Skoola, a academia de música urbana onde Fábio se descobriu

A Skoola está aberta a todos, uns pagam e outros não. Uma forma diferente de aprender música.

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Há dois anos que os contentores do Village Underground, em Lisboa, acolhem a Skoola LUSA/ANTÓNIO PEDRO SANTOS

Fábio tem 17 anos e frequenta há quatro a Skoola, academia de música urbana em Lisboa que já lhe permitiu "mostrar aos outros coisas" que nem sequer sabia ser capaz de fazer.

Há dois anos que os contentores do Village Underground, em Lisboa, acolhem a Skoola, onde o método de ensino é "um pouco diferente das outras escolas mais tradicionais de música", diz a directora da academia, Mariana Duarte Silva.

"É um ensino não-formal, um ensino mais horizontal, mais orgânico, onde não há professor e aluno, mas sim um conjunto de participantes que quer aprender a fazer música e um conjunto de facilitadores, artistas, que vão facilitando esse processo", descreve a também fundadora do Village Underground Lisboa.

Dirigida à faixa etária entre os 10 e os 18 anos, a Skoola estima já ter chegado, nas diversas actividades que realiza e em que participa, a 400 jovens. "É uma escola aberta a todos", que também se diferencia "porque recebe jovens de todos os contextos sociais", realça a directora.

O relatório de acompanhamento da Skoola feito recentemente por dois investigadores da Escola Superior de Educação de Lisboa, Abel Arez e Manon Marques, destaca a "valorização da diversidade" do projecto.

"Todos podem aprender a fazer música, uns pagam e outros não. Os que pagam as mensalidades são jovens cujos pais ou encarregados de educação o podem fazer e sabem que estão a contribuir para aquele que não pode", explica.

O rácio dos que não podem pagar ainda é maior e a sustentabilidade financeira do projecto passa por aumentar o número de pagantes para pelo menos metade.

Durante estes primeiros dois anos de funcionamento, o projecto contou com financiamento do Estado e de investidores sociais, mas desde Julho que está mais por sua conta.

A Skoola vai agora apostar na angariação de fundos junto de empresas e fundações que considerem relevante o investimento em projectos que levam a cultura aos jovens.

"Uma coisa bem linda"

A Skoola "não é bem uma escola de música", nota Fábio, considerando-a "inspiradora" e "uma das melhores experiências" que já viveu.

Ali, com a ajuda dos facilitadores e o "apoio emocional" dos colegas, Fábio percebeu que ainda tem "muito para aprender" e que "a música não é só cantar ou fazer sons, é mais [do que isso], é ter uma imaginação própria".

Samantha, conhecida artisticamente como Muleca XIII, é uma das facilitadoras que mais recentemente se juntou à equipa da Skoola.

De origem brasileira e a viver em Portugal há nove anos, a rapper assume-se como "arte-educadora" e diz que a experiência proporcionada pela Skoola "é uma coisa bem linda".

Entre os skoolers, uns gostam mais de criar letras, outros preferem produzir instrumentais e melodias, outros gostam de cantar e de pegar em instrumentos, numa "convivência muito boa".

Além de Muleca XIII, a equipa de facilitadores conta com músicos como Pedro Coquenão (Batida), Bruno Mushug (Octa Push), Maze (rapper), Tânia Lopes (Homens da Luta) ou Filipe Sousa (Quest Ensemble).

O método seguido pela Skoola "é uma forma de aprender com um quê de liberdade", que passa por "só mostrar o caminho dentro do que cada um quer fazer", refere Muleca XIII, que, prestes a lançar um álbum em nome próprio, se revê nos jovens com quem tem trabalhado.

"É indiferente se eles vão trabalhar com música quando forem adultos ou não, porque este processo é fundamental, como pessoa, todo o mundo pode usufruir [dele]", destaca Muleca XIII, arriscando que vão sair "alguns artistas" do grupo de skoolers que está a acompanhar.

Ainda sem saber se fará da música algo mais profissional na vida adulta, Fábio já conseguiu "criar muita coisa" na Skoola, onde gosta sobretudo de improvisar letras.

"Esta escola não é bem uma escola, mas um ambiente de convívio", onde se "aprende mais", nomeadamente sobre "a opinião dos outros", distingue.

Fábio não se considera "muito sociável" e diz que a Skoola o ajudou "a socializar", a "não sentir tanta vergonha" de si próprio e a "poder mostrar aos outros coisas" que nem sequer sabia que podia fazer.

No fundo, a Skoola "é aquele primeiro passo no mundo da música, em que eles podem experimentar o que quiserem e aí descobrirem o seu caminho", resume Mariana Duarte Silva.

"Não é tanto o género de música que transforma e tem impacto nestes jovens, é mais este método, mais horizontal, mais próximo, mais ligado à comunidade artística, em que cada um é ouvido dentro do grupo, cada um é considerado artista", realça.

Desde que se lembra que gosta de rap, graffiti e skate, mas Muleca XIII nunca teve a oportunidade de entrar numa "escola" deste tipo e teve de enfrentar o "preconceito", na família e na escola, por fazer parte da chamada cultura urbana.

Recuando à sua adolescência, consegue dizer que "a arte urbana tomou muito espaço" e fica contente com isso. "Mais do que espaço, respeito", nota.

Antes "marginalizada", a cultura urbana é agora "considerada uma arte também", realça Muleca XIII, partilhando:

"Hoje em dia está muito melhor. A gente tem de aproveitar essa onda, a gente está na crista da onda e parece que essa onda só sobe, só sobe... Para mim, é uma coisa linda, foi o que eu desejei quando era mais nova. Estou a ver muitas coisas se realizando, alguns sonhos se realizando".

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