Empresas portuguesas têm vindo a poupar mais. Será para investir?

Banco de Portugal detecta acumulação de recursos por parte das empresas num cenário de necessidade de redução do endividamento e de diminuição do papel da intermediação financeira.

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Marco Duarte

Em vez de distribuírem tantos dividendos pelos seus sócios e accionistas, as empresas portuguesas começaram a optar nos últimos anos por reter uma maior parte dos seus lucros, uma tendência que pode vir a ter como resultado, acredita o Banco de Portugal, uma evolução mais positiva do investimento num futuro próximo.

Num estudo publicado esta quarta-feira em conjunto com o seu boletim económico de Verão, o banco central analisa as causas e as consequências de um fenómeno que é classificado como “relativamente surpreendente” e que se tem vindo a acentuar nos últimos anos em Portugal, acompanhando uma tendência mais antiga noutras grandes economias do mundo: se antes aquilo que era visto como normal era as famílias pouparem mais do que investiam, criando-se assim os recursos para financiar as empresas que investiam mais do que poupavam, agora aquilo que se tem visto é a poupança das famílias a diminuir e a empresas a tornarem-se um sector financiador na economia.

Esta maior poupança das empresas é o resultado da decisão de reter dentro das próprias empresas uma maior parte dos lucros, em vez de distribuí-los sob a forma de dividendos aos sócios e accionistas.

O estudo realizado pelo Banco de Portugal tenta encontrar pistas que expliquem este fenómeno. Em primeiro lugar, é possível concluir que, embora a poupança esteja concentrada num pequeno número de empresas de grande dimensão e mais antigas, a taxa de poupança é semelhante nas empresas de diversas dimensões e até é um pouco mais elevada nas mais jovens.

Depois, é possível verificar que, ao contrário do que acontecia no passado, as empresas mais endividadas dão agora um contributo decisivo para a poupança, o que significa que esta retenção dos lucros faz parte do processo de desalavancagem pelo qual as empresas portuguesas estão a passar.

Com um acesso mais difícil e mais caro ao crédito bancário (ou ao financiamento nos mercados) e com elevados níveis de endividamento, as empresas optam por garantir por si próprias os fundos de que podem necessitar para investir. Este é mais um sinal da redução do papel que é desempenhado pela desintermediação financeira, algo que aconteceu em décadas passadas em países como os Estados Unidos, por exemplo.

O estudo do banco de Portugal assinala também que existe uma relação entre o nível de poupança das empresas e o nível de activos fixos (em vez de simples acumulação de liquidez). O que isto pode significar é que esta poupança que está a ser realizada pode acabar por ser canalizada para o investimento.

Neste cenário positivo, aquilo que se pode estar a assistir é a uma acumulação de recursos por parte das empresas que pode vir a resultar em mais investimento. Esse efeito não foi imediato, mas pode vir a concretizar-se proximamente. “Dado que pode existir algum desfasamento temporal entre a acumulação de poupança e a materialização de investimento, esta relação pode consubstanciar-se em desenvolvimentos positivos no investimento das empresas portuguesas no futuro próximo”, afirma o relatório do Banco de Portugal.

Nas suas previsões para a economia portuguesa, publicadas também esta quarta-feira, o Banco de Portugal prevê uma forte aceleração do investimento este ano, com um crescimento de 8,8%, mantendo-se taxas de variação elevadas nos anos seguintes. Explica-se contudo que, enquanto este ano, o investimento público desempenha um papel fulcral nesta recuperação, nos anos seguintes aquilo que se está à espera é de uma aceleração do investimento empresarial.

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