Depois de atacar portos, Rússia ameaça visar embarcações no mar Negro

A região costeira ucraniana voltou a ser alvo de bombardeamentos intensos que danificaram consideravelmente a infra-estrutura portuária, após o fim do acordo de exportação de cereais.

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Bombardeamentos russos atingiram armazéns e infra-estruturas portuárias na região de Odessa Reuters/STATE EMERGENCY SERVICE OF UKRAI
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Pela segunda noite consecutiva, os principais portos ucranianos no mar Negro foram bombardeados pelas forças russas. Kiev acusa a Rússia de visar deliberadamente as infra-estruturas ucranianas destinadas à exportação de cereais e Moscovo dirigiu uma ameaça velada contra os navios que circulem na região.

A região de Odessa viveu uma noite “infernal”, de acordo com a descrição de um porta-voz da administração militar da cidade portuária. Mais de 60 mísseis e drones foram disparados pelas forças russas durante a madrugada desta quarta-feira, a maioria dos quais dirigidos para a província no mar Negro onde estão localizados os três únicos portos que continuam em funcionamento.

Na noite anterior, as infra-estruturas portuárias ucranianas já tinham sido alvo de um ataque maciço. Pelo menos dez civis, incluindo uma criança de nove anos, ficaram feridos durante os bombardeamentos, que atingiram vários edifícios civis, como prédios de habitação, edifícios administrativos, armazéns e centros comerciais.

Apesar de terem sido na sua maioria interceptados pelas defesas antiaéreas ucranianas, segundo Kiev, os bombardeamentos causaram enormes danos nos portos de Odessa e de Chornomorsk, outro dos locais a partir de onde têm saído produtos agrícolas. Nas últimas duas noites foram destruídas 60 mil toneladas de cereais, de acordo com o Ministério da Agricultura, sublinhando que grande parte da infra-estrutura usada nos portos ficou inoperacional.

A recente ofensiva russa contra as cidades portuárias ucranianas surge na mesma semana em que Moscovo suspendeu a sua participação na Iniciativa de Cereais do mar Negro, um acordo assinado há um ano entre a Rússia, a Ucrânia, Turquia e Nações Unidas, para garantir o escoamento de cereais e outros produtos agrícolas através de uma rota segura até Istambul. Mais de 30 milhões de toneladas de bens alimentares produzidos na Ucrânia – um dos maiores exportadores de cereais do mundo – foram exportados através deste mecanismo.

A Rússia decidiu não prolongar o acordo por considerar que algumas das suas disposições não foram cumpridas. Em causa está a exclusão do Rosselkhozbank, o principal banco do sector agrícola, do sistema de transacções financeiras internacionais SWIFT. Moscovo dizia que a ausência da instituição do SWIFT não lhe permitia exportar os seus próprios cereais e fertilizantes, tal como havia sido acordado, e rejeitou a alternativa oferecida pela União Europeia de recorrer a um banco subsidiário.

Alternativas em estudo

A Ucrânia tem acusado a Rússia de estar a pôr em causa a segurança alimentar mundial com os ataques contra as cidades portuárias. O conselheiro presidencial Mikhailo Podoliak disse que os ataques mostram “a atitude da Federação Russa em relação à ‘segurança alimentar’”. “A Federação Russa atingiu de forma deliberada e intencional os terminais de cereais e outras estruturas portuárias. O objectivo principal é destruir a possibilidade de enviar cereais ucranianos”, afirmou através de uma publicação no Telegram.

O Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, disse que cada míssil lançado era um ataque não apenas contra a Ucrânia, mas contra “todos aqueles no mundo que ambicionam uma vida normal e segura”.

A Rússia admitiu ter direccionado grande parte dos seus mísseis e drones para a costa do mar Negro sob controlo ucraniano como parte de uma “retaliação maciça” contra Kiev por ter atacado a ponte Kerch, a via rodoviária que liga a península da Crimeia ao território continental russo.

Apesar do fim do acordo de exportação de cereais, a Ucrânia tem continuado a fazer escoar os seus produtos agrícolas através de uma rota temporária a partir da Roménia e garante que pretende manter o fluxo mesmo sem a participação da Rússia. A ONU, que tem alertado para o impacto que a escassez de cereais tem junto dos países mais pobres, diz estar a estudar “um certo número de ideias” para encontrar uma nova solução.

Na terça-feira, a chefe do USAid, o departamento de ajuda externa dos EUA, Samantha Power, disse que Washington pretende investir 250 milhões de dólares para ajudar a Ucrânia a encontrar rotas alternativas para exportar os seus cereais. “Vladimir Putin pode estar disposto a desferir esta dor humanitária em inocentes, mas os EUA não estão”, afirmou, durante uma visita a Odessa.

No entanto, os esforços da Ucrânia e dos seus aliados podem revelar-se infrutíferos, perante a superioridade militar russa no mar Negro. O Ministério da Defesa disse que, a partir desta quinta-feira, irá lidar com qualquer navio que atravesse o mar Negro tendo como destino um porto controlado pela Ucrânia como podendo estar a transportar armamento, sugerindo que poderá considerá-los como alvos legítimos.

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