Tempo e dinheiro para amar e cuidar: a China tenta aumentar a taxa de natalidade

Conselheiros propõem medidas como um limite máximo de oito horas de trabalho para os jovens, para que tenham tempo para “se apaixonar, casar e ter filhos”.

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Conselheiros fazem mais de 20 propostas ao Governo chinês para fomentar a natalidade ALEX PLAVEVSKI/EPA

Respondendo à preocupação do Governo com a diminuição da população da China, um grupo de conselheiros políticos chegou a mais de 20 recomendações para aumentar a taxa de natalidade – mesmo que especialistas digam que no melhor cenário, o máximo que será conseguido é travar o declínio populacional.

A China está nesta situação sobretudo por causa da política de filho único, imposta entre 1980 e 2015, que deixou efeitos mesmo depois do seu fim. As autoridades aumentaram, em 2021, o limite do número de filhos por casal para três, mas os resultados foram limitados, e mesmo durante o período de confinamento por causa da pandemia da covid-19, manteve-se a relutância dos casais em terem mais filhos.

Entre os factores dissuasores para os jovens decidirem ter mais filhos estão os elevados custos de creches e escolas, uma rede de apoio social frágil e desigualdade de género.

As propostas para o aumento da taxa de natalidade, feitas no encontro anual da Conferência Consultiva Política do Povo da China (CPPCC, na sigla em inglês) este mês, vão desde subsídios para famílias que têm um filho pela primeira vez, e não só para quem tem o segundo e terceiro como acontece agora na maioria das províncias, aumentar a educação pública gratuita e melhorar o acesso a tratamentos de fertilidade.

O número elevado de propostas é visto por especialistas como um sinal de que a China está a tratar o seu problema de declínio e envelhecimento da população com um sentido de urgência, depois de dados do ano passado mostrarem que a população diminuiu pela primeira vez em seis décadas.

“Não é possível mudar a tendência de declínio”, declarou Xiujian Peng, investigadora do Centre of Policy Studies na Victoria University (Austrália). “Mas sem quaisquer políticas de encorajamento da natalidade a [taxa de] fecundidade vai descer ainda mais.”

Uma moção, de Jiang Shengnan, da CPPCC, declarava mesmo que os jovens só devem trabalhar um máximo de oito horas por dia para terem tempo de “se apaixonar, casar e ter filhos”, e que isto era muito importante para assegurar que as mulheres não estão com uma sobrecarga de trabalho.

Os incentivos para que casais tenham um primeiro filho seriam também importantes, disse Peng.

Para ajudar a aliviar a pressão sobre famílias jovens, a Comissão Nacional de Saúde emitiu, esta quarta-feira, directrizes para que pessoas qualificadas possam gerir creches para um máximo de cinco crianças até aos três anos.

Fim do limite de três filhos?

Entre as propostas há ainda uma que pede o fim de todas as medidas de planeamento familiar, incluindo o limite de três filhos e a obrigação das mulheres estarem legalmente casadas para registar os seus filhos.

Arjan Gjonca, professor na London School of Economics, disse que os incentivos financeiros não eram suficientes e que as políticas para mais igualdade de género e mais direitos de emprego para as mulheres teriam, provavelmente, mais impacto.

Propostas neste sentido incluem ainda a licença de maternidade ser paga pelo Governo e não pelos empregadores para diminuir a discriminação contra as mulheres, e o aumento do tempo de licença de paternidade acaba com uma barreira para os pais terem mais responsabilidades parentais, dizem especialistas.

A taxa de natalidade da China caiu, no ano passado, para 6,77 nascimentos por mil habitantes, de 7,52 em 2021 – é o número mais baixo já registado.

Especialistas em demografia avisam que a China vai envelhecer antes de enriquecer, já que a sua força de trabalho vai diminuir e governos locais endividados vão ter de gastar mais na sua população idosa.

O demógrafo Yi Fuxian continua céptico em relação ao impacto significativo de medidas como estas, dizendo que a China precisa de “uma revolução de paradigma em toda a sua economia, sociedade, política e diplomacia para aumentar a fecundidade”.

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