Ministra da Habitação considera que o PS tem responsabilidade na falta de oferta pública

Marina Gonçalves admitiu que quem governou o país deve ser “responsabilizado” pela falta de construção e de oferta de habitação pública. Governo pondera linha bonificada para cooperativas.

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Marina Gonçalves, ministra da Habitacão Miguel Rato Radio Renascenca

O Partido Socialista (PS), a governar desde 2015, tem a sua quota de responsabilidade na falta de construção e de oferta de habitação pública, reconhece a ministra da Habitação. "Nunca dissemos o contrário (...). Vamos com um atraso de décadas. Ao falar de um atraso de décadas, todos nós devemos ser responsabilizados pelo que não fomos fazendo ao longo do tempo", sublinha Marina Gonçalves, em entrevista à agência Lusa.

O Programa Especial de Realojamento — criado há 30 anos para erradicar as barracas nas zonas de Lisboa e Porto — foi "muito importante", mas "não deixou de ser um programa temporário, porque era para uma necessidade em concreto, era para duas áreas metropolitanas, e não para o país como um todo, e não tinha esta visão de olhar para a habitação como um pilar do Estado social", destaca a ministra.

É preciso agora, defende, "olhar para a habitação como para a educação e a saúde" e construir "uma política universal", realçando, porém, que este é "um trabalho que demora também o seu tempo a concretizar-se estruturalmente na sociedade".

O parque habitacional público de Portugal é dos mais baixos da Europa, com 2% do total do parque habitacional no país, face à média europeia de 12%. E há países que chegam aos 20% a 30%, como a Holanda. Quando Marina Gonçalves era secretária de Estado (e Pedro Nuno Santos era ministro das Infra-estruturas e Habitação), o Governo anunciou o objectivo de aumentar o parque público habitacional dos actuais 2% para 5% nos próximos anos.

Garantindo que a habitação "é a grande prioridade", a agora ministra realça que construir ou reabilitar não acontece "de um dia para o outro" e "demora o seu tempo, daí a necessidade também de respostas a curto prazo".

Aprovado em Conselho de Ministros no dia 30 de Março, o programa Mais Habitação inclui medidas como o arrendamento forçado de casas devolutas, a suspensão de novas licenças de alojamento local ou o fim dos vistos gold, encontrando-se na Assembleia da República para discussão na especialidade.

Em vigor já estão os diplomas referentes ao apoio à renda e à bonificação dos juros no crédito à habitação, que o Governo pôde adoptar sem discussão parlamentar prévia. Apresentado em 16 de Fevereiro, o programa assenta em cinco eixos: aumentar a oferta de imóveis para fins de habitação, simplificar os processos de licenciamento, aumentar o número de casas no mercado de arrendamento, combater a especulação imobiliária e apoiar as famílias.

Governo pondera linha bonificada para cooperativas

Marina Gonçalves disse também que o Governo ainda está a desenhar a linha de financiamento para as cooperativas, "mas a ideia é que seja bonificada". A ministra da Habitação reconhece entraves no acesso ao financiamento e ao crédito por parte das cooperativas: "Estamos a trabalhar com o Banco de Fomento numa linha de financiamento sustentável, mais duradoura, em função dos projectos, que permita responder às cooperativas enquanto projecto" colectivo e não individual, "de cada cooperante".

"Ainda estamos a definir o modelo, mas a ideia é que seja uma linha bonificada pelo Estado, para permitir essa sustentabilidade", adianta, recordando o exemplo recente de dois terrenos do Estado colocados a concurso que "ficaram desertos, precisamente pela dimensão de financiamento" e pela "incapacidade das cooperativas" de acederem a esse financiamento.

Questionada sobre a hipótese de as cooperativas poderem propor terrenos públicos a projectos, a ministra disse que "a ideia é conjugar várias dimensões": mobilização de terrenos públicos para aquele fim habitacional, linha de financiamento e capacitação do sector cooperativo.

Em Abril, quando ouvidas pela Lusa, as cooperativas notavam que persistem entraves ao acesso ao financiamento e à participação em todas as fases dos projectos e queixaram-se da falta de "um diálogo sério" sobre o que são realmente cooperativas. Por exemplo, a Rizoma, uma dessas cooperativas, defende alterações ao crédito.

"Quando cada membro tem de fazer individualmente um empréstimo à banca, está-se a matar a ideia de que o dinheiro é comum. O risco deixa de ser partilhado e passa a ser uma ideia individualizada do que é viver numa cooperativa", explicou Bernardo Fernandes, membro da Rizoma, um dos cinco colectivos da Área Metropolitana de Lisboa que integram a Rede Co-Habitar, já com dois projectos em processo de construção, nos concelhos de Mafra (distrito de Lisboa) e Moita (Setúbal).

Segundo dados fornecidos à Lusa pela Cooperativa António Sérgio para a Economia Social, actualmente estão registadas 175 cooperativas de habitação e construção, na "grande maioria" em regime de propriedade individual, ainda que a propriedade colectiva tenha começado "a ser mais usada recentemente, em algumas das poucas cooperativas de habitação e construção que se têm vindo a constituir e que pretendem usar o sistema de habitação colaborativa".

A ministra Marina Gonçalves promete um "trabalho de parceria", entre Estado (Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana), municípios e cooperativas, para "montar um modelo que seja eficaz".

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