Associações distritais e regionais de futebol e a circulação de jogadores

Na ânsia de protagonismo desmedido, o presidente do Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol denigre as nossas associações com insinuações que não correspondem à verdade.

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O mundo do futebol português foi novamente abalado por más notícias, desta vez relacionadas com a existência de tráfico de dezenas de jogadores oriundos de vários países, sendo da inteira responsabilidade de uma academia com interesses particulares pertencente ao ex-presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Liga Profissional de Futebol.

Dentro deste contexto, o sr. presidente do Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol (SJPF) tem efetuado várias observações sobre esta delicada problemática, das quais, em termos globais, até concordo, mas não posso deixar de ficar surpreendido com algumas das suas insinuações persistentes ao futebol distrital e às Associações Distritais e Regionais (ADR) ao referir, entre várias afirmações, que há um silêncio ensurdecedor (…) e falta coragem para enfrentar, sem rodeios, este problema” (PÚBLICO, 19.06.2023).

Ora não podemos deixar de recordar que as ADR são pessoas coletivas de direito privado, sem fins lucrativos, por tempo indeterminado, exercendo a sua atividade e jurisdição em todo o seu território, sendo detentoras do estatuto de Pessoa Coletiva de Utilidade Pública, regendo-se pelo disposto na legislação e nos regulamentos aprovados em assembleia-geral.

Tem por principal objetivo promover, incentivar, fomentar, desenvolver, regulamentar e dirigir a prática do futebol não profissional, em todas as suas variantes e competições.

Assim como representar os seus associados e cuidar e defender os seus direitos e os seus legítimos interesses, nomeadamente junto da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e de quaisquer organismos e entidades oficiais ou particulares.

Deve defender os valores da integridade, ética, da lealdade, da correção, da verdade desportiva e do fair-play, não admitindo a violência nos jogos nem qualquer tipo de falseamento dos resultados das suas competições.

Como sócios efetivos da FPF, devem cumprir e fazer cumprir integralmente a Lei, estatutos, regulamentos, recomendações, diretivas e deliberações da FIFA, UEFA e FPF e ainda as instruções emanadas de entidades públicas competentes.

No cumprimento do referido anteriormente, não podemos deixar de destacar o rigoroso, exigente e “exagerado” (na opinião dos clubes) processo de inscrição de um jogador jovem estrangeiro na respetiva ADR, em estreita ligação com a FPF e a UEFA, ao ponto de demorar vários meses, enquanto em igual período, o mesmo pode usufruir na sua plenitude de vários direitos, como sejam a Escola Pública, o Serviço Nacional de Saúde, a Ação Social, etc.

Mas não fica só por aqui o crivo rigoroso desta situação na ADR, já que continua em vigor a limitação do número de “jogadores formados localmente”, na idade compreendida entre os 11 e os 19 anos, como instrumento inibidor da utilização excessiva de jogadores vindos de outros locais.

Também não podemos ficar indiferentes ao sucesso verificado com o processo de Certificação das Entidades Formadoras realizado entre a FPF/ADR/Clubes, que se iniciou na época desportiva de 2014/15 e permite filtrar progressivamente as situações (i)legais dos clubes participantes (em 2022/23, 1187 clubes na fase de autoavaliação), em estreita sintonia com o Plano Nacional da Ética Desportiva e a crescente ligação com o licenciamento das provas nacionais.

Considero que ainda não foi feito tudo e que há sempre outras soluções para implementar, por isso, tem estado em fase de análise para aprovação a possibilidade de se travar o número ilimitado de jogadores inscritos por equipa/escalão, como mais uma forma de inibir esta situação.

Tem todo o sentido nesta matéria destacar o teor do Decreto-Lei n.º 45/2015, de 9 de Abril, que define as formas de proteção do nome, imagem e atividade desenvolvidas pelas federações desportivas, bem como o respetivo regime contraordenacional, tendo sido para o efeito celebrado um protocolo com a Fundação Inatel sob o patrocínio da FPF.

Por fim, as ADR participam em dezenas de reuniões nos clubes seus filiados com centenas de jogadores por todo o País, dentro do Programa da Integridade e do Match Fixing promovido pela FPF.

Para além deste trabalho, é deveras importante destacar a ação desenvolvida na deteção e seleção de talentos desportivos (seleções distritais, com a realização de torneios promovidos pela FPF no decorrer da época desportiva como estratégia para a formação das futuras seleções nacionais), formação de treinadores, dirigentes e “Pontos de Contacto e Segurança”, recrutamento, retenção e formação de árbitros, promoção do futebol feminino e do futebol de praia. Uma referência para o financiamento aos clubes destinada à reabilitação de instalações desportivas, aumento do número de praticantes e de equipas, futebol inclusivo, promoção da igualdade de género, implementar o Walking Football, etc.

Para ser realista, julgo necessário acrescentar que a nossa dimensão de intervenção é essencialmente desportiva/administrativa e definida nos termos já indicados, para além do poder superior hierárquico da FPF, do Comité Olímpico de Portugal, do Comité Paralímpico e da Confederação do Desporto. Enquanto, em termos políticos, temos a participação do Governo, da Assembleia da República, da Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto, do IPDJ, das respetivas direções regionais e das autarquias locais. Tudo o resto que se possa realizar, para além desta matriz, diz respeito, em termos legais e de procedimento, às polícias, ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, à Autoridade para as Condições no Trabalho, ao Ministério Público, à Procuradoria-Geral da República, ao SIS e aos tribunais, já que são eles as únicas entidades que estão autorizadas a utilizar todos os instrumentos legais de combate ao tráfico de seres humanos em todas as suas variantes, o resto que se possa dizer é estar a divagar.

Tendo em conta a persistência deste tema a nível nacional, não posso deixar de acreditar que o mesmo já foi certamente abordado várias vezes no Conselho Superior de Desporto, local por excelência para tratar de forma global e estratégica todos os assuntos do foro desportivo, onde o presidente do SJPF tem lugar.

Brevemente vai realizar-se em Lisboa a Jornada Mundial da Juventude, com a presença de cerca de um milhão de jovens até aos 30 anos, e vem a propósito saber, desde já, da preocupação das autoridades com o número de jovens que poderão eventualmente não regressar ao seu destino de origem. O que fazer para o impedir? Quem tem de intervir?

É bom não esquecer que o nosso modelo de desporto assenta na livre organização de clubes e de SAD (empresas), que aparecem e desaparecem conforme a sua dinâmica e ciclo de vida.

Assim, considero que o sr. presidente do Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, na ânsia de protagonismo desmedido, está desta forma a denegrir constantemente as ADR, entidades que fazem parte estrutural da FPF, com insinuações que não correspondem à verdade. Segundo a sabedoria popular, “quem desdenha, quer comprar”.

A propósito do tema das migrações e dos refugiados para a Europa, como um todo ao nível internacional, não posso deixar de questionar quais são as políticas públicas defendidas pela União Europeia e pelo Governo Português associadas ao desporto e ao futebol, que estão a ser implementadas e que não são do nosso conhecimento.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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