Pedro Ferraz da Costa: "A vivermos assim, estamos falidos dentro de 10 anos"

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Ferraz da Costa diz que o nível de consumo é 30-40 por cento superior ao que a produtividade permite pagar Rui Gaudêncio/PÚBLICO

"As pessoas [em Portugal] têm medo do futuro e da verdade", lamenta Pedro Ferraz da Costa, presidente da Iberfar, em entrevista ao PÚBLICO. "Se lhes dissermos que, a vivermos assim, estamos falidos dentro de 10 anos, respondem que pode ser que não e esquecem rapidamente", justifica.

O antigo presidente da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP) estende as críticas à generalidade dos governantes portugueses por não terem percebido que quando não se definem objectivos estratégicos e medidas a tempo, as opções reduzem-se perigosamente, dando como exemplo o sector energético onde as alternativas de arrumação são cada vez menores.

PÚBLICO -

Como vê este compasso de espera para a definição de um novo modelo energético?

Pedro Ferraz da Costa - Os governantes portugueses, na sua generalidade, não têm percebido que quando não se definem objectivos estratégicos e medidas a tempo, as opções reduzem-se perigosamente, porque em todas as outras zonas com influência e com maior poder de decisão do que nós, elas foram sendo tomadas progressivamente.

Portanto, há um encurtamento do leque e as alternativas serão cada vez piores, para uma economia extraordinariamente dependente das importações de energia. Temos forçosamente essa desvantagem. Hoje já não é apenas um problema de custo de energia para a indústria. O aumento do consumo de energia eléctrica no sector terciário nos últimos 10 anos foi superior ao consumo total da indústria. Portanto, já são os centros comerciais os grandes consumidores.

Que modelo defende então?

Sempre achei que fazia mais sentido, em termos estratégicos, em algumas áreas da energia, ter alianças com empresas internacionais que tivessem dimensão e força para serem um player activo e respeitado na Península Ibérica. Se tivessemos tido uma aliança com uma Shell no gás natural, por exemplo, tínhamos de certeza um parceiro com dimensão para sermos um concorrente respeitado com tecnologia e com 'know how' e teríamos vantagem em fazer o mesmo para cada uma das outra áreas, para o petróleo e para a electricidade.

Ter alianças estratégicas nas diferentes áreas é a única forma de ter concorrência entre elas. Não há possibilidade de regulação de um conglomerado que tenha tudo lá dentro.

Não é então sensível ao argumento de que o nosso ponto crítico é a dimensão das empresas e que devíamos ganhá-la, como aconteceu previamente em Espanha?

Eles sempre fizeram, mas isso nunca libertou o Governo espanhol de intervir administrativamente sobre os preços no sentido de os baixar.

Defende então que o gás, petróleo e electricidade sejam negócios separados cada um com a sua aliança estratégica?

Sim. Para além da nossa dependência energética, temos uma desvantagem adicional de, na Península Ibérica, estarmos em termos naturais excluídos do mercado de electricidade, no qual os franceses não querem participar. Temos desvantagens óbvias de dimensão das nossas empresas, quer nas energias tradicionais quer nas renováveis. Os espanhóis têm nuclear, nós não.

Mas não acha que o problema da dimensão é determinante?

Sobrevalorizam-se os problemas da dimensão. A Dinamarca e a Holanda não têm uma dimensão maior que a nossa e têm esse problema resolvido há muitos anos. Há é aqui um problema de incompetência e de interesses individuais para quem, no Estado, nomeia administradores.

Disse que é inevitável construirmos um modelo com capital espanhol envolvido.

Quando nacionalizámos a maior parte dos grupos económicos nacionais, conduzimos uma política económica global que significou uma acentuada queda da poupança nacional. Onde quer que ela esteja, perdemos a possibilidade de ter peso em determinados sectores.

Fizemos depois erros dramáticos em relação às privatizações. Devíamos tê-las feito antes da adesão à CEE, porque era a única forma de podermos definir autonomamente o que queríamos. Defendi, em oposição de fundo a Cavaco Silva, que devíamos começar pelo sector financeiro, mas deixámos que o país seja hoje dos que tem menos autonomia nacional neste sector. Portanto, no papel normal de intermediação que cabe à banca nestas matérias, os intermediários estão do lado de lá.

Então como encara esta discussão sobre os centro de decisão nacional?

É tão atrasada. Os centros de decisão estão a cair desde o 25 de Abril e só agora é que se reparou. Tivemos desde o início uma política de intervenção do Estado na economia que foi subserviente em relação a tudo o que era estrangeiro e revanchista em relação ao que era nacional.

