Luís Amado: "BCE e DG Comp são um centro burocrático extremamente agressivo"

Ex-presidente não executivo do Banif está a ser ouvido no Parlamento.

O ex-presidente (não executivo) do conselho de administração do Banif, Luís Amado, está na tarde desta quarta-feira a falar na Comissão Parlamentar de Inquérito à nacionalização (em 2012) e à medida de resolução e venda da instituição ao Santander. Trata-se da primeira vez que Amado depõe sobre o tema, tendo começado por referir que iria fazer uma breve exposição, mas que se revia nas explicações dadas na terça-feira em São Bento por Jorge Tomé. Avançou mesmo que a intervenção do ex-presidente executivo reflecte a posição dos restantes administradores sobre o que se passou no Banif.

Para o ex-ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros dos governos de José Sócrates, em Dezembro de 2012, quando o banco foi alvo de uma injecção de fundos públicos de 1100 milhões, o Banif era uma instituição de referência, com 4% da quota de mercado e forte presença nas ilhas. Este facto justificou, "e bem", a intervenção do Estado – o que foi feito "contra os pareceres do Banco Central Europeu e  da Direcção-Geral da Concorrência da Comissão Europeia (DG Comp)" e com o apoio do Banco de Portugal e do anterior Governo liderado por Passos Coelho. 

"A injecção de 1100 milhões no Banif foi uma decisão do Estado, que diluiu totalmente a posição dos accionistas, e a partir daí o Banif passou a ser uma questão do Estado e não digo de Estado", sublinhou Luís Amado. O economista classificou ainda a medida de resolução do banco decretada pelo actual primeiro-ministro António Costa como um tema "do Estado".

O ex-chairman lamentou "o desfecho do banco e de este ter morrido na praia" num contexto de uma União Bancária Europeia "que passa o rolo compressor" por algumas instituições. Hoje, Amado classifica o BCE e a DG Comp como "um centro de poder burocrático extremamente agressivo e que tinha um preconceito em relação ao Banif que nunca abandonou", o que contribuiu para o colapso da instituição. 

Amado evidencia que quando foi nomeado presidente não executivo do Banif foi-lhe dito que o banco não necessitava de mais capital e seis meses depois o banco estava a ser alvo de uma nacionalização. "O banco não implodiu por dentro, por falta de coesão na administração, embora houvesse divergências. Houve sempre uma linha de solidariedade permanente entre administração e a comissão executiva." Mas admite "divergências pontuais entre a gestão e os administradores do Estado, mas que nunca bloquearam as decisões". 

"O processo de venda da [seguradora] Açoreana, o método seguido, ainda quando o Citibank estava com o processo, houve uma divergência no conselho de administração, em que termos exactos não os posso precisar", referiu.

Sobre a possibilidade de um investidor da Guiné Equatorial entrar no Banif, Amado explicou que fez “a apresentação do banco, juntamente com o Dr. Jorge Tomé". Em resposta à deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, afirmou: "Como se lembra, as condições de mercado e de risco de Portugal, nesse tempo [2012 -2014], eram adversas. E não foi possível encontrar investidores e a aproximação à Guiné Equatorial decorre dessa situação. O risco do país nunca gerou interesse de investidores. E quando apareceram investidores da Guiné Equatorial" desenvolveram-se os contactos. "Mas houve um ruído muito grande em Portugal à volta da Guiné Equatorial, o que pode ter levado à desistência desses investidores – o fundo soberano da empresa de gás ou de petróleo". 

Em reacção ao deputado do CDS, João Almeida, Amado explicou que, dado que o Banif não gerava interesse por parte de investidores europeus, por exemplo, por estar num país sob intervenção da troika e ser uma instituição alvo de um programa de reestruturação da DG Comp, "quando surgiu um investidor de outra geografia aproveitámos". E a mais-valia dessa escolha estava no capital, e o capital era a exigência de estabilidade que o banco necessitava". Os contactos com os investidores da Guiné Equatorial resultaram de "uma questão de emergência, não de uma estratégia". 

A presença de Amado, que foi presidente não executivo do conselho de administração do Banif entre Março de 2012 e Dezembro de 2015, segue-se às audições dos dois últimos presidentes executivos do banco, Joaquim Marques dos Santos e Jorge Tomé, que estiveram na terça-feira em São Bento.

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