Transgénero inglesa encontrada morta após ter-lhe sido negada transferência para prisão feminina

Vicky Thompson, de 21 anos, cumpria pena num estabelecimento prisional masculino. Tentou a transferência para uma prisão de mulheres mas o pedido foi-lhe negado.

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Vicky com o namorado Robert Steele Robert Steele/Facebook

Vicky Thompson, uma transgénero de 21 anos, foi encontrada morta há uma semana, na sua cela, num estabelecimento prisional para homens em Leeds, no norte de Inglaterra. No passado tinha ameaçado suicidar-se caso fosse levada para uma prisão masculina. Era “essencialmente uma mulher”, uma “pessoa transgénero vulnerável”, segundo palavras do seu advogado. Terá cumprido a ameaça, depois de lhe ter sido negada a transferência para uma cadeia feminina. O Ministério da Justiça britânico está a ser fortemente criticado e responsabilizado pela sua morte.

Em Agosto, Vicky Thompson tinha sido condenada a 12 meses de prisão, com uma pena suspensa por dois anos, tendo ficado temporariamente em prisão preventiva no tribunal de primeira instância de Bradford, depois de ter violado os termos da sentença que lhe tinha sido determinada. Nascida com o sexo masculino, desde o início da adolescência que se identificava como uma mulher e se apresentava como tal. Aos 21 anos, ainda não tinha sido submetida à cirurgia de transição de sexo mas afirmava-se como sendo uma mulher. Após ter ficado detida, por razões não conhecidas, Vicky pediu ao juiz que estava a acompanhar o seu caso para cumprir pena na prisão feminina de New Hall, perto da cidade inglesa de Wakefield. O pedido foi-lhe negado.

O advogado da jovem, Mohammed Hussain, citado pela BBC e pelo The Guardian, descreveu Vicky em tribunal como sendo uma transgénero “vulnerável” e “essencialmente mulher”.

O namorado de Vicky, Robert Steele, contou à BBC que tinha falado com a companheira no dia anterior à sua morte. “Ela não gostava daquilo porque as pessoas diziam-lhe coisas por se vestir como uma mulher”, partilhou Steele.

No passado dia 13 de Novembro, Vicky foi encontrada inanimada na sua cela. “O pessoal e os paramédicos tentaram reanimá-la mas ela foi declarada morta às 20h48 [hora local]. Tal como em todas as mortes sob detenção haverá uma investigação”, confirmou um porta-voz da direcção dos serviços prisionais britânicos.

Neste momento, a morte da jovem não está a ser tratada pelas autoridades como sendo suspeita. Tudo indica que se terá suicidado, em circunstâncias por revelar.

O caso de Vicky teve um desfecho diferente do de Tara Hudson, uma transgénero de 26 anos, que após uma condenação de 12 semanas por agressão, foi também conduzida para uma prisão masculina. Maquilhadora de profissão, Tara viveu toda a vida adulta como mulher e foi submetida nos últimos seis anos a cirurgias de reconstrução para concluir a mudança de sexo. Legalmente, no entanto, continuava a ser um homem.

Segundo o seu advogado, depois de ter sido levada para um estabelecimento prisional para homens em Bristol, Tara estava separada dos restantes presos e “fechada numa cela 23 horas por dia”. A defesa de Tara pediu em tribunal que esta fosse transferida para a unidade prisional feminina de Eastwood Park, em Gloucestershire. O pedido foi aceite, quando nas ruas decorriam várias manifestações organizadas por transgéneros a exigir a sua transferência.

O Ministério da Justiça britânico publica no seu site as leis que assistem um transgénero quando detido. Segundo a legislação nacional, os presos devem ser colocados sob detenção de acordo com o sexo indicado na certidão de nascimento, como é reconhecido pela lei britânica; se uma pessoa tiver obtido uma certidão de reconhecimento de género, deverá ter uma nova certidão de nascimento onde será indicado o sexo “adquirido”; os presos que obtenham uma certidão de reconhecimento de género na prisão, na maioria dos casos, devem ser transferidos para estabelecimentos prisionais do novo sexo.

Por outro lado, a lei determina que às pessoas transgénero onde se confirme um “processo suficientemente avançado de mudança de sexo" podem ser colocadas num estabelecimento prisional de acordo com o seu novo sexo, “mesmo que a lei ainda não os reconheça como tendo uma nova identidade sexual”. Em caso de dúvidas, deve ser realizada uma conferência para "avaliar as circunstâncias individuais do preso e fazer uma recomendação".

As reacções públicas à morte de Vicky Thompson têm chegado desde esta quinta-feira, quando foi noticiada, através das redes sociais e de responsáveis políticos. Tim Farron, líder dos Democratas Liberais, defendeu, citado pelo Guardian, uma “revisão urgente da lei”, enquanto Cat Smith, responsável pela pasta da Mulher e Igualdade no Labour, considerou a morte da jovem como “devastadora”.

Smith já tinha pedido ao secretário de Justiça, Michael Gove, no Parlamento, no passado dia 3 de Novembro, a clarificação dos procedimentos para a transferência de presos transgénero, depois de conhecida a decisão sobre Tara Hudson, no final de Outubro.

"Dado que levantei a questão muito recentemente com o caso Tara Hudson, é devastador que a questão tenha voltado tão rapidamente, mas com circunstâncias trágicas. A realidade é que o envio de mulheres para uma prisão de homens para cumprir penas vai quebrar até mesmo a pessoa mais forte”, argumentou a trabalhista. Para Smith, ou a lei não está a ser “implementada de forma correcta ou não responde ao seu propósito”. “E eu pretendo descobrir qual das opções se trata”, asseverou.

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