“Nada é real neste processo”, diz defesa de irmãos iraquianos acusados de terrorismo

Julgamento prossegue com a audição das testemunhas de acusação. Inspector da PJ mostrou vídeos de propaganda do Daesh que a defesa contesta como prova contra os dois arguidos.

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O julgamento decorre no Campus da Justiça em Lisboa LUSA/JOSÉ SENA GOULÃO
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Depois de nas anteriores sessões do julgamento dos dois irmãos iraquianos acusados em Portugal de crimes relacionados com terrorismo​ no Iraque terem sido ouvidos os inspectores da Unidade Nacional Contraterrorismo da Polícia Judiciária Arménio Pontes e Paulo Simões, esta quinta-feira foi a vez do inspector da mesma unidade, Jorge Resende.

Conduzido pelas perguntas da representante do Ministério Público, no julgamento, o inspector descreveu ao longo de mais de três horas como fez a análise digital do que diz ser prova que passou o teste da autenticidade: pequenos vídeos amadores, que atribui à agência que fazia a propaganda do Daesh, encontrados na Internet e redes sociais e fotografias dos dois arguidos, recolhidos nos equipamentos tecnológicos apreendidos nas buscas realizadas a 2 de Setembro de 2021 em que os dois irmãos foram detidos pela Polícia Judiciária.

Ammar e Yassir Ameen estão acusados, respectivamente, de um crime de adesão a organização terrorista cada um e de nove e oito crimes crimes de guerra contra as pessoas alegadamente cometidos no Iraque pelo MP de Portugal, onde foram acolhidos como refugiados em Março de 2017.

​Na sessão desta quinta-feira, em vários momentos, o inspector expôs a conclusão a que chegou de que os vídeos "corroboram aquilo que disseram as testemunhas nas declarações para memória futura recolhidas no Iraque".

Estas alegam que Ammar era visto a fiscalizar os civis que se suspeitava serem da resistência à organização terrorista, na cidade de Mossul, ocupada pelo Daesh entre 2014 e 2016, "por testemunhas, vizinhos, amigos, detentores de lojas ali perto, e não só pelo polícias e os militares que conduziram a investigação​", referiu o inspector, admitindo contudo que a zona onde foi filmado o vídeo mostrado era muito movimentada.

Yassir aparece em pelo menos um dos vídeos da propaganda do Daesh, filmados numa rotunda de Mossul que o inspector associa a uma "arena, como os antigos pelourinhos, onde se fazia o açoitamento e o apedrejamento" dos suspeitos de pertenceram à resistência ao Daesh.

A meio da tarde, já no tempo para a defesa confrontar a testemunha de acusação (e que continuará no dia 28 de Novembro), Vítor Parente Ribeiro levantou dúvidas sobre a autenticidade dos vídeos. O advogado indicou que sendo estes "editados ou montados", nada garantia que a imagem de Yassir, que aparecia num filme de propaganda, mas como que desgarrado do contexto e sem estar ao lado de pessoas identificadas como sendo do Daesh, não teria sido introduzida posteriormente no vídeo.

Testemunhas ouvidas em Mossul

Ainda de manhã, e enquanto o inspector respondia às perguntas do MP, o advogado disse sobre os vídeos e em tom de desabafo: "Nem isto é real neste processo."

Para os advogados de defesa, “a única prova existente” neste processo são as declarações para memória futura de testemunhas no Iraque, como disse ao PÚBLICO, no final da sessão, Vítor Parente Ribeiro que, mesmo assim aponta “contradições” entre aquilo que é dito por dois membros de uma mesma família que se diz perseguida pelos irmãos. "Não há nada real neste processo."

Estas testemunhas identificam Ammar e Yassir como membros do Daesh, no seu alegado papel de fiscalizadores da proibição instaurada na altura de haver qualquer tipo de resistência ao Daesh; mais particularmente, alegam que os irmãos, um deles enquanto elemento da polícia religiosa e de costumes e outro como agente dos serviços de informação, os terão perseguido e torturado – o que ambos desmentem.

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