O direito das crianças a um ambiente limpo e saudável e os compromissos da COP28

O impacto das alterações climáticas no bem-estar das crianças é devastador. Mil milhões de crianças, quase metade da população infantil total a nível mundial, está em “risco extremamente elevado”.

Ouça este artigo
00:00
03:40

Temos ouvido falar de forma incessante nos sucessos e insucessos das negociações que estão a decorrer na COP28, sobre as mudanças climáticas, nos Emirados Árabes Unidos (EAU), com o objetivo de debater os resultados do Global Stocktake (GST), o primeiro balanço global dos progressos nacionais em relação ao cumprimento das metas do Acordo de Paris, adotado em 2015. Nos compromissos da COP28 já podemos contar com alguns resultados, designadamente um acordo para a criação de um Fundo de Resposta ao Impacto das Alterações Climáticas; o reforço do Fundo Verde para o Clima; os vários fundos climáticos (como aquele a ser instituído pelos EAU e pela BlackRock); e triplicar a produção de energias renováveis e de energia nuclear, respetivamente, até 2030 e 2050.

Pouco se tem falado do impacto das alterações climáticas nos direitos das crianças nesta COP28. Esta situação tem levado algumas organizações de defesa dos direitos da criança do Brasil, país organizador da COP em 2025 (COP30), a exigir a realização de uma COP dedicada às crianças.

Segundo o relatório de 2023 da Unicef Crianças e as Alterações Climáticas, o impacto das alterações climáticas no bem-estar das crianças é devastador. Mil milhões de crianças, quase metade da população infantil total a nível mundial, está em "risco extremamente elevado" devido, simultaneamente, a uma exposição elevada aos riscos das alterações climáticas e à insuficiência de serviços básicos para as ajudar a enfrentar a situação. Há 40 milhões de crianças que não têm acesso à educação regular devido a catástrofes resultantes dos efeitos das alterações climáticas; na região do Médio Oriente e Norte de África (MENA), 82 milhões de crianças têm vindo a enfrentar, desde o início de 2023, riscos extremamente elevados das alterações climáticas; e 1,5 milhões de novas deslocações internas foram registadas na região MENA na última década, provocadas por inundações e/ou outras catástrofes.

Neste contexto, é quase obrigatório referir o novo Comentário Geral do Comité dos Direitos da Criança (CG26), de 22 de agosto 2023, à Convenção sobre os Direitos da Criança que aborda os direitos da criança e o ambiente, com especial destaque para as alterações climáticas. Participaram na sua elaboração 16.331 crianças de 121 países diferentes. O CG26 estabelece uma ligação direta entre direitos específicos previstos na convenção e o direito a um "ambiente limpo, saudável e sustentável", reconhecendo este último como um direito humano em si mesmo (parágrafo 63) e como o pré-requisito necessário para o pleno gozo de todos os direitos da criança (parágrafo 8).

O CG26 surge num momento crucial para a proteção dos direitos ambientais, desenvolvendo as obrigações dos Estados na realização presente e futura dos direitos das crianças. Salienta a posição única das crianças ao herdarem um mundo marcado pelo aumento das temperaturas, por fenómenos meteorológicos frequentes de elevada intensidade e até por crescentes desigualdades sociais decorrentes do clima. Ao estabelecer uma relação direta com os direitos consagrados na convenção, o CG26 impõe aos Estados uma maior proteção dos direitos das crianças, bem como obrigações mais exigentes em matéria de proteção ambiental. No seu conjunto, o documento é inovador tanto na defesa dos direitos humanos como do direito do ambiente, refletindo a história recente de litígios ambientais registados em vários Estados, tendo como partes as crianças/jovens que têm vindo assumir a liderança e protagonismo na defesa de um ambiente limpo, saudável e sustentável.

Esperemos que o Brasil marque a diferença na COP30 na defesa dos direitos das crianças a um ambiente limpo, saudável e sustentável.

As autoras escrevem segundo o novo acordo ortográfico

Sugerir correcção
Comentar