Taliban proíbem as funcionárias afegãs da ONU de trabalhar

Agências das Nações Unidas eram o último reduto de liberdade profissional para as mulheres do Afeganistão, já banidas de trabalhar no país, mesmo para as ONG nacionais e internacionais.

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Meninas afegãs estudam numa escola ao ar livre gerida por uma ONG SAMIULLAH POPAL/EPA

As Nações Unidas confirmaram a existência de uma ordem dos taliban a proibir as funcionárias afegãs da organização de trabalharem. O primeiro sinal surgiu na terça-feira, quando as afegãs que trabalham com a ONU na província de Nangarhar foram impedidas de se dirigir às instalações da organização.

“Se esta medida não for revertida, vai inevitavelmente prejudicar a nossa capacidade de prestar ajuda que salva vidas às pessoas que dela necessitam”, reagiu, no Twitter, o secretário-geral, António Guterres, referindo-se à situação nesta região do Leste do Afeganistão.

Desde o regresso dos taliban ao poder, em Agosto de 2021, as raparigas afegãs já foram proibidas de estudar a partir dos 12 anos e as mulheres não podem trabalhar, estudar ou sequer entrar em parques, jardins, ginásios ou piscinas, estando igualmente impedidas de viajar sem um “guardião” masculino (em distâncias superiores a 70 quilómetros) e obrigadas a cobrir-se sempre que saem à rua. No final do ano passado, os extremistas já tinham impedido as afegãs de trabalharem para todas as organizações não-governamentais, excluindo nos serviços de saúde.

Ao mesmo tempo, continuam a ser detidas jornalistas e activistas dos direitos das mulheres.

Descrevendo esta nova proibição como “inaceitável e, francamente, inconcebível”, o porta-voz de Guterres, Stéphane Dujarric, disse aos jornalistas na ONU que esta é a última medida “de uma preocupante tendência para minar a capacidade das organizações de ajuda em chegar aos que mais dela precisam”. As Nações Unidas, afirmou, “não podem operar sem staff feminino”.

“Os nossos colegas no terreno na missão da ONU no Afeganistão [UNAMA] souberam de uma ordem das autoridades de facto que bane as mulheres do staff nacional da ONU de trabalharem”, explicou Dujarric. Até agora a organização não foi formalmente informada de nenhuma alteração. Entretanto, foram as próprias Nações Unidas que pediram a todos os seus funcionários afegãos (homens e mulheres) para não se apresentarem ao trabalho durante 48 horas, enquanto tentam esclarecer a situação numa reunião com os chamados “estudantes de teologia”.

Num país com uma segregação de género absoluta, as afegãs são essenciais para identificarem as mulheres que precisam de ajuda e distribuir essa mesma ajuda.

A ONU tem feito chegar assistência humanitária aos mais de 23 milhões de afegãos, num país que atravessa uma profunda crise económica e humanitária, e onde a fome não tem parado de aumentar desde que os taliban voltaram ao poder.

O mês passado, a representante especial da ONU para o país e chefe da UNAMA, a missão de assistência da organização, afirmou ao Conselho de Segurança que o Afeganistão continua a ser “o país mais repressivo do mundo para os direitos das mulheres”. “Num momento em que o país precisa de todo o seu capital humano para recuperar de décadas de guerra, metade dos seus potenciais médicos, cientistas, jornalistas e políticos estão fechados em casa, com os seus sonhos esmagados e os seus talentos confiscados”, disse Rosa Isakova Otunbayeva.

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