Carlos, o "Chacal", volta a ser julgado em Paris

A cumprir duas penas de prisão perpétua, o terrorista arrisca agora uma terceira condenação.

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O "Chacal" durante um julgamento em Paris, em 2000. Reuters/REUTERS TV

Ilich Ramirez Sanchez, mais conhecido por Carlos, “o Chacal”, volta ao banco dos réus esta segunda-feira para responder por um crime cometido em 1974. O venezuelano, agora com 67 anos, conhecido pelos atentados cometidos em nome da Frente Popular de Libertação da Palestina durante a década de 70 e 80, já foi condenado a duas penas perpétuas e pode preparar-se para ser condenado uma terceira vez.

Aquele que foi durante muitos anos um dos mais procurados suspeitos de terrorismo regressa agora ao banco dos réus indiciado por um ataque num centro comercial de Paris, no Bairro Latino (Quartier Latin), que aconteceu a 15 de Setembro de 1974. O atentado resultou na morte de duas pessoas e feriu outras 34.

Carlos já tinha sido declarado inocente, primeiro em 1983 e depois em Fevereiro de 1996, por não terem sido reunidas provas suficientes para uma condenção. O inquérito foi depois reaberto em Janeiro de 2010, com uma nova acusação a ser validada a 3 de Maio de 2016 por um tribunal de recurso.

A advogada de defesa do "Chacal", Isabelle Coutant-Peyre, argumenta em declarações à BBC que o julgamento é um desperdício de tempo e dinheiro. “Qual é o objectivo de fazer um julgamento tanto tempo depois dos eventos?”, questiona.

Já o advogado Georges Holleaux, que representa as famílias das vítimas, reiterou que estas querem vê-lo em tribunal. “As vítimas esperaram tanto tempo pelo julgamento e condenação de Ramirez. As suas feridas nunca sararam”, afirmou à BBC. Se este julgamento resultar numa acusação de homicídio em primeiro grau, Ramirez poderá ser condenado a uma terceira pena perpétua.

Desta vez ficou claro que há “provas suficientes” que o ligam ao atentado terrorista, escreve o Le Monde. Apesar de ter negado o envolvimento neste ataque, Ramirez apresentou-se como o antigo “responsável militar” pelas operações da Frente Popular de Libertação da Palestina (FPLP) na Europa. “Reivindico todos os feridos e mortos. Sou um herói da resistência palestiniana e sou o único sobrevivente da equipa profissional na Europa, sou quem está à frente”, disse num interrogatório em 2013, citado pelo Le Monde.

Numa entrevista a um jornal francês – que desmentiu mais tarde –, Carlos confessou que tinha perpetrado o ataque como uma tentativa de persuadir o Estado francês a libertar um militante comunista japonês.

Um militante do Exército Vermelho nipónico, formado pela FPLP, tinha sido preso dias antes no aeroporto de Orly pela polícia francesa. Em resposta, a FPLP tomou um refém na embaixada de França em Haia, na Holanda, a 13 de Setembro de 1974. No dia 15, acontece o ataque no centro comercial. Carlos terá lançado uma granada de uma varanda com vista para a área comercial da avenida Saint Germain. O elemento que liga os dois acontecimentos é o facto de as granadas usadas em ambas as acções armadas terem origem num lote roubado em 1972 na base militar norte-americana de Miesau, na Alemanha.

Carlos terá tido um encontro com os autores do sequestro, dias antes, num restaurante chinês em Amesterdão, para lhes fornecer três granadas e duas pistolas. O lote de granadas foi posteriormente encontrado na casa de Ilich Ramirez Sanchez, em Paris.

Quem é “o Chacal”?

Ilich Ramirez Sanchez é considerado um dos nomes mais infames do terrorismo internacional. Foi obrigado a mudar de nome várias vezes ao longo da vida, mas a alcunha perpetuada pelos media foi a do "Chacal”, numa homenagem a uma personagem ficcional criada em 1971, por Frederick Forsyth. Um exemplar do livro em causa, O Dia do Chacal, sobre um assassino contratado, seria encontrado entre os pertences do terrorista durante uma rusga.

Com apenas 24 anos, Ilich trocou a Venezuela natal por Moscovo, então capital da União Soviética, e converteu-se ao Islão. Foi nessa altura que conheceu o movimento com o qual viria a estar envolvido: a Frente Popular da Libertação da Palestina.

Desde 1997 que cumpre, em França, uma pena de prisão perpétua pelo homicídio de dois agentes secretos e um informador, em 1975. Nesse mesmo ano, o "Chacal" tinha sequestrado 11 ministros dos países membros da OPEP, em Viena, na Áustria.

Em 2011 foi acusado e julgado por matar cinco pessoas e ferido 28 num ataque contra um comboio que fazia a ligação Paris-Toulouse, em 1982. Em 1983, colocou uma bomba no TGV que fazia a ligação entre Paris e Marselha, que resultou em três mortos e 13 feridos. Supõe-se que o alvo seria Jacques Chirac, que "Chacal" presumia que estivesse a bordo do comboio.

O "Chacal" perpetrou ainda vários ataques contra instituições detidas por judeus, como cadeias de venda a retalho e bancos, um pouco por toda a Europa. Foi capturado em 1994, enquanto estava internado num hospital em Cartum, capital do Sudão, para uma operação aos testículos. Recebeu a anestesia, adormeceu, mas em vez de ser operado foi conduzido para o aeroporto e colocado num jacto do governo francês.

O seu primeiro julgamento aconteceu há mais de 20 anos. Logo na primeira audiência, e quando questionado pelo juiz-presidente acerca da sua profissão, respondeu que era "um revolucionário profissional na velha tradição leninista".

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