O que defendia?

Teria tentado actuar mais depressa. Se a França foi capaz de nacionalizar uma grande parte da sua economia em 81 depois da vitória de Miterrand e em 85 estava a privatizar outra vez, por que nacionalizámos em 75 e tivemos de esperar pelos anos 90 para fazer isso? Foi falta de visão.

Temos também o problema do pagamento das nacionalizações. O que foi nacionalizado em França em 81, foi pago no período de seis meses e esse capital continuou ao serviço da economia francesa e foi investido noutros sectores. Aqui, foi queimado alegremente ao longo dos anos.

E não foi só por nacionalização. Olhe as dezenas de milhar de metros quadrados de fábricas abandonadas pela linha do Tejo desde Lisboa a Vila Franca que pertenceram a sectores em relação aos quais se praticou congelamento de preços numa altura em que o escudo desvalorizou. As empresas foram morrendo uma a uma.

O Mibel pode servir para minimizar algumas das nossas desvantagens ou não?

Tudo o que seja criar concorrência é positivo. Contribuiu, por exemplo, para uma melhor compreensão do custo da energia. Deu mais transparência.

Por que diz que a Espanha é o único país a perder com o nosso não desenvolvimento?

Porque o nosso peso como cliente para a França, Alemanha ou Inglaterra é muito pequeno, o único país para o qual temos dimensão como mercado de exportação é a Espanha. Espanha exporta mais para Portugal do que para toda a América Latina. Se as coisas correrem mal em Portugal, isso afecta um número significativo de empresas em Espanha. Os franceses e os alemães nem dão por isso. Não somos importantes para quase ninguém. Somo-lo para a Espanha e para quem exporta bacalhau.

Do mesmo modo, é importantíssimo para nós que as coisas em Espanha corram bem, porque é um importante mercado de exportação para nós. Se o crescimento em Espanha cair, teremos também problemas.

É a favor do nuclear?

Não tenho grandes dúvidas que uma grande parte das orientações tomadas nos últimos anos na Europa respondeu às pressões dos ambientalistas, e que estas não eram completamente ingénuas.

Em Portugal, temos uma dificuldade adicional na instalação do nuclear que é a dimensão do consumo.

E não tenho dúvida que se fizermos uma central nuclear vai ser como a Casa da Música, demora dez anos mais a ser construída e custa 50 vezes maios do que o previsto. Portanto, talvez seja melhor importar energia de Espanha.

Defende desde 1991 uma única voz patronal para a indústria. De década em década, o projecto negoceia-se e adia-se. Saiu da CIP desiludido com isso. O que continua a bloquear o processo?

Os presidentes da AIP e da AEP reconheciam a minha liderança e, portanto chefia de um projecto comum, mas nunca estiveram os dois de acordo ao mesmo tempo para o viabilizar. Também não tive grandes ilusões sobre isso.

Durante quase todos os 20 anos em que estive à frente da CIP grande necessidade de os levar de braço dado para defender de forma clara determinadas posições e nunca sentido a falta deles em determinadas negociações.

Ter uma voz única isso não devia significar deixar de ter uma voz forte. O objectivo de qualquer líder é conseguir perante os seus interlocutores e a opinião pública ser "o" interlocutor mesmo que represente só 30 ou 40 por cento.

Quando se fala que é necessário ter uma voz única ou discutir o associativismo eu condescendia nessas conversas, mas sabia que estava a perder tempo. Nunca me interessou.

Nunca fui um grande defensor da CIP, a CIP era um instrumento para defender determinadas coisas. Se houvesse uma estrutura que fizesse isso melhor, quando eu tinha essa responsabilidade, saltaria imediatamente para ela.

Quando a imprensa começou a dizer que o problema de não se resolver era as pessoas e conflitos de personalidade, fui o primeiro a sair e vaticinei que isso não ia resolver problema algum.

Não saiu só por isso.

Não tinha justificação para continuar a não ser que conseguisse ganhar eficácia naquilo que estava a fazer. A partir de determinada altura, é evidente que comecei a ser contrariado pela AIP e pela AEP em relação a determinados assuntos importantes, nomeadamente política fiscal do dr. Pina Moura e a aproximação à AEP. Isso é que deixa de ser tolerável. Além do mais, já lá estava há 20 anos. Talvez até tenham sido demais. Saí em 2001, já lá vão quatro anos.

O que aconteceu entretanto?

