Novo líder do PD italiano já fechou a sua proposta de reforma do sistema eleitoral

Matteo Renzi negociou com a direita italiana, incluindo com o antigo primeiro-ministro Silvio Berlusconi. Iniciativa levou à demissão do presidente do PD.

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Matteo Renzi explicou aos jornalistas o acordo com Berlusconi AFP/TIZIANA FABI

O novo líder do Partido Democrático italiano, Matteo Renzi, fechou um acordo com o antigo primeiro-ministro Silvio Berlusconi que abre a porta à aprovação de uma reforma do sistema eleitoral, através do escrutínio proporcional em duas voltas, e da alteração do modelo de funcionamento do Senado, com uma redução das competências atribuídas à câmara alta do parlamento.

O compromisso, classificado como “histórico” por vários meios de comunicação social italianos, surge um mês e meio depois da invalidação da actual lei eleitoral do país pelo Tribunal Constitucional, que a considerou ilegítima. A proposta tem ainda de passar pelo crivo parlamentar – o voto definitivo ainda não foi agendado, mas já foi decidido que vai acontecer antes das eleições europeias de 25 de Maio.

O princípio por detrás da proposta de nova lei eleitoral é o da “governabilidade”, isto é, que, depois de contados os votos, seja possível atribuir a vitória a um determinado partido ou candidato. Para tal, o sistema prevê que a distribuição dos lugares na Câmara de Deputados seja feita numa base proporcional nacional, com um efeito maioritário – o partido que chegar aos 35% terá direito a um prémio de maioria para chegar aos 53%.

Renzi, que prometeu avançar rapidamente com a reforma do sistema eleitoral depois de ascender à liderança do PD, eleito com 70% dos votos nas primárias de Dezembro, tinha considerado três opções diferentes: uma inspirada no sistema espanhol, outra no alemão e outra o regresso ao sistema maioritário, corrigido com um prémio. A sua proposta final é, sublinhou, genuinamente italiana. “É um sistema bipolar límpido à luz do sol. Chamemos-lhe 'Italicum'”, sugeriu (a anterior lei eleitoral, aprovada em 2005, era conhecida como “Porcellum” – o nome em latim foi dado pelo seu autor, o então ministro da Liga do Norte, Roberto Calderoni).

“O nosso objectivo é que o vencedor das eleições possa contar com uma maioria sólida. Para isso, propomos um prémio de maioria, entre os 53% e os 55%, para quem obtém pelo menos 35% dos votos. Se nenhum partido alcançar esse valor, como sucedeu no passado, existirá a possibilidade de uma segunda volta, não entre dois candidatos a primeiro-ministro mas entre dois partidos ou coligações”, explicou Matteo Renzi, numa exposição da sua proposta aos membros do PD.

Renzi rejeitou as admoestações e críticas por ter negociado com Silvio Berlusconi, devolvendo-lhe o protagonismo após a sua expulsão do Senado, no final de Novembro. “A legitimação política de Berlusconi não tem nada a ver comigo, mas sim com os seus eleitores”, retorquiu o líder florentino. “Hoje fazemos as regras com Berlusconi para amanhã não precisarmos de governar com ele”, esclareceu Matteo Renzi, referindo-se à actual coligação de Governo que integra o PD e o antigo Povo da Liberdade, que entretanto se dissolveu.

Antes de negociar com Berlusconi, Renzi já tinha conseguido o acordo de Angelino Alfano, o antigo braço direito do Cavaliere que se autonomizou politicamente numa nova Forza Italia, o maior partido de direita – e que é o número dois do Governo de coligação dirigido por Enrico Letta –, para avançar para a votação da sua proposta. Só o Movimento 5 Estrelas do comediante Beppe Grillo, e outros pequenos partidos, como o movimento cívico do antigo primeiro-ministro Mario Monti, rejeitam o modelo: com o “prémio de maioria” previsto por Renzi, as possibilidades de entrarem numa coligação diminuem consideravelmente.

Igualmente crítico é Gianni Cuperlo, o adversário de Renzi nas primárias, que, apesar da derrota, foi conduzido a presidente do PD. O deputado, de 52 anos, não gostou da negociação de “pactos” com Berlusconi, nem que a direcção do partido tivesse “imposto” aos membros o seu próprio pacote de reforma eleitoral. “Demito-me, porque estou surpreendido e alarmado por uma certa concepção do partido”, escreveu Cuperlo numa carta aberta.

Renzi propôs ainda reformar o artigo 5 da Constituição, para reduzir substancialmente os poderes das regiões e do Senado, que, na sua visão, deverá passar a ser uma câmara não-eleita para questões regionais.

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