“Não me passa pela cabeça que [o acordo] possa ser revertido”

Secretário de Estado dos Transportes “estranha” posição dos pilotos e diz que reivindicações estavam entre as matérias não passíveis de acordo.

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Sérgio Monteiro foi o rosto do Governo no debate Daniel Rocha

O secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, estranha a posição do Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) que ontem fez um comunicado a exigir o cumprimento de dois pontos que não estavam no acordo assinado em Dezembro com o Governo, ameaçando com uma nova greve.

Em causa estão a devolução de diuturnidades e a participação dos pilotos no capital da TAP, pontos que Sérgio Monteiro garante terem ficado clarificadas na altura por não serem passíveis de acordo.

“Estranhamos esta posição. O acordo não foi construído para ganhar tempo. Faço daqui um apelo para que esse acordo seja cumprido e não me passa pela cabeça que possa ser revertido por posições que estavam clarificadas no passado”, afirmou, durante a conferência de imprensa que se seguiu ao Conselho de Ministros desta quinta-feira.

O secretário de Estado dos Transportes lembrou que em Dezembro e “perante um conjunto de preocupações legítimas dos trabalhadores, o Governo aceitou a criação de um grupo de trabalho “para harmonizar as matérias passíveis de acordo e deixando de lado as matérias não passíveis de acordo”.

Tanto a devolução de diuturnidades e como a participação na TAP “foram discutidas e clarificadas desde logo”, garante, numa “primeira conversa que existiu ainda antes da formação do grupo de trabalho”. "Podia ter ficado alguma ambiguidade em relação às duas matérias, nomeadamente o que acontecia às diuturnidades que estavam suspensas e o que acontecia à percentagem de capital que os pilotos reivindicam, mas foram discutidas e clarificadas desde logo", acrescentou.

“As diuturnidades congeladas serão, na sequência da privatização, descongeladas, mas não terão qualquer efeito retroactivo. Essas matérias são da competência dos futuros accionistas da TAP. Isso foi dito com uma clareza tal, que nenhum outro sindicato que esteve sentado à mesa reivindicou este aspecto”, argumentou Sérgio Monteiro.

Já em relação à participação no capital da transportadora aérea, essa “é uma posição antiga” dos pilotos, tal como o parecer da Procuradoria-Geral da República, que considerou ilegal um acordo alcançado em 1999 entre o SPAC e o Governo de então.

Em Dezembro do ano passado, o Governo assinou um entendimento com nove sindicatos que ameaçavam fazer uma greve de quatro dias entre o Natal e o Ano Novo.

Este acordo veio salvaguardar alguns direitos dos trabalhadores num cenário de privatização da TAP, que o Governo pretende concluir até ao final de Junho, com a alienação de 66% do capital.

O documento previa, por exemplo, que o comprador não poderá avançar com despedimentos colectivos durante 30 meses após a assinatura do contrato ou enquanto o Estado for accionista. Previa ainda a proibição de denúncia unilateral dos acordos de empresa por 36 meses.

Os pontos agora colocados em cima da mesa não fazem parte do acordo, mas no comunicado divulgado ontem o SPAC garante que, apesar de não estarem plasmadas no entendimento, “ficaram comprometidas” pelo executivo.

Já nesta quinta-feira, o sindicato emitiu um novo comunicado para clarificar que “o impasse” no acordo celebrado em Dezembro “deve-se em exclusivo ao Governo e à TAP/PGA” e enumera as razões.

Na perspectiva do SPAC, ficou demonstrado “pelo Governo e pela TAP” que o acordo “foi apenas uma manobra para iludir os pilotos, os eventuais investidores e a opinião pública, uma vez que nem o Governo nem a TAP procuram cumprir com a palavra assumida”.

No que respeita às diuturnidades, entende que o assunto faz parte do acordo de empresa e, por isso, “faziam parte integrante do acordo de Dezembro” e que a sua não reposição “é inconstitucional, no cenário da privatização do Grupo TAP”. O sindicato diz ainda que “os acordos são para cumprir, incluindo o celebrado com o Governo e com a TAP em 1999”.

Num esclarecimento enviado momentos depois, o SPAC anexa uma carta remetida pela TAP ao sindicato a 23 de Março, como resposta às declarações de Sérgio Monteiro. Os pilotos acusam o secretário de Estado de ter proferido declarações "imprecisas".

Nesta carta, a TAP recorda que um dos pontos do acordo se referia à "iniciação, ou retoma, e negociação de todas as disputas interpretativas em curso no domínio dos acordos de empresa". Mas, na missiva, a transportadora área também refere que, nas reivindicações do SPAC, foram identificadas matérias que "extravasam o objecto do compromisso", para as quais não existia "qualquer margem negocial por parte da empresa". 

Passos “surpreso” com ameaça de greve na TAP
Esta tarde, o primeiro-ministro afirmou que recebeu “com surpresa” a ameaça e a justificação dos pilotos para uma nova greve na TAP e diz esperar que não haja violação do acordo que o Governo e o Sindicato dos Pilotos assinaram na sequência do último braço de ferro.

“Espero que isso [desrespeito pelo acordo e recurso à greve] não venha a acontecer. O acordo foi alcançado, está a ser respeitado pelo Governo, e normalmente nós gostamos que os acordos que vamos fazendo possam ser respeitados”, comentou Pedro Passos Coelho quando interpelado sobre o assunto pelos jornalistas à saída de uma conferência da AICEP.

O governante criticou a atitude dos pilotos afirmando que o Governo não violou o estipulado. “Na altura foi alcançado um acordo e esse acordo, nesta altura, pode ser denunciado por uma das partes sem que, julgo eu, a outra parte tenha feito qualquer coisa que o pudesse justificar?”

Passos Coelho também recusou que haja violação de compromissos que foram assumidos apenas por palavra sem terem sido incluídos no documento. “Quando se faz um acordo que é reduzido a escrito não há ambiguidade naquilo que se acorda. O que se acorda é aquilo que está no texto do acordo. E o que está [neste] foi subscrito pelos dois parceiros, o que não está não foi”, rematou.Com Raquel Almeida Correia e Maria Lopes

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