Novos alvos de Mueller podem ser figuras mais próximas de Trump

Presidente rebaixa Papadopoulos para desvalorizar investigação, mas o cerco aperta-se.

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LUSA/MICHAEL REYNOLDS

As ondas de choque provocadas pelas primeiras acusações do procurador especial, Robert Mueller, no âmbito das investigações à interferência da Rússia nas eleições presidenciais dos Estados Unidos ainda se fazem sentir e Washington já se prepara para o próximo abalo do terramoto político que está a ameaçar as fundações da Administração Trump. Segundo a imprensa americana, existem no tribunal federal de Washington mais quatro acusações, seladas e em segredo de Justiça, com números seguidos aos processo de Paul Manafort, Rick Gates e George Papadopoulos.

Apesar dos esforços da Casa Branca para desviar as atenções e demarcar o Presidente das acções dos três homens envolvidos na sua campanha e agora suspeitos de crimes de conspiração, lavagem de dinheiro e declarações falsas, o cerco dos investigadores parece estar a apertar-se à volta do círculo mais próximo de Donald Trump. Não foram, ainda, apresentadas quaisquer provas de concluio, mas as alegadas ligações da sua campanha à Rússia já não são só um escândalo político, são também um escândalo legal e jurídico.

Nos corredores, especula-se e fazem-se apostas sobre quem poderão ser os próximos alvos de Mueller. O antigo Conselheiro Nacional de Segurança, Michael Flynn, que mentiu sobre os seus contactos com agentes russos? O filho mais velho e o genro do Presidente, Donald Trump Jr. e Jared Kushner, que esconderam uma reunião na Trump Tower com uma advogada próxima de Vladimir Putin? O amigo e conselheiro político Roger Stone, um milionário excêntrico cujos contactos com um pirata informático russo estão debaixo de intenso escrutínio?

Procurador intocável

O Presidente abriria uma gravíssima crise constitucional se decidisse impulsivamente despedir o procurador especial ou pôr fim à investigação em curso – como já sugeriu que poderia fazer. “O Presidente não me deu qualquer indicação, nem a mim nem a ninguém com quem estou a trabalhar, de que tenciona demitir Robert Mueller. Também não tivemos nenhuma conversa sobre perdões presidenciais, que não estão em cima da mesa”, garantiu o advogado pessoal de Trump, Jay Sekulow, à ABC.

No Congresso, a furiosa bancada democrata já prometeu “agir de forma rápida, decidida e inequívoca” se o Presidente assinar alguma medida que ponha em causa Robert Mueller e a sua equipa de dezenas de procuradores experientes, ou a aplicação da justiça (se Trump assinar perdões “preventivos” para salvar os seus familiares e colaboradores mais próximos das acusações).

Pelo seu lado, a bancada republicana parece ter-se resignado à ideia de que a ambiciosa reforma fiscal prometida por Donald Trump até ao fim do ano poderá ficar pelo caminho, vítima dos últimos desenvolvimentos políticos. Os conservadores arriscam-se a chegar às cruciais eleições intercalares de 2018 sem uma única vitória legislativa, e a ter de defender uma Administração assombrada por suspeitas de ilegalidades.

Na sua estratégia agressiva para desacreditar a investigação – que o Presidente continua a designar como uma “caça às bruxas”—, a Casa Branca e os aliados de Trump esforçam-se por distinguir entre o trabalho de lobista de Paul Manafort e o seu “papel limitado, durante um curto período de tempo” como director da campanha presidencial republicana. E também por descredibilizar o depoimento do antigo conselheiro da campanha para as matérias de política externa e relações internacionais, George Papadopoulos, que foi detido e Julho e está agora a colaborar com a equipa de Mueller, fornecendo informação sobre os seus contactos com agentes da Rússia enquanto se encontrava a trabalhar para a eleição de Donald Trump.

"Grande mentiroso"

Aproveitando o facto de Papadopoulos ser um grande desconhecido para o grande público, o Presidente foi para o Twitter esclarecer que “poucas pessoas [da campanha] conheciam o voluntário sem grande importância chamado George, que já está mais do que demonstrado é um grande mentiroso”. Neste ataque, Trump esqueceu os anteriores elogios que fez a Papadopoulos - “um tipo excelente” - e o facto de este ter participado em várias reuniões do seu grupo de conselheiros, incluindo uma que manteve com os editorialistas do The Washington Post.

Nos seus novos depoimentos, Papadopoulos explicou em detalhe como foi contactado por intermediários do Kremlin com promessas de informação prejudicial para a candidatura de Hillary Clinton, e como discutiu com vários membros da campanha de Trump (incluindo um “conselheiro político”, um “supervisor” e um “alto dirigente”) o que fazer para perceber o que valiam os “milhares de emails” que os russos diziam possuir – pirateados dos servidores da campanha democrata e mais tarde divulgados pela Wikileaks.

Como distinguiram vários especialistas jurídicos, a acusação contra Papadopoulos não tem directamente a ver com os seus contactos com agentes russos nem com o conteúdo das mensagens que reencaminhou para outros membros da campanha: o antigo conselheiro foi acusado do crime de falsas declarações, por ter inicialmente mentido aos investigadores (um crime punido com prisão até três anos e multas).

Aliás, o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, veio assinalar que “até agora a Rússia não tem nada a ver com as acusações” e não está implicada nos processos que envolvem os antigos membros da campanha presidencial de Trump. “Continuamos a observar o caso com interesse, e esperamos que a histeria não seja alimentada”, acrescentou.

Colaborar com a Justiça

Ao avançar com as acusações por declarações falsas, Robert Mueller está a enviar uma mensagem poderosa a todos os potenciais envolvidos no inquérito: não é só o que fizeram ou deixaram de fazer que interessa, mas também o que disseram ou deixaram de dizer quando confrontados pelos investigadores. Todas as declarações, e contradições, serão avaliadas pelos procuradores, e poderão dar origem a acusações mesmo que os crimes detectados não tenham especificamente a ver com a suspeita de conluio com os agentes russos para manipular a eleição e promover a vitória de Donald Trump.

Tendo em conta a postura de Mueller, e o mandato abrangente que lhe foi concedido em Maio pelo Departamento de Justiça, os outros dois suspeitos já acusados, Paul Manafort e Rick Gates estarão debaixo de intensa pressão para colaborar com as investigações.

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