Alemanha aprova lei para acelerar deportações

Alterações permitem deter durante mais dias os requerentes de asilo rejeitados, facilitam a actuação da polícia, endurecem as penas para o tráfico de pessoas e abrem a porta à criminalização das ONG.

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Os co-líderes da Alternativa para a Alemanha, Alice Weidel e Tino Chrupalla, no Bundestag ANNEGRET HILSE/Reuters
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A ministra do Interior, Nancy Faeser, falou aos jornalistas durante o plenário ANNEGRET HILSE/Reuters
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O Parlamento alemão aprovou uma proposta para facilitar a deportação de requerentes de asilo que tenham visto os seus pedidos recusados, simplificando o processo de expulsão e introduzindo medidas mais restritivas. A reforma tinha sido prometida pelo chanceler, Olaf Scholz, como resposta ao aumento nos pedidos de asilo – um assunto que as sondagens mostram ser uma preocupação dos alemães – e a votação aconteceu dias depois de ter sido divulgado um plano de “remigração” de imigrantes do partido xenófobo Alternativa para a Alemanha (AfD).

As alterações à chamada “Lei da Melhoria da Repatriação” foram aprovadas pelos três partidos da coligação governamental formada pelos sociais-democratas de Scholz (SPD), pelos Verdes (com alguns deputados do partido a votarem contra) e pelos liberais do FDP. Na prática, aumenta o número de dias de detenção pré-deportação (de dez para 28 dias) e a polícia deixa de anunciar as repatriações, como até agora, podendo realizar buscas em casas ou nos quartos dos centros de alojamento à procura das pessoas com ordens de expulsão e ir buscá-las durante a noite.

Antes do debate no Bundestag, na quinta-feira à noite, a ministra do Interior, Nancy Faeser, fez notar que as deportações já tinham aumentado em 27% ao longo de 2023 (na sequência da introdução de outras medidas) e afirmou esperar que esta legislação resulte em “números significativos” de expulsões este ano.

“Vamos garantir que as pessoas sem o direito de ficarem no nosso país o deixem mais depressa”, afirmou.

Aos deputados Faeser disse que as pessoas passariam a poder ser deportadas “mais depressa e de forma mais eficiente” pelos estados federados, uma exigência recorrente das autoridades, e sublinhou que a lei vai ajudar na luta contra o tráfico humano, aumentando as penas mínimas e máximas para este crime – o que pode aplicar-se às organizações não governamentais que resgatam e apoiam os requerentes de asilo.

Claro que nem todos celebraram, como o Governo, com vários grupos de direitos humanos a criticarem duramente as mudanças. “Estamos horrorizados com o facto de que as pessoas que estão em fuga e os que lhe oferecem ajuda poderem ser ameaçados com penas de prisão”, reagiu a ONG SOS Humanity, cita a emissora pública Deutsche Welle.

Numa publicação na rede X, a organização, que faz operações de resgate no Mediterrâneo, sublinhou que, “em determinadas circunstâncias”, a nova lei pode significar penas de prisão “de até dez anos” para os seus voluntários, acusando o Governo de quebrar “a promessa incluída no acordo de coligação de não obstruir as operações de salvamento e resgate”.

As mesmas preocupações foram longamente debatidas no último congresso dos Verdes. Alguns deputados do partido votaram contra por considerar que a lei vai demasiado longe e põe em risco o trabalho das ONG – a criminalização dos voluntários que trabalham para salvar a vida de requerentes de asilo é uma realidade crescente na União Europeia, nomeadamente em Itália e na Grécia.

Contra votaram ainda a AfD e União Democrata-Cristã (CDU), mas por defenderem uma lei ainda mais dura.

A este debate não tem sido alheio o crescimento da AfD nas sondagens: o partido tem mais de 20% das intenções de voto a nível nacional, só atrás da CDU e à frente de todos os partidos da coligação. Ao mesmo tempo, há uma real subida dos pedidos de asilo, com 352 mil registados em 2023, mais 50% do que no ano anterior, mas estes números estão longe do último pico, entre 2015 e 2017, ano em que 722 mil pessoas pediram asilo pela primeira vez no país.

Adiada antes do Natal por causa das negociações com os Verdes, a discussão acabou por chegar ao Parlamento menos de uma semana depois de o site de investigação Correktiv ter divulgado que membros da AfD participaram num encontro com figuras da extrema-direita violenta em que se discutiu um plano de “remigração” de imigrantes e estrangeiros, uma notícia que o partido nacionalista e xenófobo não desmentiu.

Em resposta, dezenas de milhares de pessoas protestaram contra a AfD em várias cidades e o co-líder do SPD, Lars Klingbeil, descreveu a líder do partido, Alice Weidel, como uma “extremista de direita” e um “lobo com pele de cordeiro”, com o vice-chanceler, e ministro da Economia, Robert Habeck, a acusar o “partido autoritário” de querer “transformar a Alemanha num Estado como a Rússia”.

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