COP27: à espera das reviravoltas de última hora

No primeiro rascunho de declaração final, a frase “este espaço está reservado a resultados relevantes das negociações” deixa tudo em aberto.

Alguma frustração e pessimismo – de quem é a culpa de isto não estar a correr bem? Ontem, ao fim de 12 dias de discursos públicos e negociações privadas, foi divulgado um primeiro rascunho da declaração final da 27.ª Cimeira do Clima, no Egipto. O documento foi considerado confuso e demasiado vago – “este espaço está reservado a resultados relevantes das negociações que estão a decorrer”, lê-se diversas vezes ao longo de 20 páginas daquilo que, na verdade, é uma lista de tópicos. Ao The Guardian, houve quem dissesse que parecia “uma lista de compras”.

Um dos pontos essenciais chama-se fundo para as perdas e danos — ou seja, apoio financeiro, significativo, dos países mais desenvolvidos (responsáveis pela emissão de boa parte dos gases com efeito de estufa) aos mais vulneráveis, que já estão a sofrer as consequências brutais das alterações climáticas, com a subida do nível do mar, secas extremas, fomes em larga escala, ou chuvas diluvianas e mortais, como as registadas no Paquistão.

Sobre como se financia o fundo, lê-se na “lista de compras” que… “este espaço está reservado a resultados relevantes das negociações que estão a decorrer”. Há outros itens com igual remate.

Sabemos que as COP são feitas de reviravoltas de última hora. Que este documento daqui a bocado já não será este documento, haverá “n” versões até à final. Mas é bom que se sublinhe esta permanente hesitação em actuar, mesmo quando “o inferno” climático de que falou o secretário-geral da ONU no primeiro dia do encontro já esteja aí para parte da humanidade.

Outro exemplo: se na COP26 a declaração final estabelecia como objectivo que “fossem progressivamente eliminados os subsídios ineficazes para os combustíveis fósseis”, o texto de Sharm el-Sheikh diz “eliminados e racionalizados”, o que está a ser visto como um claro recuo.

À beira do fim — é suposto a cimeira terminar hoje, mas ontem, na véspera do encerramento, eram cada vez mais os delegados que achavam que é bem provável que tenha de ser prolongada —, o presidente da COP27, Sameh Shoukry, ministro dos Negócios Estrangeiros egípcio, foi dos que verbalizaram a preocupação: os líderes mundiais foram à COP mostrar o seu apoio inequívoco ao combate às alterações climáticas, está na hora de as palavras se traduzirem em avanços.

Acredite-se, assim, nas reviravoltas de última hora e que os espaços em branco serão devidamente preenchidos. António Guterres já disse o que é obrigatório: “Um acordo ambicioso e credível sobre perdas e danos e apoio financeiro aos países em desenvolvimento.” Portanto, será fácil perceber o que é uma vitória, ou um falhanço.

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