Ataque ao porto de Odessa é o primeiro tiro no acordo de exportação de cereais

Ucrânia acusa a Rússia, que através da Turquia nega responsabilidade. Nações Unidas, Estados Unidos e União Europeia condenam bombardeamento.

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Ucrânia alega que quatro mísseis foram disparados contra o porto de Odessa logo de manhã Reuters/STRINGER

O dia imediatamente a seguir àquele em que foi celebrado um acordo para a exportação dos cereais ucranianos amanheceu com explosões no sítio fundamental para o seu cumprimento: o porto de Odessa.

As autoridades da Ucrânia denunciaram que a Rússia tinha disparado quatro mísseis contra o porto no mar Negro. “Dois rockets foram abatidos pelas forças de defesa aérea e dois atingiram as instalações portuárias”, dizia um comunicado do comando militar do Sul da Ucrânia.

Seguiram-se reacções em catadupa, primeiro de políticos ucranianos, depois das Nações Unidas, dos Estados Unidos, da União Europeia, da Turquia. Em todas a mesma preocupação: o acordo firmado há tão poucas horas valerá mais do que o papel em que foi assinado?

“A Rússia nega qualquer ataque a Odessa”, transmitiu ao início da tarde o ministro da Defesa da Turquia, manifestando-se “realmente preocupado” com o incidente. Na véspera, o Presidente turco considerara a assinatura do entendimento como um “dia histórico” e dizia-se “orgulhoso” pelo papel “fundamental” do país no desbloqueio das negociações entre os dois beligerantes.

Também o gabinete de António Guterres emitiu um breve comunicado a “condenar inequivocamente os ataques”, que não atribuiu a nenhuma das partes. O secretário-geral da ONU, que na sexta se empenhara em descrever o acordo como “um farol” para o mundo, insistiu na necessidade de uma “implementação total” do que ficou estabelecido em Istambul.

Do lado ucraniano as palavras foram mais duras. “Não passaram sequer 24 horas e a Rússia já lançou um ataque com mísseis ao porto de Odessa, quebrando as suas promessas e pondo em causa os seus compromissos”, disse um porta-voz do ministro dos Negócios Estrangeiros, Oleg Nikolenko, acrescentando que o ataque era como “cuspir na cara do secretário-geral da ONU, António Guterres, e do Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que fizeram grandes esforços para alcançar este entendimento”.

“Esperamos algo mais substancial do que ‘preocupação profunda’”, escreveu no Twitter o vice-ministro das Infra-Estruturas da Ucrânia, Mustafa Naiiem, chamando à responsabilidade a Turquia e a ONU.

Nos termos do acordo assinado na sexta-feira, estes dois mediadores são responsáveis pela coordenação e supervisão do escoamento de cereais a partir dos portos ucranianos, através de rotas pré-definidas pelo mar Negro que evitem as minas aí colocadas para impedir o tráfego marítimo militar. A Ucrânia e a Rússia não assinaram o acordo directamente um com o outro, mas cada um com a Turquia e as Nações Unidas. Aliás, segundo a imprensa turca, a cerimónia de assinatura começou com atraso porque os dois países não se entendiam sobre como deviam estar dispostas as bandeiras na sala.

Em Kiev, onde recebeu uma delegação de congressistas norte-americanos, o Presidente ucraniano disse que o ataque “prova que, independentemente do que a Rússia diz e promete, encontra formas de não cumprir”. Volodymyr Zelensky elencou: “Geopoliticamente, com armas, de forma sangrenta ou não, tem vários vectores, é como sempre age.”

Odessa é o último grande porto na faixa costeira ucraniana (que abrange os mares Negro e de Azov) que ainda se mantém sob controlo da Ucrânia. Estima-se que no país estejam retidas cerca de 20 milhões de toneladas de cereais, o que está a provocar uma subida acentuada dos preços a nível mundial e a tornar ainda mais complicada a vida em países africanos e do Médio Oriente.

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