Japão recebe luz verde para libertar água de Fukushima para o Pacífico

A água que arrefecia os reactores de Fukushima foi tratada e será diluída antes de ser libertada no Pacífico ao longo de mais de 30 anos. Países vizinhos rejeitam proposta.

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Protestos na Coreia do Sul contra a libertação das águas de Fukushima JEON HEON-KYUN/EPA

O Japão obteve nesta terça-feira a aprovação do organismo de vigilância nuclear da ONU para o seu plano de libertar no oceano a água radioactiva tratada da central de Fukushima, destruída pelo tsunami após o acidente nuclear de 2011, apesar da forte resistência da China e de comunidades locais e de receios de toda a região do Pacífico.

Depois de uma análise de dois anos, a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) afirmou que os planos do Japão estavam de acordo com as normas de segurança globais e que teriam um “impacto radiológico negligenciável para as pessoas e o ambiente”.

A aprovação foi marcada pela entrega, esta terça-feira, ao primeiro-ministro Fumio Kishida de uma espessa pasta azul com o relatório final. O chefe da AIEA, Rafael Grossi, disse aos jornalistas no Clube Nacional de Imprensa do Japão, onde foi recebido por um pequeno grupo de manifestantes, que iria tentar dissipar as preocupações que ainda persistem e que planeia colocar pessoal da AIEA na central de Fukushima para monitorizar a libertação das águas.

Em causa está uma quantidade de água suficiente para encher 500 piscinas olímpicas. A água utilizada para arrefecer as barras de combustível da central de Fukushima foi tratada, depois de a central ter sido danificada pelo terramoto e consequente tsunami em 2011. O governo japonês garante a segurança deste processo inédito, que deverá durar 30 a 40 anos.

O Japão não especificou uma data para o início da libertação da água, enquanto aguarda a aprovação oficial do organismo regulador nuclear nacional para o plano da Tokyo Electric Power (Tepco), cuja palavra final sobre o plano revelado em 2021 poderá chegar já esta semana. A expectativa, no início do ano, era que o processo pudesse começar ainda durante o Verão.

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Rafael Grossi, chefe da Agência Internacional de Energia Atómica, entrega relatório ao primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida Eugene Hoshiko

Resistência local

Os sindicatos de pescadores japoneses há muito que se opõem ao plano, afirmando que está em causa um longo trabalho para reparar a reputação do sector, depois de vários países terem proibido alguns produtos alimentares japoneses após a catástrofe de 2011.

Desde que a proposta foi apresentada, uma petição das regiões em redor da fábrica reuniu mais de 250 mil assinaturas.

A Tepco afirma estar a colaborar com as comunidades piscatórias e outras partes interessadas e está a promover a agricultura, a pesca e os produtos florestais em lojas e restaurantes para reduzir qualquer dano à reputação dos produtos da zona.

Alguns países vizinhos também se queixaram ao longo dos anos da ameaça ao ambiente marinho e à saúde pública, com a China a emergir como o país mais crítico.

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Protestos contra a libertação das águas de Fukushima KIMIMASA MAYAMA/EPA

Aliás, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da China já veio lamentar a divulgação “apressada” do relatório do organismo de vigilância nuclear da ONU. “Se a parte japonesa está empenhada em seguir o seu próprio caminho, deve suportar todas as consequências”, declarou o ministério chinês num comunicado.

“O Japão continuará a dar explicações ao povo japonês e à comunidade internacional de uma forma honesta, com base em provas científicas e com um elevado nível de transparência”, afirmou o primeiro-ministro japonês na sua reunião com Grossi.

“Atrítio” sobre água tratada

O Japão insiste que o processo é seguro. A água foi filtrada para remover a maioria dos elementos radioactivos, excepto o trítio, um isótopo de hidrogénio difícil de separar da água. A água tratada será diluída até atingir níveis de trítio muito inferiores aos aprovados internacionalmente antes de ser libertada no Pacífico.

Numa apresentação feita a jornalistas estrangeiros na China no mês passado, as autoridades japonesas disseram que os níveis de trítio na água tratada são inferiores aos encontrados nas águas residuais regularmente libertadas pelas centrais nucleares em todo o mundo, incluindo na China.

Os responsáveis japoneses afirmaram ter feito múltiplas e repetidas tentativas para explicar a Pequim a ciência subjacente à posição de Tóquio, alegando que as tentativas foram ignoradas.

A China afirmou na terça-feira que a comparação do Japão entre os níveis de trítio na água tratada e nas águas residuais estava a “confundir completamente os conceitos e a enganar a opinião pública”. Através da sua embaixada no Japão, Pequim afirmou que o relatório da AIEA não pode ser um passe livre para a libertação de água e apelou à suspensão do plano.

Rafael Grossi visitará a central de Fukushima na quarta-feira. Depois da sua viagem ao Japão, irá à Coreia do Sul, onde os consumidores têm estado a comprar sal marinho e outros artigos antes da libertação da água. De acordo com a imprensa, Grossi visitará também a Nova Zelândia e as Ilhas Cook, numa tentativa de atenuar as preocupações sobre o plano.

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