directamente às companhias.

Defendendo que o SSM é um “elemento vital” para “esbater” os efeitos da insularidade das regiões autónomas, o director da easyJet em Portugal, José Lopes, ressalva ao PÚBLICO que esse papel não pode ser delegado nas companhias aéreas.

“Esta é uma função do Estado português e, em nenhum caso, deverão as companhias de aviação substituir o Estado português nesta relação com o contribuinte residente na região autónoma da Madeira”, disse o responsável pela empresa, rejeitando “completamente” qualquer tipo de “modelo que busque esta inversão de papéis”.

No modelo actual, que entrou em vigor a 1 de Setembro de 2015, os residentes na Madeira, tal como acontece nos Açores, pagam o valor integral dos bilhetes, sendo reembolsados, depois de realizada a viagem, do valor que ultrapasse a tarifa de residente ou estudante. Isto para um tecto máximo de 400 euros por passagem de ida e volta. Quando o preço da passagem é superior, os passageiros assumem essa diferença.

O SSM, que veio substituir o anterior modelo em que independentemente do valor das passagens os residentes na Madeira recebiam 30 euros por trajecto, nunca foi consensual no arquipélago.

Se, em teoria, residentes e estudantes iriam beneficiar e pagar menos pelas viagens, na prática assistiu-se a um crescimento no valor médio das passagens, que em alguns períodos de maior procura – Março/Abril, Agosto e Dezembro – ultrapassava largamente o tecto dos 400 euros.

Logo nos primeiros dias da entrada em vigor do novo modelo de mobilidade aérea, o PÚBLICO deu conta da subida média dos preços. Não só para bilhetes comprados no Funchal, como também para partidas de Lisboa e Porto, pois o subsídio de mobilidade acabou também por influenciar os preços das viagens a partir do continente para a Madeira.

O governo madeirense defendeu, numa primeira fase, o modelo, argumentando que era necessário planear atempadamente a viagem, para assim conseguir preços mais vantajosos.

Mas para os estudantes universitários e residentes que por razões não planeadas tinham que viajar para o continente, uma ida a Lisboa podia ser proibitiva, dado os valores das passagens, que tinham que ser integralmente pagos. Adiantar montantes na ordem dos 400, 500 ou mesmo 600 euros não estava ao alcance de todas as famílias, daí que o executivo regional, do social-democrata Miguel Albuquerque, venha insistindo na necessidade de rever o modelo.

Este processo está a decorrer na Assembleia da República, num grupo de trabalho criado pela Comissão Parlamentar de Economia, e a TAP, de acordo com uma notícia avançada esta semana pelo JM-Madeira, terá mostrado abertura para que os passageiros em vez de pagarem a totalidade do valor dos bilhetes, desembolsem apenas o valor da tarifa correspondente, cabendo ao Estado assumir o valor remanescente directamente à companhia.

Uma abertura que a easyJet rejeita por uma “questão de transparência” do sistema. “Este regresso ao passado voltaria a criar situações de possível subsidiação estatal (escondida a companhias de aviação) em virtude da impossibilidade de existir um controlo efectivo do sistema de inventário das companhias de aviação por parte de terceiros”, justifica José Lopes, acrescentando que o modelo não é compatível com o sistema de gestão da empresa.

“Inviabilizaria a nossa operação nas rotas afectadas – Lisboa-Funchal e Porto-Funchal –, com danos enormes para as pessoas e para a economia da região”, avisa o director da low-cost em Portugal, vincando que não aceita um modelo que permita à concorrência fazer descontos “à cabeça”, mas está disposta a colaborar na melhoria do modelo. 

Na Madeira, o executivo garante que “não quer fechar as portas” a nenhuma companhia e mostra-se disponível para iniciar um “dialogo institucional” com a easyJet. “Temos a aspiração de que os madeirenses paguem o menor valor possível, e se for o valor da tarifa melhor”, admitiu ao PÚBLICO o vice-presidente do governo madeirense, Pedro Calado, dizendo que a abertura da TAP vai ao encontro dos interesses dos madeirenses.

Mas, ressalva, o Funchal quer continuar a contar com a easyJet na linha. “Não vamos romper nenhum diálogo, principalmente com uma companhia como a easyJet, que tem sido muito importante para a Madeira”, garantiu Pedro Calado.

TAP e easyJet são as duas companhias que asseguram voos regulares entre o arquipélago e o continente. Em 2016, o SSM para a Madeira custou ao Estado 24,51 milhões de euros.

Nos Açores, onde vigora um modelo semelhante, assegurado por três companhias (TAP, Ryanair e Sata), foram gastos 21,56 milhões de euros.

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