Uma em cada três crianças no mundo está exposta a escassez grave de água

Estima-se que 739 milhões de crianças e jovens vivam em áreas com escassez de água elevada (ou muito elevada), uma situação que tende a piorar com a crise climática, alerta um relatório da UNICEF.

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Um dos países mais afectados é o Chade, onde oito em cada 10 crianças estão expostas à escassez grave de água Reuters/ZOHRA BENSEMRA

Uma em cada três crianças em todo o mundo (739 milhões) vive em áreas com escassez de água elevada (ou muito elevada), situação que pode ser agravada devido às alterações climáticas, alerta um relatório da UNICEF divulgado esta segunda-feira.

O documento do Fundo das Nações Unidas para a infância demonstra ainda que a crise climática afecta a saúde física e mental das crianças, apelando por isso a acções urgentes para protegê-las.

Além disso, o relatório sublinha que a conjugação de desafios provocados pela redução da disponibilidade de água e pelos serviços inadequados de água potável e saneamento aumenta os riscos para as crianças.

O relatório The Climate Changed Child, publicado duas semanas antes da Cimeira do Clima (COP28), que começa dia 30 no Dubai, destaca a ameaça às crianças como resultado da vulnerabilidade da água, uma das consequências das alterações climáticas.

O documento apresenta uma análise dos impactos de três níveis de segurança da água a nível global: escassez hídrica, vulnerabilidade da água e stress hídrico.

O relatório agora publicado constitui um material complementar ao documento Childre's Climate Risk, divulgado pela UNICEF em 2021. A publicação debruça-se não só sobre a questão da água, mas também sobre outros impactos do clima na infância, incluindo doenças, poluição do ar e fenómenos climáticos extremos, como inundações e secas.

Clima afecta da concepção à vida adulta

"Desde o momento da concepção até à idade adulta, a saúde e o desenvolvimento do cérebro, dos pulmões, do sistema imunitário e de outras funções críticas das crianças são afectados pelo ambiente em que crescem", refere uma nota da UNICEF sobre o relatório, que dá como exemplo que "as crianças são mais susceptíveis a sofrer com a poluição atmosférica do que os adultos uma vez que, geralmente, respiram mais rápido do que os adultos e o seu cérebros, pulmões e outros órgãos ainda estão em desenvolvimento".

Segundo o relatório, a maioria das crianças expostas à escassez de água vive nas regiões do Médio Oriente e do Norte de África e do Sul da Ásia, o que significa que vivem em locais com recursos de água limitados e níveis elevados de variabilidade sazonal e interanual, declínio dos lençóis freáticos ou risco de seca.

"Muitas crianças - 436 milhões - enfrentam o duplo desafio da escassez de água elevada ou muito elevada e dos baixos ou muito baixos níveis de serviço de água potável, sendo este "um dos principais factores de mortalidade entre crianças com menos de cinco anos devido a doenças evitáveis".

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O relatório da UNICEF também cobre impactos do clima na infância como inundações e secas Reuters

Alguns dos países mais afectados são o Níger, a Jordânia, o Burkina Faso, o Iémen, o Chade e a Namíbia, onde oito em cada 10 crianças estão expostas.

O relatório destaca que, nestas circunstâncias, o investimento em serviços de água potável e saneamento seguros é uma linha de defesa essencial para proteger as crianças dos impactos das alterações climáticas, que estão também a levar a um aumento do stress hídrico -- a relação entre a procura de água e as reservas renováveis disponíveis.

Até 2050, prevê-se que mais 35 milhões de crianças estejam expostas a níveis elevados ou muito elevados de stress hídrico.

Crianças "têm pouca voz"

A directora executiva da UNICEF Portugal, Beatriz Imperatori, destaca que "as crianças são as mais vulneráveis à crise climática, mas têm pouca voz e voto nas decisões que afectam o seu futuro".

"Precisamos de obter mais e melhores dados sobre o impacto das alterações climáticas nas diversas dimensões da vida das crianças, seja na educação, saúde, alimentação, espaços urbanos, protecção ou na participação. Estes dados serão cruciais para desenvolver estratégias eficazes e assegurar medidas específicas que defendam o bem-estar e o futuro das crianças em Portugal e no mundo", afirma Beatriz Imperatori, citada no documento.

A responsável refere que, apesar da sua vulnerabilidade única, "as crianças têm sido ignoradas ou, em grande parte, desconsideradas nas discussões sobre as alterações climáticas", dando como exemplo que "apenas 2,4 por cento do financiamento climático proveniente dos principais fundos multilaterais de clima apoiam projectos que incorporam actividades sensíveis às crianças".

Para a COP28, a UNICEF apela aos líderes mundiais e à comunidade internacional para tomarem medidas críticas relativas a este problema e para garantir um planeta habitável. Entres as propostas estão incluir as crianças nas discussões da COP28 e convocar um diálogo de especialistas sobre as crianças e as alterações climáticas.

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