Marcelo: “É uma ilusão achar-se que se pode ter poder sem ter responsabilidade”

Numa homenagem à selecção de andebol em cadeira de rodas, Presidente da República falou no prestígio das instituições e comparou os jogos a eleições.

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Marcelo Rebelo de Sousa recebeu a selecção de andebol em cadeiras de rodas, que é campeã mundial LUSA/FILIPE AMORIM
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No dia em que o ministro João Galamba é ouvido na comissão de inquérito à TAP sobre os incidentes no seu Ministério das Infra-Estruturas, o Presidente da República recebeu a selecção nacional de andebol em cadeira de rodas – num ponto de agenda só divulgado oficialmente na manhã desta quinta-feira – e foi aos atletas que se dirigiu para valorizar o seu mérito ao mesmo tempo que deixava cair algumas mensagens que podem ser interpretadas à luz do actual tenso momento político.

Ao prometer uma futura homenagem aos jogadores, pelo seu esforço e desempenho na modalidade em sacrifício da vida familiar, Marcelo Rebelo de Sousa sublinhou que se trata de uma escolha de vida que tem custos. “É uma ilusão achar-se que se pode ser importante sem pagar o preço, que se pode ter poder sem ter responsabilidade. Isso não existe. Também no vosso caso é assim”, afirmou já no final da cerimónia, no Palácio de Belém, após a qual não quis falar aos jornalistas.

Não terá sido por acaso que o Presidente empregou a palavra responsabilidade que já tinha usado, por várias vezes, na sua comunicação ao país em que contrariou a decisão do primeiro-ministro de manter o ministro das Infra-Estruturas no Governo. Nesse discurso do passado dia 4, Marcelo defendeu que “responsabilidade é mais do que pedir desculpa (…), é pagar por aquilo que se faz ou se deixa de fazer”.

Os recados não ficaram por aqui. O Presidente aludiu mesmo aos resultados da economia para voltar a lembrar que nem tudo é positivo: “Na economia temos números óptimos e depois temos problemas que não são tão óptimos no dia-a-dia dos portugueses, porque as coisas não são simultâneas.” A ideia de que a "boa economia" pode não ser suficiente para a "boa política" foi o comentário que Marcelo fez dias depois de serem públicos os incidentes no Ministério das Infra-Estruturas a propósito do computador do ex-adjunto de João Galamba.

Depois, ainda a respeito da economia, o Presidente aludiu a uma ideia sobre o desfasamento entre ciclos. “É preciso que um ciclo suba para que o outro suba e às vezes, quando o outro está a subir, começa o primeiro a descer. Os números bons grandes subiram, chegam às pessoas, durante um tempo estão com as pessoas, coincidem os ciclos. Depois, de repente, as pessoas ainda estão a sentir um ciclo positivo e qualquer coisa, lá fora ou cá dentro, faz com que o ciclo geral não seja tão bom. Isso no desporto também acontece”, disse.

Dirigindo-se aos atletas, o Presidente falou em “comparações e confrontos” a que está constantemente sujeito na “economia, na política, na sociedade”, tal como no desporto. “Se fizerem desporto, há eleições todos os dias, ou todas as semanas, com periodicidade superior às eleições políticas e, portanto, todos os jogos são mata-mata. Quase todos. Mesmo os que não eram passam a ser, na expressão do Scolari [antigo seleccionador nacional de futebol], mata-mata”, afirmou, numa referência à disputa desportiva em que o derrotado é eliminado ao primeiro golo sofrido.

Considerando que esta cerimónia é uma “memória boa” e que quando assim é gosta de “multiplicar”, Marcelo justificou a homenagem desta manhã à Federação de Andebol de Portugal com a sua formação como “jurista e professor de Direito”. E, nessa qualidade, assumiu ser um defensor da importância das instituições: “O prestígio das instituições é fundamental. É mais importante do que a economia, a sociedade.”

Num tom de humor, Miguel Laranjeiro, actual presidente da Federação de Andebol de Portugal e antigo deputado do PS, disse suspeitar de que a presença forte da comunicação social não seria por causa da homenagem aos atletas, embora devesse ser pelo seu esforço e conquistas desportivas.

No final, depois de condecorar Miguel Laranjeiro com a Ordem do Mérito, Marcelo acabou por se aproximar bastante dos jornalistas que se encontravam na Sala das Bicas para conseguir tirar uma selfie com os atletas e a equipa técnica. Mas saiu sem prestar declarações, apesar de ter sido interpelado com a pergunta sobre se vai assistir a audição do ministro desta tarde na comissão de inquérito à TAP.

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