Sinais de que algo mudou no Brasil?

Pode um homem (ou uma mulher) fazer a diferença num país tão imenso como o Brasil? A demissão do Ministro da Cultura, Marcelo Calero Faria Garcia, de 34 anos e as suas subsequentes entrevistas à Folha de São Paulo e depoimento ao Ministério Público fazem-nos acreditar que sim. Que é possível, muito raramente, que o idealismo e a integridade triunfem, quando beneficiam do apoio (competente, como transparece do depoimento e do processo) de outras pessoas, desconhecidas, em várias outras instituições como a imprensa (Folha de São Paulo), na Polícia Federal do Brasil e, no caso em apreço, dos técnicos e dirigentes do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) do Brasil. Por conseguinte, não é o esforço de apenas um, mas de muitos, movidos por uma igual crença num Brasil melhor. Bem hajam…

O caso, infelizmente, é vulgar. O Ministro-Chefe da Secretaria do Governo Geddel Vieira Lima – que entretanto se demitiu e que era um dos ministros mais poderosos do Governo Temer –, pressionou o Ministro da Cultura para alterar um parecer administrativo do IPHAN em relação à construção de um prédio de luxo de 30 andares em Salvador no estado da Bahia. Geddel Vieira Lima teria alegadamente adquirido um apartamento nesse prédio e, por conseguinte, pretenderia alterar uma decisão administrativa em benefício próprio.

O Ministro da Cultura, bem, recusou a pressão. Contudo, não só foi pressionado por Geddel, como por outro dos ministros mais poderosos do Governo Temer, o Ministro da Casa Civil Eliseu Padilha e seus assessores e, por último (segundo alega) pelo próprio Presidente Michel Temer que, segundo o Ministro da Cultura, teria indicado que a Advogada Geral da União, a ministra Grace Mendonça, “teria uma solução”, algo entretanto negado pela própria.

O enredo é tristemente familiar: o “toma lá dá cá” que ocorre nos bastidores para procurar resolver “um problema”. Mas o Brasil descrito neste retrato pelo ex-Ministro da Cultura, é o Brasil antigo, em que ministros parecem considerar a lei como um empecilho e procuram movimentar influências e recursos públicos para encontrar uma solução para “um amigo”.

O que mais choca disto tudo nem é a tentativa, ao que tudo indica ilegal, para alterar uma decisão administrativa em benefício de um ministro do próprio Governo. O que mais choca é que, num Brasil economicamente vasto e sempre potencialmente poderoso, a braços com uma grave crise económica, política e social: o Presidente, pelo menos dois dos mais importantes ministros e três ministérios, “se entretenham” a tratar de um assunto de interesse pessoal de um ministro - de um prédio que não deveria ter 30, mas sim 13 andares.

O ex-Ministro da Cultura terá, alegadamente, uma gravação da sua conversa com o Presidente Michel Temer. E dois importantes jornalistas publicaram artigos na Folha de São Paulo em que argumentam que o Presidente terá violado a lei, chegando um deles a sugerir que o Presidente se deveria demitir.

No Brasil, a Câmara dos Deputados deverá aprovar uma amnistia “Caixa 2” (movimentos irregulares de fundos de campanha), que se prevê virá a desresponsabilizar centenas de políticos e deputados de eventuais denúncias no âmbito da actual processo “lava-jato” e, argumenta o editor chefe do HuffPost Brasil, de crimes como lavagem de dinheiro e mesmo peculato. Os amigos sempre primeiro?

O Brasil nunca será grande enquanto tão altos responsáveis continuarem a dar prioridade aos seus interesses pessoais e a problemas de amigos ...

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