Borrell defende revisão estratégica da política da UE para a China

Documento de trabalho avançado pelo chefe da diplomacia europeia agrega as posições de Von der Leyen e Macron: tónica vai para a redução de riscos e para a independência face à política dos EUA.

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Foto de família dos ministros e comissários na reunião informal de Estocolmo Reuters/TT NEWS AGENCY
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Um documento de trabalho preparado pelo chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, para “recalibrar” as relações entre a União Europeia e a China, contempla uma reorientação estratégica da abordagem dos 27, no sentido da redução dos riscos de segurança e das dependências económicas, conforme defendeu a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, ao mesmo tempo que assegura a “independência” da política de Bruxelas face a Washington, como aconselhou o Presidente francês, Emmanuel Macron — em declarações no regresso de uma visita de estado à China que provocaram um certo frisson nalgumas capitais.

A coordenação política entre a União Europeia e os Estados Unidos da América é considerada “essencial” para enquadrar a acção de Bruxelas, mas o bloco “não deve subscrever a ideia de um jogo de soma zero, em que só pode haver um vencedor, numa disputa binária entre os Estados Unidos e a China”, diz o documento (non-paper) de sete páginas, distribuído aos ministros dos Negócios Estrangeiros da UE para uma avaliação preliminar na reunião informal desta sexta-feira, em Estocolmo.

“Este é um documento muito equilibrado, que tem como palavras-chave envolvimento e concorrência, e que põe a tónica na unidade da Europa para se afirmar como um actor mais relevante perante a China”, observou Josep Borrell, à entrada para a reunião — a primeira etapa numa série de discussões que culminará no Conselho Europeu de 29 e 30 de Junho, quando os líderes deverão validar politicamente esta reorientação do seu relacionamento com a China.

No final da reunião, Josep Borrell disse que “a generalidade dos ministros gostou do documento com as linhas gerais da recalibração da relação com a China”, que visa, segundo o chefe da diplomacia europeia, “acabar com as dependências quando são grandes demais e, por isso, um risco”.

A prioridade dos 27, sustentou Josep Borrell, citado pela agência Lusa, tem de ser “equilibrar as balanças comerciais” com Pequim, assegurando o responsável que a União Europeia “não está a caminhar em direcção ao proteccionismo”.

Numa carta em nome próprio enviada aos ministros juntamente com o documento de trabalho — intitulado “Gerir eficazmente as relações UE-China: estabelecer contactos com base em interesses e valores; reduzir os riscos e as dependências” —, Josep Borrell justificou a necessidade de ajustar a estratégia europeia em resposta à mudança já operada pela China, cuja “ambição é claramente a de construir uma nova ordem mundial, tornando-se a principal potência mundial, simbolicamente em 2049, o centenário da criação da República Popular da China”.

Segundo o alto representante, a UE não deixará de encarar a China como parceira, concorrente e rival. A “revisão” não tem a ver com a forma como a UE define a China, mas sim com a “ponderação que deve dar a estes diferentes elementos”, em função do comportamento da China, por exemplo relativamente a dois “desafios importantes de segurança estratégica”: Taiwan e a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia.

“Temos de dizer claramente que não podemos ter uma relação normal com a China se esta não utilizar a forte influência que tem sobre a Rússia para travar esta guerra”, frisou Borrell, que na carta enviada aos ministros escreve que “uma derrota russa na Ucrânia não fará descarrilar a trajectória da China, que conseguirá tirar partido geopolítico desse facto”.

Para Borrell, o facto de a UE e a China terem “sistemas económicos e políticos diferentes”, e “abordagens muito diferentes em termos de valores e direitos”, não pode servir para justificar uma linha de dissociação ou afastamento, que seria um erro, uma vez que a China é um “interveniente fundamental” em questões regionais e globais.

“É impossível tentar resolver os desafios mais importantes sem procurar um compromisso com a China”, disse, lembrando, por exemplo, que os chineses queimam mais carvão do que todo o resto do mundo. “Por isso, esqueçam a hipótese de resolver o problema das alterações climáticas sem um forte compromisso com a China”, destacou.

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