Ucrânia – a troca de sangue por armas

A guerra um dia acabará. As negociações provarão que os que empurraram os ucranianos para a tal derrota militar da Rússia serão corresponsáveis pela tragédia, pois que o sangue vertido foi inútil.

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Oleksei Reznikov, ministro da Defesa da Ucrânia, declarou numa entrevista ao programa de notícias TSN do canal 1+1 ucraniano, em 6/1/2023: "A principal ameaça para a Aliança é a Rússia. A Ucrânia faz hoje frente a essa ameaça. Cumprimos hoje a missão da NATO. Eles não dão o sangue deles pela missão. Nós damos o nosso. Eis a razão pela qual nos devem fornecer armas.

Ao cabo destes meses de guerra e a fim de podermos encadear uma lógica subjacente às declarações de Reznikov vale recuar um pouco no tempo e ler as de Oleksiy Danilov, secretário do Conselho de Segurança e de Defesa da Ucrânia num artigo de opinião publicado no jornal Ucrainska Pravda em 11/2/23. "O Ocidente deve preparar-se para descolonizar a Rússia que vai desaparecer com as suas fronteiras atuais… Os processos que levaram ao colapso da URSS estão agora em curso na Rússia de hoje…”.

Seguindo esta linha de raciocínio um dos mais destacados conselheiros de Zelenski, Oleksi Arestovitch, declarou que a condição para a Ucrânia entrar na NATO era a destruição da Rússia.

A edição online PÚBLICO do dia 11 reproduziu um texto de Catherine Belton e Francesca Ebel para o The Washington Post no qual se reportava que um "membro bem relacionado dos círculos diplomáticos que permanece em contacto com funcionários governamentais" afirmou que, "se as armas continuarem a ser fornecidas e o Exército ucraniano for modernizado" pelo Ocidente — mesmo sem adesão formal à NATO —, "a Ucrânia pode representar uma ameaça existencial para a Rússia”.

O think-tank Rand Corporation, criado pelo Pentágono no esboço da estratégia de 2019 Extanding Russia: Competition from Advantageous Ground e Overextending and Unbalancing Russia, inclui claramente a ideia de desestabilizar a Rússia e levar ao seu enfraquecimento. O documento já entrava em linha de conta com uma invasão da Ucrânia e alertava que "poderia conduzir a perdas humanas e territoriais desproporcionadas e a um fluxo de refugiados e até a uma paz desvantajosa”.

As revelações de Angela Merkel, François Hollande e Poroschenko que os Acordos de Minsk não passaram de um degrau para ganhar tempo e rearmar as Forças Armadas ucranianas batem certo com o que supra se transcreveu.

A estas somam-se as declarações dos dirigentes ocidentais a dar como garantida a derrota militar russa, quer pela incapacidade russa, pelo seu atraso e extrema desorganização, quer pela capacidade militar da Ucrânia, quer ainda pelo dilúvio de sanções económicas que iriam desconectar a Rússia do mundo e conduzi-la ao colapso económico e social.

A sra. Ursula vestiu a pele de porta-voz da NATO ao declarar solenemente que a Rússia não escapava à derrota militar e que as sanções de mais de uma dezena de pacotes levariam ao fim do regime, logo seguida pelos srs. Borrell, Costa, Michel e por um tal ministro dos Negócios Estrangeiros que mandava prender Putin no Algarve, se este para lá fosse de férias.

A Rússia vende hoje mais petróleo que antes da guerra. A inflação é inferior à da Europa e o PIB russo cresce mais do que o da União Europeia.

As promessas enfáticas aos dirigentes ucranianos, de lhes fornecerem todo o armamento necessário para derrotar militarmente a Rússia, torna muito difícil assumir a realidade. No entanto, pelo menos por ora mantêm em aberto a entrada da Ucrânia na NATO. Tal significaria que a NATO passaria a ter um novo centro no Leste, na Polónia, na chamada nova Europa, como assim foi designada por George W. Bush em confronto com Chirac e Schröder, aquando da invasão do Iraque.

O mundo vai mudar, não se sabe bem quais as consequências em todo o seu conjunto, mas vai. O eixo da mudança visa quebrar a hegemonia do país que tem mais prisões que universidades e que gasta no seu sistema penitenciário o astronómico montante de setenta e quatro mil milhões de dólares e é atingido por tiroteios constantes nas escolas, igrejas, supermercados e um pouco por todo o lado.

Na Ucrânia o sangue vertido pelos ucranianos será mais uma tragédia a juntar a tantas que os humanos têm vivido. As armas falam da morte e por isso levam a morte, sejam elas de quem forem, do Ocidente ou da Rússia.

A guerra um dia acabará. As negociações terão lugar e provarão que os que empurraram os ucranianos para a tal derrota militar da Rússia serão corresponsáveis pela tragédia, pois que o sangue vertido foi inútil e ao serviço de um projeto alheio aos interesses da própria Ucrânia. Quem estará nas negociações, Putin ou Zelenski?

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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