Centenas esperavam receber nove euros. Pelo menos 85 mortos em debandada no Iémen

Sanaa, a capital iemenita, está sob controlo dos houthis desde 2014, quando esta tribo rebelde xiita depôs o Governo reconhecido internacionalmente.

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A tragédia aconteceu na Cidade Velha, no centro de Sanaa Reuters/HOUTHI MEDIA OFFICE

A tragédia aconteceu a dias da festa do Eid al-Fitr, uma espécie de Natal de três dias que marca o fim do mês sagrado de jejum do Ramadão. Num país arrasado por uma década de guerra, que antes já era o mais pobre dos países árabes, um evento de solidariedade organizado por comerciantes e onde cada pessoa deveria receber dez dólares (nove euros) chama muita gente. Foi o que aconteceu em Sanaa, a capital do Iémen, onde uma debandada provocou pelo menos 85 mortos e 322 feridos.

De acordo com vários testemunhos, as pessoas ter-se-ão assustado, quando alguns houthis dispararam para o ar – aparentemente numa tentativa de controlar a multidão. Os disparos terão atingido um fio eléctrico e causado uma explosão, desencadeando o pânico e levando as pessoas a sair correria. Foi isto que contaram à Associated Press Abdel-Rahman Ahmed e Yahia Mohsen.

“Há mulheres e crianças entre os mortos” e 50 feridos em estado grave, disse à AFP um responsável de segurança que não quis ser identificado por não ter autorização para falar aos jornalistas. Num vídeo divulgado na Al-Masirah TV, canal dos houthis, vêem-se corpos amontoados e pessoas que tentam passar umas por cima das outras em busca de um caminho.

O evento ocorreu numa escola em Bab al-Iemen, na Cidade Velha, no centro de Sanaa. O governo houthi responsabiliza os organizadores pela “distribuição aleatória” de doações sem coordenação com as autoridades e “três comerciantes foram detidos”.

Sanaa, a capital iemenita, está sob controlo dos houthis desde 2014, quando esta tribo rebelde xiita (com ligações ao Irão) depôs o Governo reconhecido internacionalmente. Um ano depois, a Arábia Saudita formou uma coligação árabe e entrou na guerra contra os houthis, a pretexto de travar a influência iraniana no país a sul do seu território. Em vez disso, provocou a intensificação do conflito que fez perto de 400 mil mortos e causou a pior crise humanitária do mundo, segundo as Nações Unidas.

O desastre ocorre numa altura em que há finalmente expectativas reais de paz – ou pelo menos de um cessar-fogo duradouro.

Na sequência do acordo para a normalização de relações entre a Arábia Saudita e o Irão, na semana passada uma delegação saudita esteve reunida com os responsáveis houthis em Sanaa e soube-se que foi encontrado um compromisso para avançar com conversações de paz. Como prova do empenho das duas partes, seguiu-se uma troca de centenas de prisioneiros.

Para Hans Grundnerg, enviado na ONU para o país, é “o mais perto que o Iémen já esteve de um progresso real em direcção a uma paz duradoura” na última década. “Este é um momento para ser aproveitado e desenvolvido e uma verdadeira oportunidade para começar um processo político inclusivo, sob os auspícios da ONU, para acabar o conflito de forma sustentável”, disse Grundnerg.

Segundo afirmou no fim de Março Peter Hawkins, o representante da Unicef no Iémen, “a vida de milhões de crianças vulneráveis continua ameaçada pelas consequências inimagináveis e insuportáveis desta guerra devastadora e sem fim”, num país onde, em média, “a cada dez minutos morre uma criança iemenita por causas evitáveis”.

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