Dão apoio emocional e “ganham muito” em troca. SOS Estudante procura voluntários

Prestar apoio emocional é o objectivo da linha SOS Estudante, composta por estudantes de Coimbra, mas a funcionar para todo o país. Quem faz parte do projecto garante é uma experiência positiva.

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Quem mais procura a SOS Estudante o sexo masculino e pessoas entre os 36 e os 49 anos Getty Images
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“Dei o meu tempo, mas recebi muito de outras formas.” É assim que Juliana Jesus recorda a sua passagem pela SOS Estudante, uma linha telefónica criada por alunos universitários de Coimbra que, há 26 anos, dá apoio emocional a quem precisa e trabalha na prevenção do suicídio. Neste momento, há 20 jovens a atender diariamente as chamadas que chegam de todo o país, mas a linha está à procura de novos voluntários.

A nova fase de recrutamento, aberta a todos os estudantes universitários de Coimbra — e isto inclui ensino público e privado, faculdades e politécnicos —, arrancou na segunda-feira e estende-se até dia 8 de Outubro.

O “recrutamento começa com entrevistas iniciais, depois passa por uma formação de 30 horas, devidamente certificada, e termina com novas entrevistas”, explica a vice-presidente do projecto Inês Nunes Coelho, em conversa com o P3.

Não há requisitos específicos para que se aceitem voluntários, além da vontade de ajudar. As áreas de formação dos voluntários também são diversas, apesar de haver uma clara concentração de estudantes de Psicologia. Do Direito à Medicina, Matemática ou Biologia, quase todos os cursos querem estar envolvidos.

O recrutamento inclui uma formação de 30 horas, para que todos tenham a mesma preparação e consigam antecipar o que vem por aí. “A pessoa que nos liga pode ter dificuldade em exprimir-se, mas, deste lado, temos de a compreender. Desenvolvemos muito a empatia, a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro. No momento em que atendemos a chamada não somos nós, somos a linha”, destaca a vice-presidente. O apoio prestado é “livre de preconceitos, respeitando e aceitando as diferenças interpessoais sem influência do ponto de vista religioso, político ou ideológico”, lê-se no site oficial.

As 30 horas de formação estão divididas em dez sessões. Na primeira, os voluntários ficam a conhecer o projecto; seguem-se conhecimentos mais específicos relacionados com os temas que, ao longo dos 26 anos de funcionamento da linha, têm sido mais recorrentes.

No último ano lectivo, por exemplo, “o tema mais comum foi, sem dúvida, a ansiedade. Depois destacam-se a carência afectiva, os comportamentos autolesivos e as crises de identidade”, relata a responsável.

Terminada a formação, há uma nova ronda de entrevistas para avaliar “como é que estas pessoas conseguem interagir com o outro”. Para Juliana Jesus, que passou por todas estas etapas no primeiro ano de mestrado, em 2021, “mesmo que eu não tivesse entrado já tinha valido a pena a experiência” pela vertente formativa, conta ao P3.

"Ninguém está sozinho"

“Fiz a formação ainda sem saber se ia entrar. São 30 horas de investimento, sem garantias”, admite. Contudo, o custo-benefício foi “muito positivo”.

Apesar de ser estudante de Psicologia, a jovem de 23 anos afirma que, quando se juntou à linha, “não tinha ainda os conhecimentos necessários para este voluntariado". Por isso, vê a formação como uma mais-valia: “É completamente prática, necessária, muito directa e muito adequada àquilo que eu ia precisar depois no atendimento”.

A SOS Estudante proporciona “um espaço anónimo e confidencial para desabafar”, como se lê na apresentação do projecto, mas este apoio pode também ser marcante para quem está a ajudar. “Uma ou outra chamada marcou-me emocionalmente e precisei de falar sobre como me estava a sentir”, lembra Juliana. Por isso mesmo, todos os voluntários contam também com uma psicóloga disponível para desabafar. “Ninguém está sozinho, construímos uma rede de confiança para falarmos sobre o que se passa”, garante a vice-presidente.

Entre Fevereiro e Julho deste ano, a linha já recebeu 447 chamadas. Quem mais a procura é o sexo masculino e, apesar de o público-alvo inicial do projecto ser a comunidade estudantil, hoje a maioria das chamadas chega de pessoas entre os 36 e os 49 anos.

A SOS Estudante nasceu da constatação de que, à chegada à faculdade, “havia pessoas que precisavam de ajuda e não tinham com quem falar, estavam isoladas”. “Estamos à procura de voltar para os estudantes”, sublinha Inês Nunes Coelho, reconhecendo que, ainda que agora haja mais recursos, “continua a ser difícil arranjar psicólogos nas instituições académicas”. A linha pretende colmatar essa falha.

Cada voluntário dá 15 horas por mês ao projecto, entre atendimento de chamadas — que decorre entre as 20h e a 1h da manhã — e reuniões com outros voluntários. Este tempo subtrai-se às horas de estudo ou às saídas com os amigos, mas traz “ganhos pessoais”. Além das “aprendizagens”, “ficam amizades” entre o grupo de voluntários. “O custo benefício foi imenso. Dei do meu tempo, mas recebi muito de outras formas”, conclui Juliana.

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