O legado de Obama

Com a política conhecida por "Obamacare", Barack Obama provocou a maior mudança nas questões sociais no país desde os anos 1960.

O ainda Presidente Obama fez ontem uma rara visita ao Congresso norte-americano para tentar defender a lei do sistema de saúde conhecida como “Obamacare”, aquela que será a principal marca da sua passagem pela Casa Branca. Reforçados pelas eleições, os republicanos estão empenhados em reverter estas e outras políticas recentes nos EUA.

No afã de repelir tudo o que cheire a presidência Obama, os republicanos podem estar a perder uma tremenda oportunidade: em vez de reformar uma lei que é boa e torná-la eficiente, ganhando com isso em credibilidade e seriedade, podem enterrar uma política que melhorou efectivamente a vida de 22 milhões de americanos.

Logo a seguir virão as políticas sociais que o Partido Democrata promoveu nos últimos anos. Em cima da mesa está um vasto cenário de reformas que promete reverter tudo o que foram os últimos anos da presidência Obama. Os republicanos podem ter um presidente que é um corpo estranho ao partido, mas têm maioria nas duas câmaras e tencionam fazer uso disso para promover a sua agenda — e com ela concorrer aos próximos escrutínios. Esta versão conservadora da América pode, afinal, ser mais próxima dos eleitores.

Deixar um legado político não é fácil. Barack Obama concorreu ao primeiro mandato presidencial com a promessa de mudar os cuidados de saúde nos Estados Unidos e foi isso que fez. Com a política conhecida por “Obamacare” provocou a maior mudança nas questões sociais no país desde os anos 60. Foi eleito em parte por isso e foi reeleito também em parte pelo efeito que conseguiu.

Mas um segundo mandato hesitante acabou por retirar brilho aos anos Obama. Na geoestratégia os EUA contam com vários falhanços — começando com Guantánamo, continuando por Snowden e pela Síria e terminando na pirataria russa, o legado é infeliz quanto baste. Se em termos económicos Obama conseguiu recuperar das crises financeira e económica, em termos sociais ficou claro que governou para uma América que não é a dos eleitores. Por isso, o ainda Presidente está numa situação arriscada: se Trump for um fracasso, Obama pode ficar na história como o Presidente que se afastou dos eleitores e abriu caminho ao populismo. Se Trump for um êxito, e se as políticas de Obama forem definitivamente enterradas, terá sido apenas o primeiro Presidente negro da história dos EUA. Pouco para aquele que terá sido o político mais capaz de três gerações.

dqandrade@publico.pt
 

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