Na Madeira “a tradição já não é o que era”, mas nos Açores ainda é

No arquipélago madeirense, a consoada e o almoço do dia de Natal fazem-se cada vez mais fora de casa, e também a estadia nos hotéis está a aumentar. Nos Açores, são mais raros os casos de quem sai de casa nesta quadra.

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Passar o Natal fora de casa ainda é uma excepção à regra Fábio Augusto

“Ao longo dos últimos anos, tem vindo a quebrar-se o tabu de que o Natal só se passa em casa. Noutros países, a celebração do Natal já é considerada um período de época alta na hotelaria, em pé de igualdade com a passagem de ano. É verdade que os portugueses não prescindem de celebrar o Natal como um evento familiar, a forma como isso se vive é que se tem vindo a alterar”, reconhece Margarida Almeida, directora-geral do Paul do Mar Aparthotel. Localizado numa pequena aldeia homónima no noroeste da ilha da Madeira, construído praticamente sobre a areia e seixos negros da praia e com vista desimpedida para o largo Atlântico, a unidade de quatro estrelas tem vindo a tornar-se num pólo de atractividade para a região e adere este ano, pela primeira vez, à promoção da quadra natalícia como um evento especial, a par com o réveillon, tão famoso no resto da ilha.

“Não só temos vindo a assistir ao crescente aumento da venda de jantares de consoada e dos almoços de Natal, como também se tem verificado, neste período, um aumento da venda de dormidas", adianta. A tendência também se verifica em hotéis como os Pestana, com as unidades da Madeira, a par com as Lisboa e do Porto "claramente a mostrar sinais de preferência”.

"Pelo facto de a população estar a envelhecer e de haver uma tendência para se dar preferência à qualidade do tempo familiar que se vive nesta época, temos assistido a um crescente interesse de famílias pequenas ou grandes, com vontade de viver este momento juntos, mas sem o stress e trabalho da  preparação das respectivas refeições”, continua Margarida Almeida. Outro dos benefícios que aponta é o da conveniência de não ter de se viajar de carro durante a madrugada, chegar tarde a casa ou preocupar-se com a ingestão de álcool. “Um quarto de hotel confortável e convidativo é o final perfeito para uma noite de Natal inesquecível!”. Para as famílias que optem por dormir lá, os preços dos quartos duplos rondam os 76 euros por noite, com pequeno-almoço incluído.

Pelo contrário, os açorianos, com uma visão mais tradicional do Natal – passado em casa, com a família reunida à mesa – ainda estão a começar a aderir à ideia. Paulo Botelho, director do São Miguel Park Hotel, do Grupo Bensaude em Ponta Delgada, reconhece que nos últimos anos houve um aumento da curiosidade das famílias em passarem o Natal nos hotéis do grupo, mas que ainda não foi suficiente para que estes começassem a criar pacotes para a quadra inteira. “Vir jantar ao hotel na noite de Natal não é assim tão incomum, mas ficar para o dia seguinte ainda é”, diz. Ainda assim, acredita “piamente” que a partir de 2017 as famílias comecem “a apostar em passar a quadra inteira nos hotéis, como se faz lá fora”.

Maria Alves é uma das poucas açorianas que quebra a tradição. Há quatro anos, desde que o pai morreu, ela e a família mais próxima começaram a passar a consoada em hotéis. “Se me dissessem há dez anos que ia passar a consoada fora, eu não acreditaria. Para mim, passar a consoada era em família, em casa. Mas quando o meu pai morreu, houve alguma coisa que nos levou a ir para fora, a alteração na composição da família ou a idade, que já não dá tanto apetite para fazer coisas em casa, porque estamos mais cansados e temos recordações dos que já partiram”. Os familiares que consegue reunir consigo para o Natal têm já uma idade avançada – são apenas oito, porque a restante família está espalhada por todo o mundo e não consegue reunir-se a eles em Ponta Delgada – e ainda não há crianças. “Se calhar, quando começarem a nascer os netos, voltamos a ficar todos em casa, quem sabe”.

Mas quando olha à volta, não consegue apontar muitos casos de conhecidos que passem o Natal inteiro fora de casa. É por isso que os hotéis do grupo Bensaude apostam, por agora, em menus especiais de consoada, “com tudo o que é tradição”. Nos Açores, o bacalhau é rei, o peru não tem lugar à mesa e a carne assada é muito consumida. O rolo de carne começa a ser uma presença cada vez mais comum, uma influência dos muitos continentais que se mudaram para o arquipélago, e a tradição de começar a fazer o bolo de Natal com antecedência mantém-se. “Quanto mais velho, mais saboroso, porque vai vertendo e ficando mais amolecido. A partir do dia 8, as pessoas normalmente já têm o seu bolo de Natal feito”, conta Maria.

Texto editado por Ana Rute Silva

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