Tribunal da ONU vai julgar Rússia ao abrigo da convenção sobre genocídio

Haia rejeitou objecções da Rússia a um caso aberto por Kiev em 2022 sobre a invasão não provocada e injustificada do território ucraniano.

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Delegação ucraniana esta sexta-feira em Haia Tribunal Internacional de Justiça
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Delegação russa no Tribunal Internacional de Justiça Tribunal Internacional de Justiça
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O Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) decidiu esta sexta-feira avançar com um caso aberto pela Ucrânia, em Fevereiro de 2022, contra a Rússia. O Kremlin, acusado de lançar uma invasão em grande escala com base em alegações forjadas de genocídio da população russófona no Donbass, levantou objecções à queixa ucraniana — agora rejeitadas pelo TIJ.

“O tribunal decidiu, por 15 votos a favor e um contra, que tem competência para julgar o caso, com base no artigo 9.º da Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio”, anunciou a presidente do TIJ, Joan Donoghue, confirmando que o processo vai avançar sob a sua jurisdição.

Nos últimos meses, o tribunal sediado em Haia, nos Países Baixos, ouviu os argumentos dos dois países beligerantes. Kiev negou as alegações usadas pela Rússia para justificar a invasão de território ucraniano, a 24 de Fevereiro de 2022, e acusou Moscovo de violar a convenção da ONU sobre genocídio, de 1948, recorrendo ao acordo para fins contrários ao seu propósito.

Há dois anos, perante a população russa, o Presidente Vladimir Putin declarou que a “operação militar especial” — eufemismo usado para se referir à guerra — era necessária para proteger as pessoas que, durante oito anos, estiveram sujeitas a abusos e ao genocídio levado a cabo pelo regime de Kiev”, defendendo a incursão como um acto de legítima defesa.

Dois dias depois do início da invasão, a 26 de Fevereiro, a diplomacia ucraniana levou à mais alta instância judicial das Nações Unidas a sua queixa quanto às alegações falsas e ofensivas da Rússia. A Ucrânia conta com o apoio de 32 países neste processo, entre os quais Portugal, representados em Haia para abonar a favor de Kiev.

O Kremlin levantou objecções e contestou a legitimidade do TIJ para julgar o caso, uma vez que o Presidente russo não citou a Convenção para a Repressão do Genocídio para justificar a ocupação. Uma referência a genocídio não equivale à invocação da convenção, argumentou o regime.

Há, no entanto, dois aspectos do processo aberto pela Ucrânia que o tribunal internacional declarou não ter competência para julgar, tendo em conta que não é um tribunal penal e não estão sob a sua alçada crimes de guerra ou contra a humanidade.

É da sua jurisdição avaliar se a Rússia recorreu a alegações forjadas para justificar uma guerra não provocada, mas foge à sua competência determinar se a invasão de território vizinho, assim como o reconhecimento da independência das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk, no Donbass, significam violações da convenção sobre genocídio.

Tribunal rejeitou queixas de Kiev sobre apoio russo a separatistas

Ainda esta quarta-feira, o mesmo tribunal pronunciou-se relativamente a outro caso apresentado pela Ucrânia contra a Rússia, em 2017. O tribunal considerou que Moscovo violou artigos de dois tratados — sobre financiamento do terrorismo e sobre erradicação da discriminação racial —, mas rejeitou grande parte das queixas de Kiev.

Uma das reivindicações ucranianas era que o Kremlin pagasse indemnizações por ataques no Donbass, no Leste do país, atribuídos a separatistas pró-russos na última década — incluindo a queda de um avião da Malaysia Airlines, que vitimou 298 pessoas.

O TIJ, que assinala no próximo ano o 80.º aniversário desde a sua fundação, tem como principal função resolver conflitos legais entre Estados-membros das Nações Unidas, sendo as suas decisões vinculativas, além de emitir pareceres jurídicos a pedido da Assembleia Geral ou do Conselho de Segurança da organização. Cada membro da ONU compromete-se a cumprir com a decisão do tribunal, independentemente do partido a favor do qual for proferida”, lê-se no artigo 94 da Carta das Nações Unidas.

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