Ex-director-geral da Administração Interna condenado outra vez em tribunal

João Correia esteve no centro de um esquema relacionado com empreitadas feitas por ajuste directo em esquadras e postos da GNR.

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Vários arguidos integravam um grupo de almoçaradas chamado Os Pingas Daniel Rocha
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O arquitecto que dirigia as infra-estruturas do Ministério da Administração Interna, João Correia, entre 2011 e 2014, foi condenado em tribunal esta segunda-feira por estar no centro de um esquema relacionado com empreitadas feitas por ajuste directo em esquadras e postos da GNR. A notícia foi dada pela SIC e confirmada pelo PÚBLICO.

É a segunda vez que o antigo director-geral de Infra-Estruturas e Equipamentos da Administração Interna é sentenciado pelos crimes de participação económica em negócio, abuso de poder e falsificação de documentos. Condenado em 2018 a sete anos de cadeia, João Alberto Correia viu o Tribunal da Relação de Lisboa mandar repetir o julgamento, por entender que a decisão de primeira instância padecia de erros graves. Agora os juízes de primeira instância aumentaram-lhe a pena, para sete anos e nove meses.

Diz o Ministério Público na acusação que o antigo dirigente e os seus cúmplices manipularam dezenas de concursos destinados à construção ou reparação de esquadras, postos da GNR e edifícios dos antigos governos civis, por forma a entregar as respectivas empreitadas a amigos e a irmãos seus da maçonaria.“Os arguidos conseguiam que as propostas de autorização de procedimento fossem lançadas por um valor-base superior ao custo real médio de mercado e que fossem convidadas as empresas previamente determinadas. O vencedor estava também previamente determinado”, descreve a sentença. "Para garantir o sucesso do acordado, mais decidiram que seriam os próprios a proceder ao levantamento das necessidades - quer ao nível dos trabalhos a realizar, quer do material ou equipamento necessário."

Assim sucedeu, por exemplo, com a transferência da esquadra da PSP que existia na Praça do Comércio, espaço agora ocupado por um hotel de luxo, para instalações na Rua da Prata que foi preciso remodelar com carácter de urgência. Uma empreitada que terá lesado o Estado em 50 mil euros. O mandato de João Alberto Correia coincidiu com a decisão governamental tomada em 2011 de extinguir os Governos Civis, readaptando estas instalações por forma a que pudessem ser ocupadas pelas forças de segurança e outros serviços do Ministério da Administração Interna. Foi mais uma oportunidade que o arquitecto e os seus amigos, alguns dos quais integravam um grupo de almoçaradas e jantaradas chamado Os Pingas, não deixaram escapar. Acusado de oito dezenas de crimes, João Correia foi sendo sempre ilibado de corrupção. Mas considerado culpado da prática de mais de três dezenas de outros delitos.

O colectivo de juízes do Campus da Justiça, em Lisboa, manteve também as condenações de vários outros arguidos, incluindo a da jurista Luísa Sá Gomes a dois anos e meio de prisão. Actualmente técnica superior nos serviços jurídicos e de contencioso da secretaria-geral do Ministério da Economia, esta arguida foi nomeada pela ministra da Agricultura para subdirectora-geral de Veterinária já depois de ter sido sentenciada a dois anos e três meses no primeiro julgamento. Quando se soube que estava a ser julgada outra vez acabou por se demitir do cargo.

Da acusação do Ministério Público, que pediu que fosse inibida de exercer funções públicas durante três anos, fazem parte escutas de que foi alvo depois de ter sido nomeada directora de serviços Jurídicos, Contratação e Património, da Direcção-Geral de Infra-Estruturas e Equipamentos do Ministério da Administração Interna, em 2012, por escolha de João Correia, de quem foi considerada cúmplice.

Ao contrário do que fez com o principal arguido do processo, o tribunal não lhe aplicou no entanto esta pena acessória, por apenas poder ser usada em condenações superiores a três anos de cadeia. Já João Correia fica proibido de desempenhar o cargo que exercia durante cinco anos. Afinal, recordam os juízes, "não era um mero funcionário, mas sim o director-geral", tendo, apesar disso, "violado os principais alicerces éticos, deontológicos e jurídicos em que assentava o exercício da sua função para favorecer terceiros, gerindo de forma abusiva o orçamento que lhe havia sido confiado".

Pelas contas do tribunal, o seu comportamento criminoso e dos seus cúmplices custou ao Estado mais de 807 mil euros, montante que terão agora de devolver aos cofres públicos. Além disso, foi-lhe arrestado património imobiliário que será declarado perdido a favor do Estado, no valor de 432 mil euros, por ser considerado incongruente com os seus rendimentos e portanto proveniente de actividades ilícitas.

Aos sete anos e nove meses a que foi condenado serão descontados os cerca de dois anos que passou em clausura, primeiro em prisão preventiva e depois em domiciliária.

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