Perspetivando positivamente o sucesso

A partir do próximo ano letivo, em pelo menos uma escola púbica haverá períodos semestrais para promover o sucesso escolar.

O diretor da Escola Secundária Eça de Queirós, Póvoa de Varzim, e presidente do Conselho das Escolas, José Eduardo Lemos, ilustre colega, reportando-se ao artigo de minha autoria, inserido no JN de 10 de agosto (no qual defendo a semestralidade dos períodos letivos), serviu-se das páginas deste jornal (edição de 29 de agosto) para elaborar crítica, legitimidade incontestada. Contudo, se o propósito fosse somente esse, eu não sentiria necessidade de esclarecer o conteúdo das minhas declarações, sob pena de me serem imputadas convicções das quais não me assumo autor.

Pese embora assine os escritos como professor/diretor (reconhecendo o exercício do cargo intrinsecamente dependente do ser professor, mui nobre profissão), o autor do artigo apenas se refere à minha pessoa na qualidade de “presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas”, de que igualmente muito me orgulho, repetindo o meu nome seis vezes ao longo do texto.

Tendo começado por me acusar de só ver vantagens na organização do ano letivo em semestres, passou, de imediato, à apresentação de uma “desvantagem óbvia” (para ele), que, embora não concordando, cumpre-me respeitar, e talvez por esquecimento foi incapaz de apresentar uma única vantagem para a trimestralidade dos períodos letivos. A esse propósito, o título do artigo (“Para pior, já basta assim”) permitia então antever o posicionamento face à presente matéria...

Refere, discordando, “que se queira associar a motivação e a avaliação dos alunos à duração de cada período letivo”, tentando argumentar sobre o ponto “1. Períodos letivos equivalentes”. Porventura por negligência tenha elaborado tal ilação, pecando, todavia, por ausência de rigor, pois defendo precisamente dois períodos semestrais (com igual número de dias úteis de atividade letiva), no sentido da manutenção da motivação para o estudo até ao final do ano letivo (independentemente do nível obtido no 1.º semestre).

Mais à frente, tenta explicar que “defender que as taxas de sucesso escolar aumentam se diminuirmos os momentos de avaliação [...] leva-nos à conclusão óbvia [para ele] de que se existisse apenas um momento de avaliação, as taxas de sucesso seriam ainda mais elevadas”. Finaliza este ponto do seguinte modo: “Nesta linha de argumentação, estranha-se que não se defenda a eliminação de todos os momentos de avaliação, para que o sucesso seja de 100%.” Eis-nos perante uma interpretação abusiva. Chegado a este estilo de arguir, percebe-se ter existido leitura apressada e enviesada da matéria criticada, quando o que está em causa não incide meramente no número dos momentos de avaliação mas, sobretudo, na duração dos períodos avaliativos. Se adotasse a mesma forma de contraditar, seria legítimo da minha parte dizer que quem me critica defende um número qualquer (superior a três) de períodos.

“Também não colhe” (para ele) o argumento da redução do trabalho burocrático, pois, escreve, “a avaliação dos alunos não é um trabalho burocrático, antes pelo contrário [!], é um trabalho iminentemente pedagógico...”, fazendo crer que o que é pedagógico não é burocrático. Na minha opinião, um termo não invalida ou coexiste independente do outro, uma vez que, e saliento, as reuniões de avaliação dos alunos, momentos formais por excelência, acarretam uma tremenda carga de trabalho burocrático para os professores, não só durante a sua realização, mas de igual modo antes e depois.

Acusa-me de atirar “ao lado do alvo” (qual alvo?) por considerar que a diminuição do número de retenções reduz a despesa de Educação e provoca danos aos alunos, apelando, então, de seguida, para que “haja coragem — não se permita reprovar alunos”. O sucesso escolar dos alunos é benquisto por todos e, na minha opinião, aumentaria, como defendo, com a modalidade de períodos semestrais, sabendo que ninguém beneficia com o insucesso; as reprovações não são indiferentes para os nossos alunos e, quantas vezes, conduzem ao início de uma caminhada de insucesso e desilusão. Finalmente, parece-me não ser de desprezar o facto de cada retenção custar ao erário público 4500 euros, sendo sensato refletir sobre esse investimento na Educação.

O resto do artigo resume-se a opiniões do seu autor, que respeito, embora não reúnam a minha concordância. Naturalmente, encontrar-me-ei sempre disponível para argumentar com lealdade e honestidade, sem me arrogar dono da verdade.

Os Projetos-Piloto de Inovação Pedagógica, legalmente plasmados no Despacho n.º 3721/2017, de 7 de abril, atribuíram a seis escolas públicas efetiva autonomia em diversas áreas. Após discussão nas respetivas estruturas internas, pelo menos numa delas, a partir do próximo ano letivo, haverá períodos semestrais, assumindo-os o director, em carta dirigida aos pais e encarregados de educação, como “uma das principais estratégias de promoção do sucesso escolar”. Outras escolas solicitaram autorização para a mesma possibilidade, consubstanciando o desejo de conquistar efetiva autonomia, há muito reclamada.

Eis exemplos excelentes da evolução das escolas, numa clara tendência para contradizer a perniciosa frase, que contesto, porém tantas vezes escutada: “Temos escolas do século XIX, com professores do século XX, para alunos do século XXI”, recusando (firmemente) ver acrescentada a esta “com organização do século XVIII”.

Termino como o fiz no escrito alvo de crítica: “Há escolas dispostas a experimentar aquilo que se antevê de benéfico. Haja vontade política para dar efetiva autonomia a quem a quer assumir, pelo menos a título probatório.”

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

 

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