Eles ainda nem conseguiram definir um objectivo. Não há projecto, não há doutrina.

Não tem vontade de regressar ao movimento associativo?

Nenhuma.

Nos partidos, os líderes saem e continuam como militantes de base.

Sou empresário, que remédio não ser militante de base (da CIP)! É por fatalismo, quase.

Participa nas reuniões de sector da Confederação?

Não. Era membro por inerência do conselho de presidentes da CIP, mas na última alteração estatutária isso acabou. Não sei se foi de propósito para eu não participar.

Tinha preferido continuar?

Durante 20 anos, dei mais de meio tempo da minha vida à CIP.

Dizia que a CIP funcionou muitas vezes como partido político. Continua a ter essa função?

Agora, quase não tem função. Tem havido um esvaziamento da sua presença.

Como?

Diluiu-se. É muito difícil pretender não ter uma posição tão incómoda como a que eu imprimia, pretender ser politicamente correcto e continuar a ter acção. São coisas contraditórias.

O que faz então com que os patrões não se entendam?

As pessoas têm medo do futuro e da verdade. Temos em Portugal um nível de consumo quer público quer privado que está, pelo menos, 30 por cento acima do que seria sustentável. Se se cortar isso, não há praticamente nenhum filiado de organização patronal que não veja as suas vendas descerem. Ter uma posição realista, dizer que temos de viver de acordo com as nossas possibilidades, qual é o português que acha que isso é bom para ele? Nenhum.

Se lhes dissermos que, a vivermos assim, estamos falidos dentro de 10 anos, respondem que pode ser que não e esquecem rapidamente.

Isso é um cenário hipotético.

Não é cenário hipotético. O país tem uma sobrevalorização salarial à volta dos 30 por cento, temos um nível de produtividade comparada com a média europeia que anda nos 55 por cento da média e um nível de consumo nos 75 por cento, ou seja, o nível de consumo é 40 por cento superior ao que a produtividade permite pagar.

Se não estivessemos no euro e não tivessemos uma política monetária autónoma, ninguém duvida que o escudo já se teria desvalorizado 30 ou 40 por cento.

Ao longo dos anos, tem sido mais crítico dos governos social-democratas do que dos socialistas.

Não é verdade. Comecei a criticar a governação do engenheiro Guterres em 96, numa altura em que todos andavam satisfeitos com o aumento do consumo público e privado.

Ele teve condições ímpares para fazer muita coisa. A redução brutal das taxas de juro e o período de crescimento contínuo da economia mundial teriam permitido muitos ajustamentos. Era, aliás, o que o Presidente da República dizia em privado e não tinha coragem para dizer em público.

O registo certo era o de Manuela Ferreira Leite?

Ninguém duvida que temos excesso de despesa pública. O problema de Ferreira Leite é que não teve um primeiro-ministro que fosse totalmente consequente com a adopção dessa política.

O que falhou?

A plataforma política que levou Durão Barroso ao governo não estava interessada nos objectivos no controlo do consumo público. Durão Barroso chegou ao poder cavalgando uma vitória autárquica. Portanto, a possibilidade de cortar nas transferências para as autarquias, no investimento público, tudo isso estava muito condicionado desde o início. E o que se tem visto em relação às contas públicas, mostra que não houve grandes cortes.

Qual a expectativa que tem em relação ao actual Governo? Vai ter maior controlo das contas públicas?

O PS é mais jacobino e mais centralizador e é capaz de, se quiser, para seguir uma determinada política, estar menos dependente dos autarcas, do que o PSD.

Mas também já disse que ter uma maioria absoluta não chega para governar.

Pois não. Uma maioria de revisão constitucional era mais importante em alguns assuntos e aqui o problema sempre foi o mesmo desde 1976: para que lado cai o PS? Está com a Europa, com a economia de mercado, com a globalização? Tem pessoas que parecem ser deste grupo.

Estão no Governo?

Mas há outras que são do passado. O ministro do Trabalho parece que é da tese contrária.

Receio que se caia numa contradição em que o engenheiro Sócrates diz que vem aí o choque tecnológico, com tudo o que é moderno, e depois nas áreas sociais e do trabalho continua defender-se a muralha de aço da geração das pessoas da minha idade, dos 50 e tal anos.

Isso é incompatível?

Se fizemos uma legislação do trabalho essencialmente para defender os subqualificados em sectores em decréscimo com atiutudes defensivas isso é com certeza o contrário do que precisávamos para a mudança.

