E eis-nos no mês do diabo

Do encontro de contas entre os discursos de hoje e a realidade de amanhã, veremos o que sobra para os portugueses e para Portugal.

Foi em Julho que Passos Coelho disse, dramático: “Gozem bem as férias que em Setembro vem aí o diabo.” Pois bem, chegámos a Setembro. E apesar de Luís Afonso, com humor, já ter antecipado o diabo nos seus bartoons diários, agora é que a prova do demo se fará em definitivo. Este domingo, o primeiro do mês, teremos os discursos do costume, com que esquerda e direita anunciam o seu regresso à ribalta política, depois de eclipsadas pelo sol. E, neles, os partidos tentarão comprovar as suas teses: Passos, a do diabo, com Cristas no essencial em sintonia; e Jerónimo o das conquistas (ou melhor, das reconquistas), das quais não haverá como “voltar atrás”. Catarina Martins, do Bloco, antecipou uma semana estes regressos rituais e, no dia 28, no Fórum Socialismo 2017, avisou: “Nenhum passo atrás.”

O PS e o Governo, por sua vez, empenham-se em prometer o paraíso possível, que afaste o demónio, e onde alegremente coabitem contenções, reposições e reforços de investimento. Para o orçamento de 2017, já foi dito e publicado, a orientação geral será continuar com as reposições dos rendimentos dos trabalhadores por conta de outrem, funcionários públicos e pensionistas. Além disso, haverá novos investimentos nas áreas públicas. PSP e GNR? Reforço do investimento, já foi prometido, sobretudo para reabilitar esquadras e quartéis. Saúde? Reforço do investimento, naturalmente. Educação? Reforço do investimento, claro. Ciência? Reforço do investimento, óbvio. Cultura? Reforço do investimento, como não?

É por detrás destas reposições e reforços que PSD e CDS vêem espreitar os chifres de belzebu, contando que a manta seja demasiado curta para cobrir tanta e tão necessitada gente. Que não é só esta. O CDS, por exemplo, quer que o Estado pague o que deve aos fornecedores do Serviço Nacional de Saúde (com dívidas a crescer à média de 32 milhões por mês, dizem os centristas). E o PSD há-de insistir no combate às desigualdades sociais, coisa que, mesmo poupando dinheiro a prazo, há-de gastar mais algum pelo caminho.

Passos, mesmo assim, já anteviu no Pontal que a “geringonça” talvez dure um ano, mas espera vê-la “arder” na fogueira das suas opções políticas económicas. O contrário, naturalmente, do que espera o PS; e do que, fiando-se nele (ainda que condicionalmente), esperam o PCP e o BE. Do encontro de contas entre os discursos de hoje e a realidade de amanhã, veremos o que sobra para os portugueses e para Portugal. Se o céu, se o inferno. Ou talvez qualquer coisa de intermédio, como um mais ou menos suportável purgatório.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários