Regulador questiona maior accionista do BPI sobre financiamento a Angola

A CMVM inquiriu o CaixaBank (dono de 45% do BPI) sobre o acordo estabelecido com o governo liderado por José Eduardo dos Santos, e que envolve uma linha de financiamento de 400 milhões de euros.

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Caixabank tem em curso uma OPA sobre o BPI Reuters/Albert Gea

A Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) inquiriu o maior accionista do BPI, o CaixaBank (com 45% do banco), sobre os contornos da negociação com o governo de José Eduardo dos Santos para facultar uma linha de crédito de 400 milhões de euros ao Estado angolano, que tem aparecido associado a falta de liquidez e atrasos nos pagamentos aos credores e fornecedores.

O PÚBLICO apurou que a CMVM fez nos últimos dias diligências junto do CaixaBank para perceber, nomeadamente, qual é o perímetro da operação de financiamento a Angola e assegurar que esta não envolve o BPI, alvo de uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) lançada pelo grupo espanhol. Contactada pelo PÚBLICO, o regulador do mercado de capitais optou por não comentar as informações. De igual modo, o CaixaBank não respondeu às questões foram enviadas por email esta quinta-feira, ficando por esclarecer as razões que envolvem este empréstimo a este país emergente.  

O acordo entre o CaixaBank e o governo de Luanda consta de um despacho de 16 de Agosto, assinado pelo Presidente José Eduardo dos Santos, para, conforme referiu a Lusa na altura, "diversificar as fontes de financiamento para a cobertura de projectos de investimentos públicos para o desenvolvimento económico e social do país”.

Desde meados de 2014 que Angola atravessa uma crise financeira económica, e cambial, resultante da quebra para metade das suas receitas da exportação de petróleo, que tem levado o governo de Luanda a recorrer à emissão de dívida para garantir o funcionamento do Estado. E muitas empresas com relações comerciais com Angola estão a ter dificuldades em facturar as suas vendas, nomeadamente junto de entidades públicas. Para resolver o problema, alguns bancos abriram linhas de crédito para garantir que os fluxos das exportações de serviços e bens para aquele país africano se mantêm vivos.

Esta poderá ser a explicação do CaixaBank para disponibilizar o crédito de 400 milhões de euros a Angola.  A questão do financiamento tornou-se mais relevante em Angola após Luanda ter prescindido do apoio do FMI, tendo agora que encontrar outras alternativas.

Para além do regulador do mercado de capitais espanhol, a CNVM, o CaixaBank é também supervisionado pelo Banco Central Europeu que terá, mais tarde ou mais cedo, de se pronunciar sobre a capacidade do banco espanhol recuperar os 400 milhões. Recentemente, foram veiculadas informações de que estava a ser promovida a ida de uma comitiva de empresários catalães a Luanda para fazer prospecção de negócios.

O grupo liderado por Gonzalo Gortázar tem em curso uma OPA sobre a totalidade do capital do BPI, cujo desfecho positivo tem vindo a ser travado pela Santoro, a holding de Isabel dos Santos. Daí que o timing em que foi anunciado o acordo de financiamento entre o Governo de Angola e o CaixaBank  (16 de Agosto) tenha aberto espaço a especulações. A filha de José Eduardo dos Santos é a segunda maior accionista da instituição liderada por Fernando Ulrich, com cerca de 20% das acções, e foi nomeada em Junho presidente da petrolífera estatal Sonangol (a maior empresa angolana, e dona de 17%% do BCP). E da “colaboração” de Isabel dos Santos com o CaixaBank depende uma rápida clarificação accionista do BPI.

Há cerca de um ano que o CaixaBank e Isabel dos Santos mantêm um braço-de-ferro, pautado por conversações de bastidores intermitentes, que acabam sempre sem consenso. Para a OPA ser aprovada, os espanhóis necessitam ou que o capital seja desblindado (hoje o Caixabank, com 45%, e Isabel dos Santos, com 20%, têm o mesmo poder voto) ou que a empresária aceite a oferta. E na mesa das negociações está o tema Angola. O BPI possui 50,1% do BFA e, via Unitel, Isabel dos Santos domina as restantes acções. E a empresária é a candidata a assumir o controlo do BFA, dado que o BPI vai ter de vender acções. A ausência de entendimento accionista sobre o preço da saída da Santoro do BPI e da compra das acções do BFA está a travar a unanimidade.

O conflito accionista eclodiu por causa das regras do Banco Central Europeu que não reconhece ao Banco Nacional de Angola uma supervisão financeira equivalente à europeia e, na prática, impôs a saída do BPI de Angola, para permitir ao banco respeitar os limites de concentração aos grandes riscos. O impasse em torno do futuro do BPI dura desde então. E ficou novamente à vista na assembleia-geral agendada para 22 de Julho para votar a mudança dos estatutos, condição para a OPA do CaixaBank avançar. A reunião foi interrompida e retomada esta terça-feira, para voltar a ser suspensa, e prosseguir a 21 deste mês. Mas antes será necessário que os diferendos judiciais, que envolvem providências cautelares avançadas por outro accionista, (Tiago Violas Ferreira, via HVF)  sejam ultrapassados.

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