Bloco, PCP e Livre propõem fim das propinas no ensino superior

Dias depois de um manifesto que juntou várias figuras a pedirem o fim das propinas, bloquistas, comunistas e o Livre entregam propostas nesse sentido no Parlamento.

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Manifestação realizada no Dia do Estudante Matilde Fieschi

O BE propõe o fim das propinas nas licenciaturas, cursos técnicos superiores e mestrados integrados em 2024, desafiando os partidos que concordam que "o financiamento público do ensino superior é um desígnio nacional" a aprovarem o diploma. Já o PCP apresentou esta quarta-feira três projectos de lei que prevêem a gratuitidade do ensino superior para todos os cidadãos, sem propinas, taxas ou emolumentos, e a criação de apoios indirectos em termos de alimentação, transportes ou alojamento. O Livre quer criar um fundo estratégico do ensino superior e de apoio aos estudantes, através das receitas do IRC e IRS.

Num projecto de lei entregue no Parlamento, o BE propõe a alteração das bases do financiamento do ensino superior, propondo a eliminação das propinas nas licenciaturas, nos cursos técnicos superiores e mestrados integrados e a criação de "um tecto máximo para o valor das propinas de 2.º e 3.º ciclos de estudos no Ensino Superior Público".

"O valor das propinas é, de facto, uma barreira para que os estudantes possam manter-se no Ensino Superior ou até pensar em ingressar", referiu, em declarações à Lusa, a deputada do BE Joana Mortágua, acrescentando que "os motivos económicos são o principal factor de abandono escolar" neste período académico.

Desafio ao PS

Na opinião de Joana Mortágua, "está na altura de reconhecer que as palavras não podem ser vãs", dando como exemplo as do Presidente da República quando reconheceu que "as propinas são uma barreira ao Ensino Superior" e à sua democratização, bem como "as palavras de todos dirigentes do PS que tomaram posição" sobre este tema.

"Isto é um desafio a todos os deputados e deputadas de todos os partidos, mas nomeadamente os do PS, que concordam que o financiamento público do ensino superior é um desígnio nacional de desenvolvimento. É um desafio para pôr em prática aquela que tem sido a retórica do PS. Veremos como é que ela se concretiza", disse.

O BE, segundo a deputada, apresentou a sua proposta de origem pelo fim das propinas nos mestrados integrados, licenciaturas e cursos técnicos superiores, uma vez que se vinha de um caminho gradual de redução das propinas desde a "geringonça" que "foi interrompido e completamente abandonado quando o PS ganhou a maioria absoluta".

"Os sinais são contrários à ideia da descida das propinas, por isso é que nós também queremos deixar já claro que, na nossa perspectiva, não se pode fazer mais estrago e é, neste momento crítico para o país, que é preciso dar um sinal de que a aposta é na educação, em trabalho qualificado, nos direitos dos jovens", defendeu.

Joana Mortágua garantiu que os bloquistas estarão "disponíveis para discutir outras propostas que apareçam", mas o "problema é que do outro lado não tem havido proposta nenhuma".

De acordo com o projecto de lei do BE, estas alterações entrariam em vigor com o Orçamento do Estado (OE) posterior à aprovação deste diploma, ou seja, apenas no próximo ano porque "o fim das propinas implica que o Estado invista nas universidades públicas para elas não dependerem de propinas".

"Esse é que o grande problema. Hoje em dia, o subfinanciamento do ensino superior é tão grande que as universidades dependem de taxas, taxinhas e propinas para se autofinanciarem ou de dependências outras", criticou, considerando que se está "mais uma vez perante um problema de subfinanciamento público de um serviço público de educação".

Acabar com taxas e emolumentos

No caso da bancada comunista, o PCP recorda que a Constituição da República estipula que incumbe ao Estado "garantir a todos os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados de ensino" e "estabelecer progressivamente" a sua gratuitidade.

No entanto, o partido considera que, actualmente, se tem assistido "ao abandono e elitização do acesso e frequência do ensino superior", em particular devido ao pagamento de propinas, taxas, emolumentos e outros custos associados.

O PCP propõe assim uma nova lei de financiamento para garantir a gratuitidade do ensino superior a todos os que o frequentem, "independentemente da sua capacidade económica familiar ou individual", sem que lhes seja cobrado "qualquer valor, entre outros, propinas, taxas e emolumentos".

Este diploma sugere ainda que o OE assegure a totalidade das despesas relativas ao funcionamento das instituições do ensino superior, em particular no que se refere às despesas com pessoal, infra-estruturas ou materiais.

As receitas próprias das instituições de ensino estão previstas, mas sem poderem ser "utilizadas para suportar despesas de funcionamento" e sem que a sua arrecadação possa "significar uma diminuição do orçamento a transferir pelo Estado".

Apoios indirectos para refeições e transportes

Por outro lado, o PCP apresenta um outro projecto de lei que visa garantir que o Estado fornece apoios indirectos para refeições, residências universitárias, serviços de saúde ou transportes, também financiados pelo OE, para estudantes de todos os ciclos, cursos técnicos superiores ou de "e-learning" e "b-learning".

Entre os apoios previstos, consta, por exemplo, a garantia de que o preço pago pelos estudantes por refeições nas universidades "não pode exceder 50% do custo médio nacional por refeição", sendo grátis para quem tem bolsa. E os estudantes passariam a ter direito a uma redução de 60% no preço dos passes mensais.

No alojamento, o PCP quer que o Governo crie uma rede de residências com acesso grátis para estudantes com bolsa e preço estabelecido para os restantes sob proposta de um Conselho Nacional de Acção Social, após audição obrigatória das associações de estudantes.

A estes dois projectos de lei, o PCP acrescenta ainda outro diploma em que propõe um modelo de gestão democrática das instituições públicas de ensino superior, por oposição ao actual regime jurídico de "privatização e mercantilização das instituições públicas".

O partido estabelece a criação de um senado nas instituições composto por entre 15 a 35 membros, com poder de eleger o reitor da universidade e de aprovar ou rever estatutos. É ainda sugerida a "eliminação da limitação de contratação de pessoal docente e não docente", como forma de assegurar a "verdadeira autonomia na organização e gestão" das instituições.

Fundos financiados pelo IRC e IRS

Por sua vez, o Livre entregou um projecto de resolução que recomenda ao Governo que considere um conjunto de pressupostos para a reforma do financiamento do ensino superior. Por um lado, o deputado único do partido quer eliminar as propinas nas licenciaturas e estabelecer limites máximos para os mestrados e doutoramentos, reduzindo progressivamente as propinas desses ciclos.

Por outro, sugere que se crie um fundo estratégico do ensino superior financiado pelo IRC para "investimentos estruturais", que o Orçamento do Estado compense o que as propinas deixarem de assegurar e que se estabeleça um fundo de apoio aos estudantes do superior "economicamente desfavorecidos" através de uma receita de IRS de 5% da "população com maiores rendimentos".

Rui Tavares recomenda ainda que o financiamento das instituições seja feito através de contratos plurianuais que "considerem as necessidades de desenvolvimento do país e da região", "com previsões de médio e longo prazo".

Na semana passada, dezenas de personalidades assinaram um manifesto contra o sistema de propinas proposto pela OCDE e defendem o seu fim gradual, um texto subscrito pelo ex-ministro Manuel Heitor e a ex-secretária de Estado adjunta e da Educação Alexandra Leitão, mas também pelos bloquistas Joana Mortágua e José Soeiro, os deputados do PS Isabel Moreira e Pedro Delgado Alves, professores universitários e dirigentes estudantis.

Notícia actualizada com projecto do Livre

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