Reunido com juízes do Supremo, Bolsonaro disse “acabou”

Bloqueios de estrada diminuíram entre terça e quarta-feira, mas há manifestantes que ouviram nas palavras do Presidente um incentivo a manterem os protestos.

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Muitos apoiantes de Bolsonaro decidiram manter os protestos AMANDA PEROBELLI/Reuters

Pelo terceiro dia consecutivo, o Brasil voltou a ver centenas de estradas ocupadas por apoiantes do ainda Presidente, Jair Bolsonaro, empenhadas em protestar contra o que entendem ser uma eleição ilegítima, embora a intensidade dos bloqueios tenha diminuído.

As autoridades policiais, reforçadas por ordens do Supremo Tribunal Federal e dos governos estaduais, têm conseguido desmantelar boa parte das estradas que foram bloqueadas por camionistas e automobilistas afectos a Bolsonaro. Ainda assim, permanecem cerca de 150 pontos intransitáveis espalhados por 17 estados, de acordo com os dados divulgados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) a meio da tarde. Em São Paulo, a Polícia Militar recorreu a granadas de gás lacrimogéneo e jactos de água para dispersar um bloqueio numa das principais vias de acesso à metrópole.

“Vamos perseverar. Cremos em uma revolução até Janeiro”, disse ao jornal Folha de São Paulo uma das manifestantes na auto-estrada Castelo Branco, no distrito de São Paulo. “Em nenhum momento, ele [Bolsonaro] falou que não é para manifestar. Esse é o sinal que ele nos deu”, afirmou um apoiante do Presidente num grupo nas redes sociais, cita a Folha. “O recado ele deu: manifestação pacífica sem trancar as passagens”, acrescentou.

Ao mesmo tempo, multiplicaram-se acções de protesto em frente a dezenas de quartéis militares em pelo menos dez estados. Nessas concentrações, multidões de pessoas vestidas com a camisola da selecção brasileira de futebol – que se tornou um símbolo cooptado pelo bolsonarismo – entoaram slogans de teor golpista, com apelos a intervenções armadas, embora sem que fossem registados episódios de violência física.

A aparente redução da adesão aos bloqueios rodoviários coincidiu com a acção da polícia, mas também com a reacção de Jair Bolsonaro aos resultados, que aconteceu na véspera. Num curto discurso, Bolsonaro disse simpatizar com o “sentimento de injustiça” que os seus apoiantes dizem experimentar em relação às eleições e comprometeu-se a “cumprir” os “mandamentos da Constituição”, permitindo, assim, que fosse iniciada a transição. No entanto, não reconheceu abertamente a derrota nas urnas frente a Lula da Silva.

Pouco depois dessa declaração, Bolsonaro passou uma hora reunido com os juízes do STF, em Brasília: “O Presidente da República utilizou o verbo ‘acabar’ no passado. Ele disse: ‘​Acabou.’ Portanto, olhar para a frente”, afirmou aos jornalistas, depois do encontro, um dos juízes, Luiz Edson Fachin.

“Os ministros do STF reiteraram o teor da nota oficial divulgada, que consignou a importância do reconhecimento pelo Presidente da República do resultado final das eleições, com a determinação do início do processo de transição, bem como enfatizou a garantia do direito de ir e vir, em razão dos bloqueios nas rodovias brasileiras”, lê-se no comunicado do Supremo, citado pelo jornal O Globo.

Nessa reunião, Bolsonaro terá admitido a derrota e usado a palavra “acabou” para descrever a sua actual situação. O ainda Presidente não falou à imprensa, cabendo a Fachin confirmar que Bolsonaro tinha admitido a derrota. Horas antes, e na sequência da intervenção de Bolsonaro, o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, declarara que será dado início ao processo de transição entre o Governo cessante e o sucessor, que toma posse a 1 de Janeiro de 2023.

No mesmo sentido, o vice-presidente, Hamilton Mourão, eleito recentemente senador, disse ter chegado a hora de abandonar as pretensões de reverter o resultado obtido nas urnas e aceitar a derrota. “Nós concordámos em participar de um jogo em que o outro jogador [Lula] não deveria estar jogando. Mas, se a gente concordou, não há mais do que reclamar. A partir daí, não adianta mais chorar, nós perdemos o jogo”, afirmou em entrevista ao jornal O Globo.

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