Derrapagem no défice lança França para clima de crise orçamental

O défice público em 2023 ficou bem acima do previsto pelo Governo, levando os seus responsáveis a anunciar a realização de cortes na despesa para lidar com a situação.

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Bruno Le Maire, ministro das Finanças francês Reuters/Gonzalo Fuentes
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Depois de a Alemanha assumir a sua dificuldade em usar a política orçamental para ajudar a economia a recuperar, agora é a vez de a França declarar que está numa situação de crise nas suas finanças públicas.

Os problemas da segunda maior economia da zona euro com o seu orçamento foram tornados mais claros do que nunca esta quarta-feira pelo ministro das Finanças francês. Numa entrevista concedida ao jornal Le Monde, Bruno Le Maire revelou que o défice orçamental do ano passado será substancialmente mais elevado do que a meta definida pelo Governo, exigindo, por isso, que o país, para cumprir os objectivos de reequilíbrio orçamental traçado para os próximos anos, tenha de pôr em prática uma política mais restritiva.

“Devido às receitas orçamentais mais baixas em 2023, vamos ficar significativamente acima da meta de défice de 4,9%”, afirmou o ministro, sem avançar com uma nova estimativa. As dificuldades sentidas na frente orçamental no ano passado estão relacionadas com o desempenho mais modesto do que o esperado da economia, cujo impacto na cobrança de impostos não foi compensado por outras medidas de consolidação.

Agora, contudo, o Governo francês parece estar decidido a que, mesmo perante uma conjuntura económica adversa, se cumpram as metas orçamentais, tendo até, para que isso aconteça, já anunciado cortes de despesa significativos. Bruno Le Maire diz que a economia irá crescer, em vez dos 1,4% inicialmente projectados, apenas 1% este ano, mas, apesar deste andamento mais lento da economia e do ponto de partida mais desfavorável no saldo orçamental, garante que a meta de défice para 2024 se manterá nos 4,4%.

Foi por isso que, logo em meados de Fevereiro, com apenas um mês e meio do orçamento executado, anunciou a introdução de um programa de cortes na despesa pública de 10 mil milhões de euros. “Durante muito tempo, a despesa pública tem sido a solução para todos os nossos problemas. Agora arrisca-se a tornar-se um problema para todos nós”, afirmou quando anunciou as novas medidas.

O Executivo francês tem como meta até ao final do segundo mandato de Emmanuel Macron na presidência colocar o défice público nos 3% do PIB, passando a cumprir este mínimo previsto nas regras orçamentais europeias.

A pressão sobre as finanças públicas francesas promete ser este ano muito forte. Do ponto de vista político, o país será alvo na Primavera de uma avaliação da Comissão Europeia que dificilmente deixará de notar a distância a que a França está de cumprir as metas exigidas, pedindo a Paris que dê sinais concretos de que irá corrigir os desequilíbrios. E, depois, permanecem as dúvidas sobre se os cortes anunciados serão o suficiente para colocar as finanças públicas no caminho desejado. É que, para além do ritmo de crescimento económico lento, o executivo está a ver-se forçado, perante os protestos nas ruas, a aumentar as despesas com os apoios à agricultura e, em face da situação na Ucrânia, a reforçar o orçamento na despesa.

E mesmo que as contas batam certo em 2024, para os anos seguintes, a exigência tende a aumentar, principalmente se a economia mantiver, como aconteceu ao longo dos últimos anos, um ritmo lento. Em 2025, já se prevê a necessidade de efectuar cortes de 20 mil milhões de euros, o que poderá forçar o Governo a mexer em componentes da despesa mais sensíveis, como os salários da função pública ou as pensões.

O rácio da dívida pública francesa deverá ter ficado, de acordo com as previsões da Comissão Europeia, próximo dos 110% do PIB no ano passado, sendo o terceiro mais elevado entre os países da zona euro, apenas abaixo da Grécia e da Itália.

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