União Europeia e Estados Unidos juntos no reforço da pressão sobre a Rússia

Chefes de Estado e de Governo europeus aprovaram plano que tem como objectivo forçar a Rússia e negociar "nos próximos dias". Obama falou uma hora ao telefone com Putin, apelando a solução diplomática.

Foto
Durão Barroso e Herman Von Rompuy transmitiram a posição dos líderes europeus, que foi decidida "por unanimidade" GEORGES GOBET/AFP

Os líderes da União Europeia (UE) decidiram não avançar para já com a aplicação de sanções à Rússia, mas deram uma resposta a uma só voz que muitos achavam difícil de alcançar antes do início da cimeira extraordinária que decorreu nesta quinta-feira em Bruxelas.

Mais do que um anúncio de sanções, os chefes de Estado e de Governo desenharam um roteiro com três passos, com o objectivo de acalmar a tensão entre a Ucrânia e a Rússia, provocada pela disputa da região da Crimeia, e com o desejo de não o aplicar até ao fim, como disse o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy.

Os líderes europeus decidiram suspender as negociações com a Rússia sobre o acordo de facilitação de emissão de vistos, que é uma antiga pretensão de Moscovo. Ficam também suspensas as negociações mais globais, com vista à assinatura de um novo acordo de cooperação entre as duas partes. Nesta primeira fase, o Conselho Europeu deu também o seu apoio aos membros do G8 que decidiram suspender os preparativos para a participação na próxima cimeira, marcada para Junho, na cidade russa de Sochi.

Se esta primeira pressão sobre Moscovo não for suficiente para resolver o problema, então sim, a UE avançará com a aplicação de sanções, que poderão incluir o congelamento de contas bancárias e vistos a pessoas “com responsabilidades” no conflito entre a Ucrânia e a Rússia, mas de uma forma que Herman Van Rompuy considerou ser mais “direccionada” do que as medidas anunciadas também nesta quinta-feira pelos Estados Unidos da América (EUA).

“A solução para esta crise deve ser encontrada em negociações entre os Governos da Ucrânia e da Federação Russa, incluindo eventuais mecanismos multilaterais”, lê-se na declaração dos chefes de Estado e de Governo da UE. Essas negociações devem começar “nos próximos dias” e produzir resultados “num período de tempo limitado”.

Se não houver um acordo entre Kiev e Moscovo que ponha fim ao clima de tensão, a UE poderá então decretar outras medidas, mais específicas, como a proibição de viagens, o congelamento de bens e o cancelamento da cimeira com a Rússia.

Durante a conferência de imprensa em que o plano foi apresentado, Herman Van Rompuy mostrou-se visivelmente irritado com a comparação entre as medidas europeias e norte-americanas. Na manhã desta quinta-feira — horas antes do arranque da cimeira em Bruxelas —, o Presidente dos EUA, Barack Obama, assinou uma ordem executiva para congelar a emissão de vistos a “responsáveis ou cúmplices de ameaças contra a soberania e a integridade territorial da Ucrânia”, sem avançar nomes.

O que Washington anunciou, disse o presidente do Conselho Europeu, foi “o congelamento de alguns vistos” e a hipótese de o Presidente norte-americano agir no futuro. “É uma decisão genérica, sem detalhes”, disse Herman Van Rompuy.

Apesar deste momento de crispação, foi notória a coordenação entre a UE e os EUA, a avaliar pela sequência de acontecimentos que foram sendo conhecidos ao longo do dia — enquanto do outro lado do Atlântico Barack Obama falava em sanções e enviava seis caças F-15 para reforçar a zona de defesa da NATO nos Estados bálticos, na Europa os chefes de Estado e de Governo acomodavam as diferentes sensibilidades e alcançavam um acordo unânime.

Ao mesmo tempo, secretário de Estado norte-americano, John Kerry, dizia ao ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, que a Rússia tem de permitir a entrada de observadores internacionais na Crimeia, depois de uma missão da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa ter sido barrada por “um grupo de homens não identificados e uniformizados”, segundo o ministro da Defesa polaco.

Mas o encontro entre os responsáveis — o segundo em dois dias — não produziu resultados, disse Lavrov à agência Interfax: “Por enquanto, não podemos dizer à comunidade internacional que há um acordo.”

Em Bruxelas, ao lado de Herman Van Rompuy, o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, dizia que os chefes de Estado e de Governo não estiveram reunidos “para competirem com nenhum aliado” pela resolução da crise. “A União Europeia tem algumas especificidades e os Estados Unidos têm outras”, disse Barroso, dando como exemplo a assinatura do acordo de cooperação com a Ucrânia — algo que, por razões óbvias, Washington não poderia oferecer a Kiev.

Os dois responsáveis falaram a uma só voz sobre “a mais grave ameaça à segurança do continente desde a guerra dos Balcãs” e fizeram eco da “forte condenação” da UE pela “violação não provocada da soberania e da integridade territorial ucranianas pela Federação Russa”.

Os chefes de Estado e de Governo da UE instam a Rússia a “retirar imediatamente as suas forças armadas para as respectivas zonas de acantonamento” e a permitir o acesso à Crimeia a observadores internacionais, à semelhança do que tinha sido referido por John Kerry.

O texto final traduz também o apoio incondicional da UE ao Governo provisório da Ucrânia, com a condenação do referendo proposto pelas autoridades da Crimeia.

Apesar de lembrar os “objectivos comuns” da UE e da Rússia, a declaração dos líderes europeus é inequívoca no alerta para os perigos de um aumento da tensão: “Quaisquer passos da Federação Russa no sentido de desestabilizar a situação na Ucrânia terão consequências graves para as relações entre a União Europeia, de um lado, e a Federação Russa, do outro, que incluiriam um vasto conjunto de áreas económicas.” 

Obama ao telefone com Putin
Ao final do dia (hora de Lisboa), soube-se que Barack Obama e Vladimir Putin falaram ao telefone durante uma hora. Segundo a Casa Branca, o Presidente americano tentou persuadir o líder russo a aceitar uma solução diplomática para a crise na Ucrânia.

A solução proposta por Obama é o regresso das tropas russas às bases da Crimeia, o envio de observadores internacionais para garantir os direitos da população russa na Ucrânia e conversações directas da Rússia com o novo Governo de Kiev.

Na segunda conversa em seis dias entre os dois Presidentes, Obama repetiu a Putin que a Rússia violou a integridade territorial e a soberania da Ucrânia.

Na resposta, segundo um comunicado do Kremlin, Putin disse a Obama que as relações entre os dois países não devem ser afectadas pela Ucrânia. “O Presidente da Rússia destacou a importância das relações americano-russas para assegurar a estabilidade e a segurança no mundo. Estas relações não devem ser sacrificadas por problemas internacionais isolados, ainda que extremamente importantes”, diz um comunicado do Kremlin. com H.D.S.

Notícia actualizada às 23h59 e 0h18 Acrescenta informação sobre telefonema entre Obama e Putin

Sugerir correcção
Comentar