É infernal viver com esta legislação em Portugal. Todos temos responsabilidades empresariais e às vezes chegamos ao fim do dia e a nossa vontade é vender tudo e libertarmo-nos desta chatice. Dá vontade de desisitr. Está tudo organizado para ser difícil. Há investidores estrangeiros que não sei por que razão foram convidados a vir para cá.

A Auroeuropa, por exemplo, avançou com um acordo, parte do qual está à margem da actual legislação.

A questão é que na Autoeuropa são 4000 pessoas mais os que estão à volta. São todos novos e estão todos interessados em manter os postos de trabalho, ainda por cima numa região complicada. Não tenho, por outro lado, a certeza se uma parte das pessoas que estão na Opel não gostava de ter uma reforma antecipada aos 50 e tal anos e deixarem simplesmente que aquilo feche.

É um problema de geração?

É. A escolha que temos de fazer é essa. Se queremos estar com os do futuro, se com os do passado. Olho para os políticos e vejo que eles querem estar com os do passado. Têm uma antenuante que é a população ser cada vez mais velha e ser aí que estão os votos.

O antigo secretário de Estado da Segurança Social escreveu um livro entitulado "Conspiração Grisalha". Acredita nessa conspiração, nas pessoas de 50 e tal anos que estão instaladas e que defendem o "status quo" em prejuízo das gerações futuras? Como mudaria?

Não é tarefa para uma pessoa só.

Foi várias vezes convidado para o CDS, continua a não ser militante. O que acha que vai acontecer ao CDS, agora sob nova liderança?

Em 2000 ou 2001, falou-se muito das dificuldades do CDS. Havia pessoas na CIP que faziam parte da comissão directiva do partido a quem propus que o CDS acabasse. Fazendo o paralelo com uma empresa, tem mais passivo do que activo. Eles não conseguiram até agora definir se são populistas, conservadores ou democratas-cristãos.

Como vê a iniciativa do governo para a colocação dos 1000 jovens licenciados em empresas?

Se o governo não resistir à tentação de exigir que não seja um contrato a prazo, estou convencido que a maior parte das empresas não quer.

Se lhe propuserem?

Se vier sem prazo não quero cá nenhum. Temos de ter possibilidade de avaliar as pessoas e é essencial poder despedir.

Na inovação, tem-se discutido muito o papel que deve caber ao Estado e o que tem de ser assumido pelas empresas para que se tornem mais competitivas. Como alteraria a situação?

É óbvio que há um problema de espaço. Enquanto as pessoas puderem investigar numa universidade das 11 às quatro da tarde, não estão interessadas em ir para uma empresa fazer o mesmo das oito às seis. Não sei se o ensino não devia estar separado da investigação em muitas áreas e ter parcerias com institutos de investigação públicos ou privados em determinadas áreas, com sucesso como acontece noutros países.

As empresas portuguesas de farmacêutica inovam, investem em I&D?

Não temos nenhuma empresa com dimensão crítica para fazer I&D.

Nunca houve necessidade de associação de esforços?

Acho muito difícil. Se virmos os projectos de consolidação do sector, vemos que o caminho tradicional da investigação, desenvolvimento clínico e comercialização a nível mundial é para empresas de dimensão cada vez maior.

Há determinados nichos de mercado que empresas de países com dimensão semelhante à nossa exploram com sucesso. Continua a haver bons exemplos nos países escandinavos, Suíça, na Holanda e na Bélgica.

A opção em Portugal pelos genéricos sem marca anulou praticamente esse caminho. Na Alemanha, 80 por cento das prescrições de genéricos são de marca ou com identificação do fabricante e isso criou confiança suficiente dos médicos para que o mercado dos genéricos seja brutal naquele país. Aqui, o que se quis fazer foi genéricos de marca branca e ceder à opção preferida pela Associação Nacional de Farmácias (ANF).

Antecipámos em alguns anos o desaparecimento de alguma indústria nacional neste sector.

Mas também diz que o sector nacional é um bocado subsidiário das multinacionais.

Não digo que é subsidiário. O que digo é que não tem dimensão para poder replicar no modelo de negócio das multinacionais, mas que nos genéricos com marca tinha muitas hipóteses de fazer isso. Tenho grandes dúvidas se os nacionais na área dos genéricos conseguem actuar dentro desta configuração de mercado.

A Iberfar é afectada por isso?

A Iberfar foi muito afectada por isso, porque estávamos em pleno período de investimento numa fábrica nova que tinha na fabricação de genéricos com merca uma das suas grandes justificações.

