Presidente da Concorrência admite apreensão com acórdãos do TC
Nuno Cunha Rodrigues diz que “é necessário alterar a Lei da Concorrência”, considerando que esta tem algumas inconsistências.
O presidente da Autoridade da Concorrência (AdC), Nuno Cunha Rodrigues, defendeu hoje a alteração da lei da Concorrência, argumentando que tem inconsistências, e admitiu alguma apreensão com acórdãos que põem em causa a actividade do supervisor.
Nuno Cunha Rodrigues falava hoje na comissão parlamentar de Economia, Obras Públicas, Planeamento e Habitação, quando foi questionado pelo PSD sobre o impacto dos acórdãos do Tribunal Constitucional, que pode comprometer processos com coimas de milhões de euros da Concorrência, e a eficácia das decisões e recursos do supervisor.
O presidente do supervisor admitiu que “são acórdãos que causam alguma apreensão na AdC, porque estão em causa buscas que a Autoridade fez” através de um mandado emitido pelo Ministério Público, salientando que este organismo está a apreciar “tudo isto”. Ainda assim, assinalou que os acórdãos “têm de ser objecto de reapreciação pelo Tribunal da Concorrência”.
Para Nuno Cunha Rodrigues, “é necessário rectificar, é necessário alterar a Lei da Concorrência”, considerando que esta tem algumas inconsistências, fragilidades, que é preciso corrigir”. Entre os aspectos a rectificar, em particular, identifica por exemplo as referências em termos da intervenção do Ministério Público ou do juiz de instrução criminal.
A apreensão de correio electrónicos pela AdC com mandado do Ministério Público foi considerada inconstitucional num processo que visou a Jerónimo Martins, o que, segundo fonte judicial, poderá afectar vários processos com coimas de milhões de euros.
Num acórdão de Março, que teve como relatora a juíza conselheira Joana Fernandes Costa, o Tribunal Constitucional (TC) julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela Jerónimo Martins e pela Pingo Doce – Distribuição Alimentar da decisão adoptada em Março de 2020 pelo Tribunal da Relação de Lisboa (TRL).
Nesse acórdão, o TRL havia confirmado o entendimento do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), que, em Junho de 2019, indeferiu a impugnação das diligências de busca e apreensão realizadas pela AdC entre 7 e 27 de Fevereiro de 2017, com base num mandado emitido pelo Ministério Público (MP), no âmbito de um processo contra-ordenacional por práticas restritivas da concorrência.
Na decisão tomada em Março, o TC julgou inconstitucional a norma extraída do Regime Jurídico da Concorrência, segundo a qual, em processo contra-ordenacional por prática restritiva da concorrência, é permitida à AdC a busca e apreensão de mensagens de correio electrónico abertas mediante autorização do MP, determinando que o acórdão do TRL seja reformado.
Fonte judicial disse à Lusa que a decisão agora adoptada pelo TC, no sentido de que a autoridade judiciária referida na Lei da Concorrência tem de ser forçosamente um juiz de instrução criminal (JIC) e não o MP, vai pôr em causa processos em curso que totalizam coimas superiores a mil milhões de euros.
O TRL e o TCRS, em Santarém, que julga estes processos em primeira instância, têm seguido o entendimento de que seria suficiente o mandado do MP, por estarem em causa documentos e não correspondência nem a privacidade ou a vida privada dos visados.