Estratégia nacional: Porto contra alargamento do conceito de sem-abrigo a quem pode perder casa

Município já se pronunciou na consulta pública do documento que define estratégia para 2025-2030. Resposta implica “profissionalização” dos gestores de caso e não há meios para isso, alerta.

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Porto registava, em 2022, 647 pessoas a viver em situação de sem-abrigo Paulo Pimenta
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A Câmara do Porto não concorda com o alargamento do conceito de pessoa em situação de sem-abrigo, prevista na Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo (ENIPSSA), a vigorar entre 2025 e 2030, e que prevê que quem está “em risco” de perder a casa seja também incluída neste grupo de pessoas. O documento está em consulta pública desde meados de Janeiro e a Câmara do Porto já deu o seu contributo, considerando haver uma “confusão metodológica de base e conceptual” neste alargamento do conceito.

Na pronúncia, assinada pelo vereador com a pasta da coesão social, Fernando Paulo, o município diz desconhecer quais as metodologias consideradas nessa definição e também qual o diagnóstico se esse conceito for abarcado e de que forma se pode responder a ele: "Quantas pessoas existem em Portugal em situação de risco de vivenciar esta condição? Onde estão essas pessoas? Quem são as entidades com competências atribuídas para dar resposta a estas pessoas?", lê-se no documento enviado pela Câmara do Porto ao PÚBLICO.

O município defende que, tendo em conta o número de pessoas a viver nesta situação, a intervenção deveria ser reforçada e que, para isso, é preciso apostar na “profissionalização” dos técnicos gestores de caso. Ainda que essa situação esteja prevista na estratégia nacional, o vereador diz não estarem reunidas condições, na prática, para que isso aconteça. “Não se percebe como se poderá concretizar, nomeadamente ao nível dos meios, do financiamento e da forma.”

Os Núcleos de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo (NPISA), estruturais municipais, enfrentam uma série de problemas que não são tidos em conta na estratégia nacional, lamenta o representante da Câmara do Porto. Estes núcleos “não têm recursos nem meios próprios para assegurar que ninguém é desinstitucionalizado nas condições referidas [quando toda a rede falhou e a pessoa está a viver na rua], nem competência tutelar, hierárquica, sobre as entidades nem sobre respostas sociais ou outras”.

Falta-lhes, por exemplo, uma equipa técnica mínima, “à semelhança das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens”, de forma a evitar que sejam os NPISA a “assumir omissões de outras entidades com responsabilidade na área social”, resume uma nota do gabinete de comunicação da Câmara do Porto enviada às redacções.

O vereador pede que a estratégia nacional – que na opinião do município não deveria ser assumida por um Governo em gestão – clarifique “como e com que respostas sociais o NPISA poderá assegurar que ninguém tenha de permanecer na rua por mais de 24 horas”.

Assumindo a responsabilidade própria (“a nova estratégia deve prever a responsabilização directa de cada uma das áreas de Governação, nacional, regional e local”), a Câmara do Porto pede que a estratégia responsabilize “as equipas sociais das diversas entidades para a necessidade e obrigação de planearem a desinstitucionalização em articulação e proximidade com as equipas do território”.

A pronúncia da Câmara do Porto é de 15 de Fevereiro, mas foi partilhada com as redacções esta sexta-feira, dia em que o PÚBLICO noticiou, também, a situação de algumas dezenas de pessoas a viver no aeroporto Francisco Sá Carneiro. Os municípios da Área Metropolitana do Porto estão, nos últimos três meses, a definir uma estratégia metropolitana para as pessoas em situação de sem-abrigo e a “preparar uma candidatura para o quadro comunitário 2030”, avançou o vereador Fernando Paulo.

Neste momento, os dados mais actuais sobre as pessoas sem-abrigo na cidade do Porto são de 2022, altura em que havia 647 pessoas a viver entre as ruas da cidade, centros de acolhimento, apartamentos partilhados ou quartos de pensões. No terreno, as associações reportam o aumento destes casos, com mais jovens e mais estrangeiros, mas também mais famílias a pedir ajuda para pôr comida na mesa.

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