Sete canções para brindar a Shane MacGowan, o rei incontestado do punk celta

A voz dos Pogues morreu esta quinta-feira, aos 65 anos. Aqui ficam sete canções por ele escritas e interpretadas.

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Shane MacGowan em concerto Reuters/Stringer
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Shane MacGowan, grande trovador da diáspora irlandesa, escritor de canções de excelência, bebedor nato e rei incontestado do particular cruzamento entre o punk, a folk celta e a tradição irlandesa que era a identidade dos seus The Pogues, morreu esta quinta-feira, aos 65 anos. Em plena contagem decrescente para o Natal, época a que aludia a sua canção mais popular, Fairytale of New York, um dueto com Kirsty MacColl.

Entre versões de clássicos irlandeses que ajudou a popularizou pelo mundo, MacGowan deixou-nos cinco álbuns com os Pogues – que ainda fizeram um par de discos sem ele –, dois discos a solo e várias colaborações. Dele disse Bruce Springsteen em 2020, no seu programa de rádio e também numa entrevista na televisão irlandesa: “Daqui a 100 anos, a maioria de nós será esquecida, mas acredito que a música do Shane vai continuar a ser lembrada."

Aqui ficam sete canções que dão conta do seu singular universo e ajudam a explicar a devoção que, tal como Springsteen, milhares de músicos e de melómanos lhe dedicaram.

Dark streets of London

O primeiro single dos Pogues, lançado em 1984, quando ainda se chamavam Pogue Mahone, é sobre vaguear por Londres a fazer algo que muitas canções de MacGowan homenageiam: beber. Mostrava logo ao que a banda vinha, espírito punk em convívio com melodias celtas, acordeão e flauta irlandesa. Faria parte do primeiro álbum da banda, Red Roses for Me, do mesmo ano.

Sally MacLennane

Em 1985, os Pogues lançavam o seu segundo disco, Rum, Sodomy and the Lash, produzido por Elvis Costello, que inclui algumas das melhores e mais populares canções de MacGowan. Costello tinha sido chamado só para trabalhar em duas canções. Esta foi uma delas, inspirada no pub irlandês que o tio de MacGowan tinha em Inglaterra e cujo nome refere um tipo de stout (cerveja preta) – o álcool estava mesmo sempre presente. A outra foi a também clássica A pair of brown eyes.

A rainy night in Soho

O EP Poguetry in Motion, de 1986, prolongou a colaboração Costello-Pogues. Nesta canção de amor, que Bono, dos U2, talvez o músico irlandês mais famoso de sempre, pôs em 13.º lugar de uma playlist que compilou este Verão para o portal IrishCentral com as suas canções irlandesas favoritas. Terá havido um confronto entre o produtor, que preferia um oboé na canção, e MacGowan, que preferia um cornetim, sendo que esta última versão é a que faz parte do EP e da reedição de Rum, Sodomy and the Lash com faixas bónus. Foi com este EP que os Pogues chegaram pela primeira vez ao top 40 inglês.

The body of an american

MacGowan tinha um grande fascínio pela diáspora irlandesa nos Estados Unidos, antes mesmo de alguma vez ter visitado o país. Esta canção sobre um soldado desconhecido morto em combate, também de Poguetry in Motion, reflecte esse fascínio. Na hoje mítica série televisiva The Wire, sempre que um polícia morria, fazia-se o funeral num pub com o caixão aberto, e os colegas a beberem e a cantarem, entre copos, esta canção. David Simon, o criador da série, está há anos a trabalhar num musical de palco a partir do cancioneiro dos Pogues. Na rede social outrora conhecida como Twitter, o autor lembrou esta quinta-feira um dos seus encontros com MacGowan, em que lhe agradeceu a canção e lhe chamou "um dos grandes escritores de canções e contadores de histórias do nosso tempo". Quanto ao musical, vai para o rascunho número 16, que ainda não faz jus à obra de MacGowan, confessa o argumentista.

Haunted

Em 1986, os Pogues fizeram uma canção para Sid e Nancy, o filme de Alex Cox sobre a relação de Sid Vicious e Nancy Spungen – no ano a seguir, o músico faria parte, com muitos colegas seus, do impressionante elenco de Straight to Hell, um bizarro western de Cox rodado em Espanha. MacGowan cantou-a com Cait O'Riordan, a baixista da banda. Em 1995, a solo, MacGowan regravou a canção como um dueto com Sinéad O'Connor, outra das mais reconhecíveis vozes irlandesas desaparecidas este ano.

Fairytale of New York

Há quase duas décadas que, aproximando-se a quadra natalícia, saem notícias de que a BBC não irá passar a versão original deste clássico de Natal, a canção mais popular e bem-sucedida de MacGowan. O discurso é sempre igual, uma variação do "já não se pode dizer nada". É que o tema inclui, numa troca de insultos entre os seus protagonistas, um palavrão depreciativo para homossexuais. Já em 1992, no programa Top of the Pops, o termo tinha sido alterado por Kirsty MacColl (1959-2000), a cantora britânica que faz dueto com MacGowan nesta canção. O próprio MacGowan não via problemas em que uma versão diferente da sua canção mais célebre passasse na rádio.

Os fãs célebres de Fairytale of New York são incontáveis. No ano passado, num concerto em Dublin com MacGowan no público, Bob Dylan, que teve os Pogues a fazer as suas primeiras partes nos anos 1980, cumprimentou o músico e disse que esta canção "significa muito" para ele e para a sua banda. "Tocamo-la todos os Natais." Nick Cave, que colaborou com MacGowan e é contra a censura da versão original, chamou-lhe "a melhor canção de Natal alguma vez escrita".

No ano passado, também Annie Lennox e Joss Stone escolheram-na como sua canção de Natal favorita para uma lista do Vulture, o site da New York Magazine. Lennox descreveu-a como "uma balada irlandesa-americana tumultuosa" que traz com ela "visões de lutas bêbedas, sonhos destruídos e disforia natalícia", com "árvores de Natal tristes destruídas em caixotes do lixo".

If I should fall from grace With God

Em Novembro de 1987, os Pogues tiveram um grande êxito com Fairytale of New York. Foram depois para estúdio gravar o seu terceiro álbum, If I Should Fall From Grace with God, já sem Cait O'Riordan, que tinha saído para tocar com Elvis Costello, com quem passara a formar um casal. O álbum contém também Fairytale of New York, mas arranca com o tema homónimo, altamente dançável, e temas como Fiesta, que Portugal recordará também como a base de Festa, dos Despe e Siga.


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