Os verdadeiros inimigos da família

Os verdadeiros inimigos da família são a austeridade, a precariedade, os salários baixos, a habitação inacessível e políticos como Passos Coelho, que têm forçado milhares de jovens a emigrar.

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No último fim-de-semana o antigo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho voltou às notícias. Depois de, durante a campanha eleitoral, ter associado a questão da imigração com problemas de segurança, dessa vez foi noticiado por ser a personalidade escolhida pelos organizadores do recente livro publicado Identidade e Família para fazer a apresentação da obra. Divulgado como um manifesto contra “os adversários da família” e a “a ideologia de género”, é irónico e sintomático que o primeiro responsável pela emigração de milhares de jovens portugueses em idade fértil, por conta das suas políticas neoliberais de austeridade, seja o escolhido para falar em defesa da família.

Segundo o “crème-de-la-crème” da direita portuguesa, organizado no “Movimento Acção Ética” – que nome sarcástico – que lançou o livro; a família estaria sob ataque por uma suposta “ideologia de gênero”, “que tem sido promovida nas escolas públicas”.

No atual contexto político em que vive Portugal, nada mais conveniente do que lançar a ideia de uma “guerra cultural”, onde os factos que realmente importam sejam lançados ao lado e esquecer os impactos desastrosos das políticas neoliberais implementadas pelo antigo primeiro-ministro como a desregulamentação do mercado imobiliário, a manutenção a todo custo dum salário mínimo extremamente baixo, cortes graves nas reformas dos idosos, cortes substanciais nos recursos de saúde e educação, políticas de recessão económica, um desemprego jovem de 40%, etc…

Entrar no debate meramente discursivo trazido por livros como esse é não só enganador como também desastroso. A esquerda que se quer fazer combativa no debate político não deve comprar esta guerra. A única resposta adequada é que: os verdadeiros inimigos da família são a austeridade, a precariedade, os salários baixos, a habitação inacessível e representantes políticos como Passos Coelho, que têm forçado centenas de milhares de jovens a emigrar.

Uma reflexão que se proponha séria necessita ir além de jargões populistas, antes deve estar comprometida com a promoção do entendimento da austeridade como um modus operandi típico do capitalismo periférico e semiperiférico (caso português), que atua como mecanismo de superexploração do trabalho. O recuo das democracias liberais diante do capitalismo tem sido um factor determinante no contexto neoliberal, e tem sido acompanhado da violência contra os mais fracos como forma de fazer política. Não é por acaso que o discurso da chamada “ideologia de género” como os discursos racistas e populistas, que têm como objetivo destruir a solidariedade entre os oprimidos é por norma conclamado por essa direita que visa destruir os direitos da classe trabalhadora no geral.

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