Morreu Teodora Cardoso, “missionária” das contas públicas
A economista Teodora Cardoso tinha 81 anos. Grande parte da sua carreira foi feita no Banco de Portugal, mais foi na presidência do Conselho de Finanças Públicas que teve maior exposição pública.
Economista e primeira presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP), Teodora Cardoso morreu este sábado em Lisboa aos 81 anos, disse à Lusa fonte do Banco de Portugal.
Foi à frente do CFP, de Fevereiro de 2012 até Março de 2019, organismo independente ao qual incumbe fiscalizar o cumprimento das regras orçamentais em Portugal, que se tornou conhecida dos portugueses, apesar de muitas outras intervenções públicas, assumindo com frontalidade a avaliação das contas públicas.
Teodora Cardoso nasceu em Estremoz e licenciou-se em Economia, no Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (actual ISEG), tendo feito uma parte substancial da sua carreira no Banco de Portugal, onde ingressou em 1973, inicialmente como técnica do Departamento de Estatística e Estudos Económicos, que veio a dirigir. Em Junho de 2008 foi nomeada para o conselho de administração, onde permaneceu até Fevereiro de 2012.
Os anos de trabalho no Banco de Portugal deram-lhe um profundo conhecimento da economia portuguesas, mas também uma grande sensibilidade sobre o impacto dos números no cidadão comum, ou nos portugueses em geral.
Em 2019, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, elogiou-a pelo “escrúpulo constante de serviço público” e “a sistemática preocupação com as finanças públicas”, palavras proferidas por Marcelo Rebelo de Sousa no 8.º Congresso Nacional dos Economistas, em 2019, onde a economista foi premiada pela sua carreira.
Nessa cerimónia, e assumindo que nem sempre estiveram de acordo, o Presidente da República destacou o trabalho de Teodora Cardoso. "Palavras para reconhecer a dedicação de uma vida missionária, a humilde integridade, o escrúpulo constante de serviço público, a pertinaz liberdade de espírito, a sistemática preocupação com as finanças públicas, a indomável resistência física e psíquica, que se somaram a um longo e formativo percurso e a uma competente e enriquecida experiência.”
Naquele mesmo ano, Marcelo Rebelo de Sousa condecorou a economistas com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, uma distinção atribuída a quem houver prestado serviços relevantes a Portugal, no país e no estrangeiro, assim como serviços na expansão da cultura portuguesa ou para conhecimento de Portugal, da sua História e dos seus valores. Já em 2005 Jorge Sampaio condecorara Teodora Cardoso com o grau de grande-oficial da Ordem do Infante D. Henrique.
Este sábado, o Presidente da República disse lamentar a morte de Teodora Cardoso, "economista reconhecida e respeitada com uma vida dedicada ao país com elevado sentido de missão e plena dedicação à causa pública, nos anos mais recentes com relevância nas finanças públicas", apresentando "aos familiares e amigos mais próximos as mais sentidas condolências".
Em nota publicado no site oficial, "o Governador e todo o Conselho de Administração do Banco de Portugal manifestam o seu mais profundo pesar pelo falecimento de Teodora Cardoso, a primeira mulher Administradora do banco, após uma longa carreira como economista da instituição", onde também se "realça o brilhante percurso de uma economista que esteve ligada à instituição ao longo das últimas cinco décadas".
Teodora Cardoso nunca se inibiu de tomar posições críticas em relação a várias matérias, uma das quais foi precisamente sobre a saída de antigo ministro das Finanças, Mário Centeno, para governador do Banco de Portugal (BdP).
“Vai ter custos”, defendeu então, considerando que “o BdP sempre foi um contrapeso da politização constante da economia e teve um papel importante para corrigir certas coisas, e em parte também para as evitar, mas para isso tem que ter uma grande independência face ao poder político”, disse em entrevista ao Eco, jornal económico online.
O Conselho das Finanças Públicas, agora liderado por Nazaré Costa Cabral, também manifesta “o seu mais profundo pesar” pela morte da sua primeira e “distinta” presidente, lembrando que a economista “esteve ainda na génese do CFP ao integrar, em 2011, o grupo de trabalho criado para elaborar os estatutos desta instituição”.
“Por todo o trabalho que desenvolveu ao longo da sua vida, o CFP manifesta o seu apreço e gratidão prestando homenagem à mulher e economista que muito marcou e contribuiu para afirmar a independência desta instituição”, lê-se na nota publicada na página oficial da instituição.
Também o ministro, Fernando Medina, e a equipa do Ministério das Finanças "lamentam profundamente a morte de Teodora Cardoso", considerando-a "um exemplo e uma economista incontornável na história da democracia portuguesa".
"Teodora Cardoso representou e continuará a representar um referencial de seriedade, rigor e exigência não só para economistas, como para todos os envolvidos no desenho e implementação de políticas públicas", refere a nota de pesar divulgada já de madrugada, onde se acrescenta que "entre os valiosos contributos que ofereceu à causa pública destaca-se, nos últimos anos, a presidência do Conselho de Finanças Públicas, organismo do qual foi fundadora, pugnando pela defesa de princípios de transparência, independência, sustentabilidade e responsabilidade na condução da política orçamental".
Ao longo da sua carreira, a economista participou na elaboração da Lei Orgânica do Banco de Portugal (1975), esteve envolvida na negociação dos acordos de estabilização com o Fundo Monetário Internacional (1984/1985) e representou o Banco de Portugal no Sub-Comité de Política Monetária do Comité de Governadores da Comunidade Europeia, de 1990 a 1992.
Teodora Cardoso iniciou a sua carreira profissional na Fundação Calouste Gulbenkian e foi consultora do Banco Português de Investimento (actual Banco BPI) entre 1992 e 2008.
Notícia actualizada às 10h00, com nota de pesar do ministro e do Ministério das Finanças.