Hábitos visíveis de má liderança

Liderar é efectivamente muito mais do que gerir. São duas coisas muito diferentes, na verdade.

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"A liderança enquanto modo de vida não é o ‘quero, posso e mando’. É o serviço humilde" Rui Soares/Arquivo
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Depois de passada a pandemia ficaram-nos alguns amargos de boca. Possivelmente sempre cá estiveram, mas talvez mais disfarçados e com menos visibilidade e intensidade. Falo das lideranças das escolas, das lideranças em si mesmas. Felizmente, e ainda bem, não de todas.

O sentimento de crispação crescente que se tem vivido depois da pandemia, onde parece que desaprendemos de viver em comunidade e de comunicar de forma eficaz, de facilitar e potenciar espaços onde nos consigamos entender em cada contexto, é cada vez mais acentuado. Têm sido inúmeros os casos de lideranças autoritárias e autocráticas de que ouço falar e que de uma maneira ou de outra tenho vivido.

Nos últimos tempos tínhamos feito uma evolução grande em termos de investigação e práticas de liderança: tínhamos ultrapassado os estilos de liderança e estávamos mais centrados nas competências dos líderes, dos bons líderes, como seja a escuta ativa, a transparência, a construção de fortes relações humanas e a vulnerabilidade enquanto poder agregador e motivacional, assim como a inspiração de uma comunidade pela partilha do propósito que indica o ponto de chegada, sonhado a todo o tempo.

O estado de crispação é acentuado, e os resquícios de medo que nos ficaram da incerteza e instabilidade da pandemia, faz com que muitos líderes se virem para velhas estratégias com ameaças diversas, porem pessoas muito válidas na prateleira, o que causa frustração e sentimento de subaproveitamento, como quem quer dizer: ‘Estou aqui a estragar-me’.

Um dos primeiros sinais de má liderança é o não-reconhecimento dos sucessos alcançados pelos colaboradores e ao mesmo tempo arranjar um bode expiatório para quando as coisas correm mal. É um sentimento de um vazio enorme quando alguém alcança uma meta predefinida e não tem qualquer tipo de reconhecimento. Frases como ‘não fez mais do que o seu trabalho’, ou ‘é para isso que é pago’, não só são desmotivadoras, como injustas, e pior do que tudo, magoam profundamente.

Mas a ausência até de frases como esta, ou seja, a indiferença, magoa bem mais. Este tipo de comportamento tem associada a visão dos colaboradores como se de autómatos de tratassem. Uma espécie de abelhinhas trabalhadoras que podem ser contratadas, despedidas, transferidas, colocadas na prateleira, a gosto de quem pensa que é líder e brinca aos ‘donos disto tudo’. Liderar é efectivamente muito mais do que gerir. São duas coisas muito diferentes, na verdade.

O clima de falta de transparência e pouca ou nenhuma informação a circular, faz com que as agendas próprias apareçam e os mexericos sejam mais do que muitos a ver se algum deles acerta naquilo que se está a passar ou parece estar na cabeça de alguém que manda. Este clima organizacional de desconfiança, de falta de transparência, de pouca ou nenhuma delegação de competências, de ausência de aprendizagem colaborativa, de falta de criatividade, inovação e riscos, aparece porque não se reúne, não se comunica eficazmente e não se partilha informação, não se estabelecem objetivos, não se envolve os colaboradores.

A liderança enquanto modo de vida não é o ‘quero, posso e mando’. É o serviço humilde, vulnerável, aprendente e em crescimento de alguém que se considera parte de uma comunidade, em que cada um faz a diferença. E faz mesmo. E o líder também. Ninguém sabe tudo e todos sabem alguma coisa. Pensamos, temos ideias e propostas de soluções.

Uma comunidade em que nos sentimos ouvidos e reconhecidos gera motivação, responsabilidade, envolvimento e compromisso.

As escolas são modelos de vida. Ninguém quer viver onde se sente maltratado. As mudanças são mais que muitas na educação. O que tem faltado na batuta dos líderes escolares para existir tamanha inquietação?

Sabemos que ‘em tempo de crise não se tomam decisões’. Na minha opinião prevalece a outra máxima que diz que ‘os tempos de instabilidade são tempos de grandes oportunidades’.

As lideranças precisam de atenção e cuidado. Quais são as oportunidades?

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