Supermercados reflectiram isenção do IVA nos preços, conclui estudo

Preços aumentaram antes de a redução avançar, mas o escrutínio público contribuiu para os supermercados repercutirem a descida durante os nove meses do IVA Zero, diz estudo.

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O IVA Zero entrou em vigor a 18 de Abril de 2023 e terminou a 4 de Janeiro de 2024 Nelson Garrido
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Os supermercados incorporaram a isenção do IVA no preço dos produtos alimentares abrangidos pela redução fiscal, não absorvendo qualquer parte da descida temporária do imposto, conclui um estudo de quatro economistas portugueses divulgado pelo Banco de Portugal (BdP).

A isenção temporária vigorou de 18 de Abril de 2023 a 4 de Janeiro deste ano e abrangeu 46 tipologias de bens alimentares. Na maior parte dos casos, a medida significou a passagem do IVA de 6% para 0% durante estes quase nove meses.

Da autoria de Tiago Bernardino, Ricardo Duque Gabriel, João Quelhas e Márcia Silva-Pereira, o estudo procurou perceber de que forma a redução do IVA se repercutiu nos preços finais junto dos consumidores, “ao longo de todo o período de vigência” da medida.

Inicialmente, quando o Governo confirmou, a 24 de Março de 2023, que iria isentar o imposto sobre os bens alimentares temporariamente, houve “um ajustamento antecipado dos preços”, com os produtos a aumentarem 1,27% em relação aos não-abrangidos.

Já numa segunda fase, a da adopção da isenção, que se iniciou a 18 de Abril, houve “uma passagem quase completa para os preços no consumidor, que ascende a 99%”.

A conclusão é a de que os supermercados não absorveram a redução temporária, ou seja, que houve uma “elevada transmissão” da medida para os consumidores. Os economistas sublinham que esta passagem “apresenta uma persistência elevada” ao longo de todo o período em que a isenção esteve em vigor, com uma ressalva – “só no final da política é que se regista uma diminuição da transmissão.”

Dos 46 tipos de bens abrangidos faziam parte cereais, legumes, produtos hortícolas frescos ou congelados, algumas frutas e leguminosas, lacticínios, algumas carnes e peixes, ovos e gorduras ou óleos.

Os economistas também analisaram o fim da medida. “Quando a política é revertida [em Janeiro deste ano] e o IVA regressa à taxa original [na maior parte, para 6%], o aumento dos preços implica uma repercussão inferior à esperada em cerca de 70%.”

Segundo esta equipa de economistas, a medida foi eficaz a “influenciar directamente os preços de retalho e, por extensão, aliviar os encargos dos consumidores”. “Estimamos que a redução do IVA baixou a inflação em 0,7 pontos percentuais”, refere-se no estudo.

Os economistas salientam a importância que o escrutínio da execução da medida assumiu para que os supermercados reflectissem a descida nos preços, bem como o facto de já se registar uma deflação dos preços nos produtores agrícolas, que também foram envolvidos no pacto desenhado pelo executivo.

“Antes do anúncio, o Governo deu instruções aos inspectores da Autoridade para a Segurança Alimentar e Económica [ASAE] para controlar os preços [nas lojas], o que foi frequentemente mencionado nos meios de comunicação social. O grau de atenção dos media e o escrutínio público são um mecanismo potencial que incentivou os retalhistas de produtos alimentares a repercutirem a redução do IVA nos consumidores”, referem.

Os economistas referem que o estudo, além de medir os impactos directos nos preços, permitiu perceber “a importância crucial do momento, da comunicação e das expectativas do mercado para maximizar a eficácia das políticas públicas destinadas a gerir a inflação.” Por isso, dizem, este exemplo abre portas a “futuras vias” de análise para futuro, “em particular no que respeita à compreensão dos factores subjacentes à inflação.”

Numa outra análise preliminar divulgada em Outubro, enquanto a medida ainda estava em curso, o Banco de Portugal já apontava para efeitos positivos da implementação da descida, pelo menos no arranque do IVA Zero. Ainda que a pressão da inflação já estivesse a baixar naquela altura de 2023, observou-se uma “clara descolagem” dos custos dos bens isentos a partir de Maio, num sinal de que a redução se reflectiu nos preços junto dos consumidores. Uma perspectiva que aparece agora confirmada neste estudo.

Tiago Bernardino é investigador na Universidade de Estocolmo, Ricardo Duque Gabriel é economista na Reserva Federal norte-americana, João Quelhas no Banco de Portugal e Márcia Silva-Pereira é investigadora na Nova SBE.

Notícia alterada às 15h54 de 9 de Abril de 2024:
Foi retirada do título a referência ao Banco de Portugal (uma vez que o estudo dos economistas, sendo divulgado pelo banco central, não corresponde a um estudo oficial produzido pela instituição).

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