Abandonou o investimento?

Não abandonámos o investimento. O investimento é que nos abandonou a nós. Podíamos ter neste momento uma taxa de utilização da capacidade mais elevada se o enquadramento fosse diferente. Ficou-nos a outra hipótese que é fabricar para exportação, que é o que estamos a fazer, embora seja mais lento.

E o que diz da venda de medicamentos fora das farmácias?

Primeiro, a medida não aumenta o número de pessoas com dor de cabeça. É inevitável também que as pessoas tendam a estar cada vez mais informadas sobre estes assuntos e que a compra será cada vez menos uma compra informada. É presunçoso dizer que os portugueses não são capazes de comprar sozinhos.

Também não me parece que se deva ir no sentido de se vender quase tudo fora das farmácias, deve-se manter tudo o que seja obrigatório vender com prescrição médica.

Concorda que o referendo europeu se realize no mesmo dia das autárquicas?

A política PS, PSD e PP está interessada em que a Constituição seja aprovada o mais rapidamente e superficialmente possível e sem grandes problemas. Tão cedo quanto possível. Se fosse possível fazer sem referendo, faziam-no. E isso é mau.

Veja-se o que tem acontecido com o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), a forma como a França e a Alemanha se têm comportado e como os cinco maiores acham que condicionam completamente as decisões. Continuamos a caminhar alegremente num projecto meio oculto de transferir várias coisas que são importantes em termos de soberania. Praticamente tudo o que é importante não é decidido cá.

O tratado para si é não.

O sim ou não é uma parte importante do problema, mas há dois outros aspectos igualmente importantes. Ganhávamos muito com um debate sério sobre esta matéria, independentemente de ser a favor ou contra. A segunda questão é: tínhamos interesse em ter o referendo o mais tarde possível e ver primeiro o que acontece nos outros países.

Tem presidido ao Fórum para a Competitividade...

Vou sair agora. Chegou o momento.

Que balanço faz?

Foi uma tentativa, desde que saí da CIP, de constituir um "think tank" que pudesse ajudar o movimento patronal. Vou ter um sucessor óptimo, que é o engenheiro Mira Amaral.

Mas o Fórum não teve expressão.

Isso é uma parte do problema. A grande frustração foi que nós pensámos, desenhámos, e fomos até ao ponto do treino de pessoal para uma plataforma de Internet de constituição de empresas, informação de todos os departamentos do Estado e emissão de todas as certidões em 12 horas. Não implicava dinheiro do Estado e pagava-se num ano e meio. O Ministério da Justiça nunca quis.

Sai porque não conseguiu operacionalizar o projecto?

Não, tenho uma paciência de santo, saio porque cheguei ao limite dos mandatos.

Mas sai frustrado?

Estou frustrado é com o país, com a minha acção ali não.

Mas se não conseguiu...

Mas vai conseguir-se. O doutor António Costa quando foi ministro da Justiça foi incomparavelmente melhor que a doutora Celeste Cardona.

Gosta lei da limitação os mandatos?

O grande problema não é esse. São o único cargo público em Portugal que não responde perante ninguém.

Então é positivo que se limitem os mandatos?

Não vejo da parte do PS e do PSD qualquer reforma coerente no sentido de reformar o sistema político português.

Não concordo com mandatos muito curtos. Se conseguíssemos ter um bom Presidente da República, era bom que tivesse dois mandatos de sete anos cada.

Com os actuais prazos e as eleições permanentes, os governos tomam todas as decisões desagradáveis nos primeiros três meses ou então caem nas eleições seguintes. O engenheiro Sócrates sabe que se reduzir fortemente a despesa pública não será primeiro-ministro oito anos. Há medidas que precisam de três quatro anos para se verem resultados.

O que pensa da criação de uma disciplina de empreendedorismo na escola?

Se os jovens soubessem fazer contas já não era nada mau, que é uma condição prévia.

Podemos vê-lo um dia destes ao lado do primeiro-ministro a defender a co-incineração? É um aliado nesta matéria.

Já não sou grande aliado de ninguém, mas todos estão conscientes que ele tem razão.

Essa forma descrente de olhar para a política e para o país está a agravar-se?

Em 1983, escrevi que tínhamos um sistema político que seleccionava os piores e premiava os incapazes. O sistema a funcionar assim, ao fim de 20 e tal anos, não podia produzir grandes dirigentes. Ao mesmo tempo, provocou um grande desinteresse das camadas mais jovens na acção cívica e não é com o movimento das jotas que resolvemos isto.

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