Benfica, trabalho, Deus. Obrigado, Benedita

A morte chega cedo. Cedo demais, sempre. Elogiar a Benedita, recordar as suas qualidades, expressar-lhe uma vez mais o nosso profundo afeto e admiração, parece algo redundante.

Benedita Santiago Neves deixou-nos nesta quarta-feira dia 7 de setembro. Tive o privilégio de trabalhar com ela nos últimos cinco anos no Gabinete de Comunicação do Opus Dei em Portugal e em alguns projetos de Comunicação da Igreja.

Dizem os entendidos que “o que não se comunica não existe”. Mas pode-se comunicar de muitas maneiras. Pode-se “dar existência” aos acontecimentos com tonalidades diferentes. A Benedita era especialmente comunicativa, descomplicada, alegre, com ideias “fora da caixa”. Tenho muitas recordações dela. Mas vou-me limitar a três.

A Benedita era uma grande benfiquista. Sofria cada jogo, especialmente os da Champions e dava gosto falar com ela de futebol. Um dia liguei-lhe para comentar a vitória do Benfica contra o Ajax. Ela não me atendeu. Estranho. Mensagem dois minutos depois: ”Não atendi porque estava a fazer um doce para o meu sobrinho. Já ligo de volta.” Ela gostava de futebol. E do Benfica. Mas a sua bússola apontava em primeiro lugar para os outros, para os mais necessitados e brilhavam-lhe os olhos quando falava dos sobrinhos e dos sobrinhos netos.

Há poucas semanas pedi-lhe ajuda na organização de um projeto pessoal que acontecerá em 2023. Resposta: “Claro que sim. Peça ajuda sem cerimónias. É um privilégio poder ajudar”, escreveu-me numas das últimas mensagens. Ela encarnava essas palavras que o Papa Francisco tão sabiamente nos deixou: “Quem não vive para servir não serve para viver.” A Benedita gostava muito de futebol e do Benfica. Mas os outros estavam primeiro.

Dava gosto trabalhar com a Benedita. Diz-se, ironicamente, que nas organizações há dois tipos de pessoas: as que criam problemas; e as que os resolvem. A Benedita era uma pessoa decidida e organizada. Recordo a sua agenda de papel - já um pouco em desuso - onde apontava tudo com cuidado. Trabalhámos juntos na organização dos seminários de formação em Roma “O Vaticano por dentro e in loco” (2022), no Interfaith Meeting em Roma (2019), na VIII Edição do Prémio Internacional Comunicar África e no Projecto Social 75 Anos, 75 Famílias.

Por trás destas iniciativas estavam reuniões semanais no meio de agendas complicadas. Nunca ouvi uma queixa. Dizia o que pensava. E sujeitava as suas opiniões ao parecer dos outros. Tinha um especial gosto por projetos assistenciais “O que acham de propor a uma escola que acolha um grupo de refugiados da Ucrânia até final do ano?”. Foi uma das suas últimas propostas. O projeto de acolhimento de dezenas de crianças foi para a frente. Com a Benedita dava gosto trabalhar.

A Benedita era uma pessoa de grande fé. Testemunhei a sua vida cristã normal no meio do mundo, procurando viver perto de Deus, seguindo os passos de S. Josemaria. Atraía outras pessoas com o seu exemplo e alegria. Pedia orações pela família, vi-a ir à missa em dias difíceis, lutava por ter um diálogo com Deus… O que pedia? De certeza que se lembrava de nós. Como boa advogada, sabia interceder pelos familiares e amigos: sabia que o mais importante na vida é aquilo que Deus faz por cada um dos seus filhos. Respirava um grande amor ao Papa e à Igreja e estava entusiasmada com a Jornada Mundial da Juventude em 2023. Tenho a certeza que soube oferecer a sua dor, destes últimos momentos, à Igreja.

Obrigado, Benedita. Ela deu-nos uma grande lição. A mais importante e definitiva. Humildemente, sem chamar a atenção, apagando-se lentamente num sofrimento escondido que só Deus apreciou. A morte chega cedo. Cedo demais, sempre. Elogiar a Benedita, recordar as suas qualidades, expressar-lhe uma vez mais o nosso profundo afeto e admiração, parece algo redundante.

Não, não nos vamos despedir hoje, nem nunca, da Benedita Santiago Neves porque o seu exemplo perdura e a sua vida eterna começa agora. Do céu, como boa advogada, pode continuar a apontar na sua agenda, as nossas preocupações, alegrias e festas. Pode continuar a fazer muito mais por nós, por este mundo que ela amou apaixonadamente como benfiquista e incansável trabalhadora. O mundo hoje fica mais pobre, mas o céu fica mais rico porque lá habita quem soube amar. E a Benedita amou muito e de verdade.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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