Livro ilustrado No meu bairro tem nova apresentação em Lisboa e editora avalia reedição

A nova apresentação do livro No meu bairro decorrerá esta sexta-feira na Fundação José Saramago. Depois de uma primeira apresentação tumultuosa, o livro já esgotou temporariamente.

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O livro de Lúcia Vicente e Tiago M foi alvo de um protesto na última sexta-feira NELSON GARRIDO

O livro ilustrado No meu bairro, de Lúcia Vicente e Tiago M, sobre inclusão, tolerância e diversidade, vai ter uma nova apresentação na sexta-feira, na Fundação José Saramago, em Lisboa, disse esta segunda-feira à Lusa fonte do grupo editorial Penguin Random House.

De acordo com a mesma fonte, surgiram "vários pedidos de eventos e apresentações" e está previsto um evento na sexta-feira, "em resposta ao convite da Fundação José Saramago, que se disponibilizou para acolher a sessão" e que assegurará "as medidas de segurança necessárias ao normal funcionamento do evento".

O primeiro lançamento do livro aconteceu na sexta-feira passada, também em Lisboa, mas foi interrompido por um protesto, que Lúcia Vicente, em declarações à Lusa, considerou "pura censura". Por sua vez, o grupo editorial classificou como "uma ameaça à liberdade de expressão".

Em comunicado divulgado no sábado, a editora relatou que na livraria onde decorria a apresentação irrompeu "um protesto intimidatório, de megafone na mão", com o objectivo de "silenciar as vozes da autora e das apresentadoras" e "confrontando directamente o público que assistia".

Segundo a autora, foi contactada a Esquadra do Rato, cujos agentes identificaram os manifestantes, e está ainda a ser ponderada uma queixa no Ministério Público.

Questionada esta segunda-feira pela Lusa, fonte da Penguin Random House disse que o livro está a ter mais procura nas livrarias, houve ruptura temporária de stock, estando ainda a ser avaliada uma segunda edição.

No meu bairro reúne 12 pequenas histórias de ficção em rima, protagonizadas por crianças que falam sobre as suas vidas, sobre racismo, identidade de género, religião, bullying e activismo.

Em algumas das histórias, Lúcia Vicente recorreu à linguagem neutra "elu", utilizada sobretudo pela comunidade LGBTQIA+, na qual os pronomes pessoais "ele" e "ela" se transformam em "elu" ou "elus", no singular e no plural, e as conjugações verbais e algumas palavras terminam, por exemplo, em "es", "us" ou "ies".

Há uma semana, Lúcia Vicente explicou que a utilização daquela linguagem "é uma proposta, é uma forma de abrir a discussão", incluindo pais, professores, educadores e os mais novos.

"Quer eu quer o Tiago [o ilustrador] não vamos obrigar ninguém, obviamente, a falar de forma neutra. Nós próprios não o conseguimos fazer ainda por uma questão de hábito. Tal como muitas coisas na nossa sociedade, seja ela o machismo, seja ela o racismo, são questões estruturais. Um idioma e a linguagem passam também por uma questão estrutural", sublinhou. Para a autora, "há muita resistência ao que é novo e é diferente".

"Há muita resistência ao que inclui todas as pessoas da nossa sociedade, tornar visíveis as pessoas que são invisíveis perante os nossos olhos, porque são diferentes, porque nos mostram um caminho novo a nível cultural e a nível social. É mais fácil continuar a apagá-las do que aceitar que elas existem, e se elas existem é porque é preciso mudar alguma coisa na nossa sociedade. E isso dá muito trabalho", afirmou Lúcia Vicente.

Por sua vez, a associação SOS Racismo sublinhou a importância da linguagem inclusiva como ferramenta para combater a discriminação, assim como para "existir e resistir sobre a violência e censura".

"Antes e após esta iniciativa, somaram-se outros comentários à iniciativa, apresentados nas redes sociais, e que expressavam bem a narrativa de violência e intolerância contra a linguagem inclusiva. (...) Estes comentários insistem em inspirar o medo e apreensão face ao outro, à diversidade, alimentando antes uma cultura de violência e de silenciamento. Mais uma vez, assiste-se a comparar o incomparável, a alegar liberdade de expressão quando o que praticam é a opressão", lê-se no comunicado enviado esta tarde à comunicação social.

A edição de No meu bairro conta com apoio da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género e da AMPLOS -Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género.

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