Coimbra identificou 36 bolsas de biodiversidade e quer criar rede de microrreservas

Levantamento encontrou pequenas manchas de floresta de elevado valor natural. Há duas particularmente vulneráreis e planos para as conservar.

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Senhora da Alegria é uma das manchas identificadas Nelson Garrido
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Há 36 manchas de vegetação em Coimbra que guardam em si valores naturais importantes. O levantamento foi encomendado pela Câmara Municipal de Coimbra (CMC), levado a cabo pela associação de protecção e conservação da natureza Milvoz, e apresentado nesta terça-feira, junto à Mata da Geria, um dos pontos identificados no relatório, na freguesia de São João do Campo.

“Era uma proposta que tínhamos no programa eleitoral”, contextualiza o vereador com o pelouro do Ambiente, Carlos Lopes, em declarações ao PÚBLICO, à margem da apresentação. A coligação encabeçada pelo PSD, que ganhou as eleições autárquicas em 2021, propunha a criação de uma rede de microrreservas naturais. O mapeamento do território é o primeiro passo nesse sentido.

A etapa seguinte passa por procurar financiamento e intervir na requalificação de espaços, identificação de trilho e sinalização, explica. E há duas áreas que são consideradas prioritárias, estando classificadas como particularmente sensíveis à perturbação humana: uma encosta coberta por carvalhos, medronheiros, loureiros, ulmeiros e freixos sobranceira ao rio Mondego, junto ao lugar da Copeira, na união das freguesias de Santa Clara e Castelo Viegas, e a Quinta da Urgeiriça, que se ergue sobre os campos agrícolas do rio Dueça com sobreiros, adernos e urzes-arbóreas.

Para ter meios para intervir nestas duas manchas, explica Carlos Lopes, foi elaborada uma candidatura ao Programa de Cooperação Transfronteiriça Espanha-Portugal, estando a autarquia a aguardar resultados. A câmara está ainda a trabalhar noutros processos de candidatura a fundos que permitam alargar as intervenções.

No documento elaborado pela Milvoz são avaliados factores como a raridade da ocorrência do habitat, o estado de preservação dos valores naturais ou a ocorrência de espécies raras ou ameaçadas e é estabelecida uma escala de prioridade de conservação. Três obtiveram classificação máxima: Escravote, que fica perto de Eiras, “é um dos bosques-relíquia mais bem preservados de toda a região” com elevada humidade e abundância de água e a Mata de Santa Catarina, na zona Sul da mesma freguesia, com os seus 31 hectares de louriçal, carvalhal, sobreiral e matagal mediterrânico. Neste lote entra também a Senhora da Alegria, na freguesia de Almalaguês, local onde a associação Milvoz criou a sua primeira biorreserva, em 2019.

Invasoras como ameaça

Apesar do município ter 48% do seu solo classificado como de uso florestal, poucas são as bolsas de vegetação com características endógenas que restam. Em muitos dos casos, estas manchas estão em pontos de difícil localização. Aliás, esse factor é apontado como possível explicação para sobrevivência destes espaços, impedindo a sua “utilização, modificação ou destruição”, lê-se na memória descritiva do relatório.

No entanto, há também áreas inseridas em zonas urbanas, como o Pinhal de Marrocos, entre o “rendilhado habitacional” próximo do Pólo II da Universidade de Coimbra, ou a Quinta de São Domingos, já dentro da circular interna de Coimbra. Daí que, no capítulo sobre as “principais ameaças” se considere que é “importante garantir que a expansão urbanística não comprometa a conservação deste local”.

Entre os vários riscos detectados nos 36 casos, explica ao PÚBLICO o biólogo e membro da Milvoz Manuel Malva, o mais transversal é a disseminação de espécies exóticas invasoras. “É uma ameaça muito séria que compromete a capacidade destas áreas e pode pôr em causa os seus valores naturais num curto espaço de tempo”, afirma.

Antes deste trabalho, os locais não estavam ainda identificados no mapa nem classificados no Plano Director Municipal (PDM) pelos valores que são agora reconhecidos pelo levantamento da Milvoz. “É importantíssimo e urgente salvaguardar todas as áreas identificadas”, considera o biólogo. Para elaborar a lista, a associação contou com o conhecimento dos seus associados sobre o território, que foram apontando as manchas com potencial interesse.

O relatório foi apresentado junto a um dos 36 pontos identificados, a Mata da Geria, para a qual a autarquia tem planos. Em 2021, ainda durante o executivo anterior, a CMC assinou com a Agência Portuguesa do Ambiente um protocolo para a gestão daquela mancha verde localizada a noroeste da cidade. A autarquia quer agora dar “condições de fruição” à mata e ligá-la ao Choupal, explica Carlos Lopes, requalificando caminhos ao longo de uma linha verde que já existe.

Artigo corrigido às 18h46 de dia 9 de Fevereiro: a reserva da Senhora da Alegria situa-se na freguesia de Almalaguês e não de Assafarge.

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